Rússia cria novo exército mercenário na África, substituindo o Wagner Group

Com o Africa Corps, Moscou busca reforçar sua presença militar na África e consolidar o controle dos interesses empresariais do Wagner no continente, incluindo setores lucrativos de mineração

Um dia reconhecidos como “heróis” contra o extremismo islâmico na África, de acordo com a narrativa do Kremlin, o Wagner Group encerrou suas atividades. Mas para manter e com vistas a ampliar sua influência no continente, a Rússia estaria trabalhando na formação de forças expedicionárias de 20 mil mercenários, substituindo os combatentes da empresa militar privada. As informações são da rede Bloomberg.

Chamado “The Africa Corps“, que de maneira controversa compartilha o nome com a força expedicionária de Adolf Hitler (Afrika Korps), o grupo é uma força recentemente formada pelo Ministério da Defesa russo para preencher a lacuna deixada pelo Wagner, que vem sendo dissolvido desde o ano passado.

A finalidade é fortalecer a presença militar russa na África, por meio do estabelecimento de uma rede de bases. Isso faz parte da estratégia de Moscou para recuperar influência em meio ao declínio percebido do poder ocidental na região, como ocorreu por exemplo com a França em relação ao Mali após o fim da aliança de segurança entre os países.

Adicionalmente, permite ao Kremlin consolidar o controle sobre os negócios da organização na África, incluindo atividades na área de mineração, após a morte do fundador do Wagner, Evgeny Prigozhin, no ano passado. Se trata de uma fonte de renda crucial para a Rússia, afogada nos gastos com a guerra da Ucrânia. Moscou faturou, somente desde o início do conflito, US$ 2,5 bilhões com ouro de países africanos.

Túmulo de Yevgeny Prigozhin no cemitério de Porokhovskoye em São Petersburgo (Foto: WikiCommons)

A reportagem observa que, mesmo no auge das operações africanas, o Wagner Group tinha apenas alguns milhares de membros. Enquanto isso, a Rússia busca recrutar pelo menos mais 250 mil para a guerra na Ucrânia este ano.

Além disso, se a Rússia assumir um “papel militar oficial” na África, pode perder a capacidade de negar as acusações de crimes de guerra da ONU (Organização das Nações Unidas) na África direcionadas ao Wagner,que teria protagonizado ao menos três massacres por lá. Um deles na República Centro-Africana, onde lutaram ao lado das forças do governo contra grupos rebeldes que tentavam depor o presidente Faustin-Archange Touadéra.

“Há também um lado negativo para os russos, que é não ter mais a possibilidade de negação. Se você reformula essas forças como parte do exército, agora você é responsável por esse problema”, disse Peter Pham, ex-diplomata sênior dos EUA ouvido pela reportagem.

Pós-Wagner

O Africa Corps, formado por mercenários e voluntários, não faz parte das Forças Armadas russas. Segundo o think tank OSW Centre for Eastern Studies, o novo grupo iniciou o recrutamento em dezembro de 2023, inclusive buscando ex-mercenários do Wagner e, possivelmente, residentes locais.

Há estimativas não oficiais indicando que o corpo teria 20 mil membros, mas esses números parecem exagerados, considerando que as unidades africanas do Wagner chegaram a um número entre cinco mil e sete mil mercenários em seu auge. Presume-se que as Forças Armadas russas e as agências de aplicação da lei, enfrentando desafios de mobilização interna, terão dificuldade em recrutar mais do que alguns milhares de pessoas.

A criação do Africa Corps pelo Ministério da Defesa russo indica um esforço para se reorganizar em meio ao processo de dissolução do Wagner Group, e o corpo militar africano estaria se preparando para assumir as operações do grupo anterior.

O vice-ministro da Defesa Yunus-bek Yevkurov lidera a formação da força, com previsão de conclusão até o verão europeu. Ele destaca que a cooperação militar, de treinamento e segurança beneficiará não apenas as forças sob o exército, mas também as da Guarda Nacional, do FSB (Serviço Federal de Segurança russa) e as empresas militares de companhias mineradoras russas.

A Rússia historicamente manteve laços políticos e econômicos com vários países africanos durante a Guerra Fria. Nos últimos anos, observou-se um aumento nas relações diplomáticas e acordos militares entre Moscou e alguns países africanos. Essas relações podem envolver cooperação militar, vendas de armas, treinamento de forças locais e, em alguns casos, o estabelecimento de instalações militares.

Tags: