Tesouro dos EUA revela faturamento milionário do Al-Shabaab e impõe sanções

Dinheiro não apenas sustenta o grupo somali, mas é também redistribuído entre facções da Al-Qaeda em todo o mundo

O Departamento do Tesouro dos EUA anunciou na segunda-feira (11) que 16 entidades e indivíduos foram adicionados a sua lista de sancionados em virtude do apoio financeiro que concedem ao Al-Shabaab, grupo extremista ligado à Al-Qaeda baseado na Somália. O faturamento da organização chega a US$ 100 milhões por ano, segundo Washington.

Em comunicado, o Tesouro afirmou que os sancionados “compõem uma extensa rede de negócios que abrange o Chifre da África, os Emirados Árabes Unidos (EAU) e Chipre, que levanta e lava fundos” para a organização terrorista.

Entre os alvos do governo norte-americano estão “empresários influentes na região que prestam apoio financeiro ao Al-Shabaab, um grupo terrorista responsável por alguns dos piores ataques terroristas da história moderna da África Oriental.”

A rede de financiadores e as ações de extorsão contra empresas e cidadãos na Somália permitem ao Al-Shabaab faturar cerca de US$ 100 milhões anuais, dinheiro que nem sempre é usado diretamente pela organização. O faturamento elevado permite ao grupo somali redistribuir parte da verba entre outras facções da Al-Qaeda em todo o mundo.

“A ação de hoje faz parte de um esforço multifacetado do Tesouro para apoiar a ofensiva econômica do governo somali contra o Al-Shabaab, um dos três pilares da campanha para degradar este grupo terrorista mortal”, disse o subsecretário do Tesouro para o Terrorismo e Inteligência Financeira, Brian E. Nelson. 

Soldado acompanha ex-militantes do Al-Shabaab após operação de desmantelamento do grupo terrorista em Garsale, Somália, setembro de 2012 (Foto: Divulgação/Amison)

As sanções significam que eventuais bens que os sancionados tenham nos EUA devem ser bloqueados e reportados às autoridades. Pessoas e entidades em geral, mesmo estrangeiras, são proibidas de negociar com os sancionados e, caso se envolvam em transações com os indivíduos designados, correm o risco de sofrer sanções secundárias.

Por que isso importa?

O Al-Shabaab chegou a controlar Mogadíscio até 2011, quando foi expulso de lá pelas forças da União Africana (UA). Atualmente, controla territórios nas áreas rurais da Somália e luta para derrubar o governo nacional, tendo inclusive se expandido para a vizinha Etiópia.

O grupo concentra seus ataques no sul e no centro da Somália. As atividades envolvem ataques contra órgãos e oficiais do governo e entidades de ajuda humanitária, além de extorsão contra a população local e proteção de terroristas internacionais que se escondem no país.

Civis são frequentemente vitimados pelos atentados. Um levantamento feito pela ONU e divulgado em dezembro de 2022 aponta que 613 civis morreram em 2022 na Somália em ações terroristas. A maioria dessas pessoas, 315, foi vítima de dispositivos explosivos improvidas (IEDs, na sigla em inglês).

Os números, apresentados pelo Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH), apontam, ainda, casos de civis atingidos pelas tropas do governo, por milícias armadas aliadas às Forças Armadas e por outros “atores não identificados”. As mais de 600 mortes representam um aumento de um terço em relação a 2021, maior número registrado no país desde 2017.

Devido ao crescimento do Al-Shabaab, o presidente Hassan Sheikh Mohamud iniciou, em agosto de 2022, uma grande ofensiva contra os insurgentes. Na ocasião, ele comparou a facção a “uma cobra mortal” e disse que “não há solução a não ser matá-la, antes que ela mate você.”

Mais tarde, em agosto de 2023, o chefe de Estado afirmou que o objetivo é derrotar completamente os extremistas em 2024. “Se não os eliminarmos completamente, talvez haja alguns bolsões com alguns Al-Shabaabs inofensivos que não poderão causar problemas”, disse ele.

No Brasil

Casos mostram que o Brasil é um porto seguro para extremistas. Em dezembro de 2013, levantamento do site The Brazil Business indicava a presença de ao menos sete organizações terroristas no Brasil: Al Qaeda, Jihad Media Battalion, Hezbollah, Hamas, Jihad Islâmica, Al-Gama’a Al-Islamiyya e Grupo Combatente Islâmico Marroquino.

Em 2001, uma investigação da revista VEJA mostrou que 20 membros terroristas de Al-Qaeda, Hamas e Hezbollah viviam no país, disseminando propaganda terrorista, coletando dinheiro, recrutando novos membros e planejando atos violentos.

Em 2016, duas semanas antes do início dos Jogos Olímpicos no Rio, a PF prendeu um grupo jihadista islâmico que planejava atentados semelhantes aos dos Jogos de Munique em 1972. Dez suspeitos de serem aliados ao Estado Islâmico foram presos e dois fugiram.

Em dezembro de 2021, três cidadãos estrangeiros que vivem no Brasil foram adicionados à lista de sanções do Tesouro Norte-americano. Eles são acusados de contribuir para o financiamento da Al-Qaeda, tendo inclusive mantido contato com figuras importantes do grupo terrorista. E, mais recentemente, em outubro de 2022, um associado ao EI, com nacionalidade brasileira e negócios no país, foi sancionado pelos EUA.

Para o tenente-coronel do Exército Brasileiro André Soares, ex-agente da Abin (Agência Brasileira de Inteligência), o anúncio do Tesouro causa “preocupação enorme”, vez que confirma a presença do país no mapa das organizações terroristas islâmicas.

“A possibilidade de atentados terroristas em solo brasileiro, perpetrados não apenas por grupos extremistas islâmicos, mas também pelo terrorismo internacional, é real”, diz Soares, mestre em operações militares e autor do livro “Ex-Agente Abre a Caixa-Preta da Abin” (editora Escrituras). “O Estado e a sociedade brasileira estão completamente vulneráveis a atentados terroristas internacionais e inclusive domésticos, exatamente em razão da total disfuncionalidade e do colapso da atual estrutura de Inteligência de Estado vigente no país”. Saiba mais.

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