Alto comissário da ONU relata repressão na Nicarágua e pede a libertação de presos políticos

Número de pessoas detidas arbitrariamente por expressarem sua opinião política passou de 195 em setembro para 225 no início deste mês

O alto comissário para Direitos Humanos das Nações Unidas, Volker Turk, criticou a situação dos presos políticos na Nicarágua e pediu a libertação imediata de todos os detidos arbitrariamente.

Num discurso ao Conselho de Direitos Humanos, com sede em Genebra, Turk afirmou que o tratamento degradante e humilhante imposto aos opositores do regime do presidente Daniel Ortega está sendo agora estendido às famílias dos detidos. Ele citou o caso de uma idosa que foi sujeita a revista íntima antes de visitar o parente na prisão e afirmou que a saúde mental dos prisioneiros piora a cada dia.

Volker Turk contou que mais de três mil organizações não-governamentais da Nicarágua e do exterior já foram fechadas no país latino-americano. Deste total, quase a metade deixou de operar em setembro após a repressão do governo. Com isso, um sem-número de pessoas não obtém mais os serviços e assistência dessas entidades.

Uma outra ação do governo é a perseguição e censura a canais da mídia. As autoridades nicaraguenses já fecharam 26 meios de comunicação nacionais e três internacionais. Em outubro, uma nova lei no país passou a exigir registro e autorização no governo para a produção, filmagem e exibição de qualquer material audiovisual em território nacional.

O alto comissário para Direitos Humanos da ONU informou que 12 cidadãos nicaraguenses não puderam retornar ao seu próprio país sem qualquer justificativa pelo governo sobre a proibição de entrada. Turk pediu às autoridades que assegurem que todos os cidadãos da Nicarágua tenham o direito de entrar e sair de seu país de acordo com a lei internacional.

Grupos de direitos civis em protesto na Nicarágua, junho de 2016 (Foto: Movimiento Renovador Sandinista)

Defensores de Direitos humanos, jornalistas, clérigos ou quaisquer outras pessoas encaradas pelo governo como opositora política estão sendo presos, intimidados e sofrendo assédio moral. Pelas denúncias recebidas pelo Alto Comissariado da ONU, há casos de pessoas sendo condenadas por crimes de conspiração para minar a integridade nacional ou por disseminar notícias falsas.

O alto comissário das Nações Unidas disse que todos esses passos são parte de um esforço sistemático para calar a oposição e qualquer forma de discordância com o governo de Ortega.

Eleição fraudada

Um outro episódio foi a preparação e realização das eleições municipais, em novembro, que contiveram, segundo alto comissário, as armadilhas típicas de um comportamento autocrático. A Nicarágua atravessou uma onda de prisões e demissões de opositores políticos nos meses que antecederam o pleito.

Partidos políticos que tiveram seu registro cancelado, no ano passado, foram proibidos de concorrer. No dia das eleições, houve várias intimidações com postos de controle sendo colocados nas urnas para “rastrear os eleitores”. Os que eram vistos como contrários ao governo não puderam sequer chegar perto dos locais de votação.

Depois das eleições, a polícia iniciou uma repressão aos simpatizantes do partido político indígena Yatama, que diz ter vencido o pleito no município de Waspam, no litoral caribenho no norte da Nicarágua. Ali, pelo menos 19 pessoas foram presas, por vários dias, a maioria indígenas jovens.

Para o alto comissário da ONU, os efeitos da crise da Nicarágua, hoje, atravessa as fronteiras do país. Entre janeiro e outubro deste ano, a vizinha Costa Rica recebeu 70 mil novos pedidos de asilo. E mais de 147 mil nicaraguenses chegaram à fronteira do México com os Estados Unidos.

País isolado

Além disso, a Nicarágua continua se isolando do resto da comunidade internacional. Neste ano, a nação centro-americana deixou de participar de vários contatos com órgãos de direitos humanos para realizar os exames periódicos na ONU. E muito claramente a Nicarágua se recusou a cooperar para que a visita ao país em 2023 seja realizada por integrantes da Subcomissão sobre Prevenção da Tortura e Tratamento Cruel, Desumano e Degradante.

O país também deixou de colaborar com o Sistema Interamericano de Direitos Humanos. Para Volker Turk, a Nicarágua é hoje a foto de um contrato social em frangalhos, da confiança destruída, de vidas partidas e de uma sociedade fraturada.

O alto comissário se referiu aos países-membros do Conselho de Direitos Humanos afirmando que é preciso promover um engajamento coordenado e um compromisso em níveis nacional, regional e internacional, que sejam baseados nos padrões internacionais dos direitos humanos.

Ele pediu às autoridades da Nicarágua que libertem todos as pessoas detidas de forma arbitrária. Volker Turk acredita que é preciso incluir as pessoas, que foram excluídas das esferas sociais e políticas, novamente na vida pública. E que é necessário respeitar os direitos fundamentais à liberdade de expressão, associação e de reunião que são essenciais para o desenvolvimento sustentável.

O alto comissário para Direitos Humanos falou sobre a urgência da restauração da esperança e do diálogo inclusivo e nacional ancorado nos direitos humanos. Ele disse que o Escritório está pronto para trabalhar com as autoridades nessas áreas e pediu à Nicarágua que autorize o acesso de sua equipe ao país.

Conteúdo adaptado do material publicado originalmente pela ONU News

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