O governo dos EUA encerrou um programa que ajudava a rastrear crianças ucranianas levadas à força para a Rússia durante a guerra. A decisão, parte do congelamento de recursos para iniciativas externas, foi criticada por legisladores democratas, que alertaram sobre a possível perda de dados essenciais. As informações são da agência Reuters.
O programa era conduzido pelo Laboratório de Pesquisa Humanitária da Universidade de Yale e fazia parte de um esforço da administração do ex-presidente Joe Biden para documentar violações do direito internacional na invasão russa. Com o fim do financiamento, pesquisadores perderam acesso a informações valiosas, incluindo imagens de satélite sobre aproximadamente 30 mil menores levados para território russo ou áreas ocupadas.
Apesar das preocupações, a porta-voz do Departamento de Estado, Tammy Bruce, negou que os dados tivessem sido apagados. “Os dados existem”, afirmou em coletiva de imprensa. “Não estavam sob controle do Departamento de Estado, mas sabemos quem os administra e que não foram excluídos.”
A Casa Branca indicou que o presidente Donald Trump abordou o tema em uma conversa com o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky. Segundo comunicado oficial, o norte-americano “prometeu trabalhar em estreita colaboração com ambas as partes para ajudar a garantir que essas crianças voltem para casa”.

A Ucrânia classifica a remoção de menores como crime de guerra e genocídio, acusando Moscou de alterar a identidade das crianças e inseri-las em famílias russas. Em 2023, o Tribunal Penal Internacional (TPI) emitiu mandados de prisão contra o presidente russo, Vladimir Putin, e sua comissária para os direitos da criança, Maria Lvova-Belova, por deportação forçada de menores.
A MITRE, organização que mantinha a base de dados, afirmou que as informações seguem armazenadas por um ex-parceiro do projeto. “Até onde sabemos e acreditamos, os dados não foram excluídos”, declarou um porta-voz.
Crime de guerra e genocídio
A deportação em massa forçada de pessoas durante um conflito é classificada pelo Direito Internacional Humanitário como um crime de guerra. A transferência forçada de crianças, particularmente, configura um ato genocida. No caso da guerra da Ucrânia, tais denúncias surgiram ainda nos primeiros dias de combate e desde então vêm aumentando.
Em junho de 2022, menos de quatro meses após a invasão russa, a então alta comissária da ONU (Organização das Nações Unidas) para os direitos humanos, Michelle Bachelet, disse que seu escritório investigava tais alegações. Ela destacou a suspeita de que crianças ucranianas órfãs vinham sendo adotadas por famílias russas sem o devido procedimento legal e citou relatos de que a Rússia estava “modificando a legislação existente para facilitar o andamento das adoções” em Donetsk e Luhansk.
Em fevereiro de 2023, o ministro das Relações Exteriores da Ucrânia, Dmytro Kuleba, usou a palavra “genocídio” para definir a abdução de crianças ucranianas durante a guerra. Ele se manifestou em mensagem de vídeo exibida em sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU.
“O crime mais assustador é que a Rússia rouba crianças ucranianas”, disse Kuleba no evento realizado em Genebra, na Suíça, acrescentando que tais ações constituem “provavelmente a maior deportação forçada da história moderna”. E sentenciou: “Este é um crime genocida.”
A denúncia foi reforçada por Annalena Baerbock, ministra das Relações Exteriores da Alemanha. “O que poderia ser mais desprezível do que tirar as crianças de suas casas, longe de seus amigos, de seus entes queridos?”, questionou ela na mesma sessão do Conselho.
A chefe da diplomacia alemã citou o caso de 15 crianças que teriam sido levadas de Kherson ainda no início da guerra, sendo que a mais jovem tinha nove anos à época. “Não vamos descansar até que todas essas crianças estejam em casa”, afirmou a ministra. “Porque os direitos das crianças são direitos humanos, e os direitos humanos são universais.”
A Ucrânia estima que cerca de 19,5 mil crianças tenham sido levadas para a Rússia ou para a Crimeia, território ucraniano ocupado.