ONU contesta mudanças na Constituição da Nicarágua com poderes ilimitados ao presidente

Emenda estende mandato de Daniel Ortega para seis anos e eleva papel da mulher dele, Rosario Murillo, tornando-a copresdiente

Conteúdo adaptado de material publicado originalmente pela ONU News

O Grupo de Peritos em Direitos Humanos da ONU (Organização das Nações Unidas) expressou “profunda preocupação” com uma emenda constitucional, adotada na semana passada pela Nicarágua.

Em comunicado emitido na segunda-feira (25), o Grupo afirma que as mudanças conferem poderes ilimitados ao atual presidente do país, Daniel Ortega, e à esposa dele, Rosario Murillo, vice-presidente da Nicarágua e que passará agora a copresidente da nação centro-americana.

Acaba proibição de censura à imprensa

A emenda adotada pela Assembleia Nacional em 22 de novembro aumenta o mandato presidencial de cinco para seis anos e acaba com a proibição de censura à imprensa, o que era garantido pela carta magna nicaraguense.

O presidente da Nicarágua, Daniel Ortega, em foto de 2012 (Foto: Chancelaria do Equador)

Além disso, a partir de agora direitos fundamentais podem ser suspensos durante um estado de emergência. Outra novidade é o limite permitido para envolvimento do exército em temas de políticas domésticas. Se o governo alegar ameaças à estabilidade do Estado, os militares poderão fazer uma intervenção a pedido do presidente.

Linguagem vaga e tentativa de controlar poderes 

Daniel Ortega retornou ao poder em 2007 na Nicarágua e desde então já realizou 12 reformas constitucionais. Para o presidente do Grupo de Peritos, Jan-Michael Simon, o governo estaria tentando legalizar e consolidar o controle de um poder irrestrito.

Segundo ele, a reforma utiliza uma linguagem vaga e formaliza o que já existe de facto: o fim da separação entre os poderes. O novo texto não menciona mais a palavra poderes, mas apenas órgãos que seriam “coordenados” pela presidência.

As propostas também eliminam a referência explícita ao pluralismo político, uma crítica que já havia sido feita, na semana passada, pelo alto comissário de Direitos Humanos da ONU, Volker Turk.

Segundo ele, a medida está relacionada às eleições de 2026. Outra preocupação da ONU é a suspensão do direito individual à cidadania nicaraguense. 

Direitos cancelados, confisco e suspensão da cidadania

Desde 2023, 546 pessoas perderam a nacionalidade e ficaram apátridas.  Algumas tiveram suas propriedades e direitos à aposentadoria ou reforma cancelados.

No comunicado de segunda, o Grupo de Peritos da ONU pediu à comunidade internacional que inste ao governo da Nicarágua a restaurar, imediatamente, a separação de poderes e outros princípios democráticos além de cumprir suas obrigações internacionais.

Respeito à dignidade humana e censura a jornalistas

Para os especialistas, após virtualmente erradicar o jornalismo independente na Nicarágua, o governo agora remove a proibição da censura de canais de mídia além de eliminar o respeito à dignidade da pessoa humana como um princípio de nação.

Com isso, a Nicarágua irá caminhar na contramão do consenso global que faz da dignidade uma pedra angular da ordem internacional baseada nos direitos humanos.

Desde 2018, a situação de violações dos direitos humanos tem piorado no país latino-americano quando o governo respondeu com violência a protestos de estudantes que exigiam a renúncia do presidente Daniel Ortega.

No ano passado, autoridades prenderam clérigos e outros religiosos além de pessoas que discordavam do governo.

O alto comissário de direitos humanos da ONU pediu a libertação imediata de todos os presos políticos.

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