China finaliza rodovia que transportaria tropas em eventual confronto com a Índia

Obra que está prestes a ser concluída fica em área disputada por Beijing e Nova Délhi, e logística militar era um problema para os chineses

O governo da China está prestes a finalizar as obras de uma rodovia que segue até a região de Ladakh, na Caxemira, uma área disputada com a Índia e por isso é de interesse estratégico para Beijing. A conclusão do projeto permitiria inclusive o transporte de tropas em caso de um eventual conflito. As informações são da revista Newsweek.

Ladakh é uma região montanhosa localizada no noroeste da Índia, na fronteira com a China. A disputa por lá remete ao conflito territorial entre a Nova Délhi e Beijing sobre a demarcação da fronteira na região, sendo que ambos os países reivindicam parte do território.

As tensões aumentaram em 2020, quando ocorreram confrontos violentos entre as tropas indianas e chinesas ao longo da Linha de Controle Real (LAC), a fronteira de fato entre os dois países, resultando em baixas de ambos os lados. O clima se acalmou desde então, embora persistam as reivindicações territoriais bilaterais.

Diante de tal cenário, a logística militar sempre foi uma das preocupações do governo chinês, pois o acesso difícil comprometeria o eventual transporte de soldados. A conclusão da rodovia, conhecida como G216, resolverá a questão para o Exército de Libertação Popular (ELP).

Exército chinês realiza exercício militar em agosto de 2021 (Foto: eng.chinamil.com.cn/)

As obras, iniciadas em 2022, não são tratadas abertamente como uma solução para questões militares, e sim como uma alternativa de transporte desde a região de Xinjiang até o Tibete, igualmente território da China. Porém, foram feitos dois desvios que permitiriam o acesso a áreas disputadas com a Índia.

Segundo Rakesh Sharma, general aposentado do exército indiano, é impossível negar o viés militar do projeto. “A G216 e a ​​G219 se tornam agora autoestradas para o apoio logístico das forças nestas áreas, à medida que se ligam à autoestrada principal que sai de Xinjiang. São dois eixos desenvolvidos para apoio logística e movimentação de forças para cima e para baixo”, disse ele, que já serviu em Ladakh.

Ponte contestada

No início de 2022, uma ponte sobre o lago Pangong, também na Caxemira, outra obra chinesa com finalidade possivelmente militar, gerou contestação indiana. Na ocasião, o Ministério das Relações Exteriores da Índia alegou que a obra vinha sendo tocada em áreas “sob ocupação ilegal da China há cerca de 60 anos.”

Entretanto, uma fonte anônima ouvida pela agência Al Jazeera à época disse que a Índia também tem realizado obras com fins militares na área disputada e que a ponte na verdade está bem distante da LAC, portanto, dentro de território legitimamente da China.

“Os chineses são muito bons em construir infraestrutura nas áreas de fronteira, e este é apenas um exemplo disso. Essa é a maneira chinesa padrão de gerenciamento de fronteiras”, disse na oportunidade Ajai Shukla, especialista em segurança de Nova Délhi. Segundo ele, a ponte também permite que as tropas da China “movam-se bem, movam-se rapidamente e implantem suas forças rapidamente.”

Beijing, no entanto, negou que a ponte tenha fins militares, conforme editorial do jornal estatal Global Times. “Seria lamentável se alguns na Índia continuassem a interpretar erroneamente o acúmulo de infraestrutura da China ao longo da fronteira como servindo a propósitos militares. É esse tipo de mal-entendido que, em certa medida, contribuiu para as tensões contínuas entre os dois países, minando os esforços para aliviar as tensões.”

Por que isso importa?

A disputa na região da Caxemira, que opõe China e Índia, começou em 1962, em meio à guerra entre os dois países. No final dos anos 1980 a crise foi controlada, e o então primeiro-ministro indiano Rajiv Gandhi buscou reestabelecer os laços com Beijing.

As tensões, entretanto, voltaram a aumentar após medidas tomadas pelas autoridades indianas, como o apoio às demandas por autonomia do Tibete, a crescente cooperação de defesa com EUA, Japão e Austrália e restrições a investimentos chineses na Índia.

A relação atingiu seu pior momento em  abril de 2020, quando soldados rivais se envolveram em combates em vários pontos da área montanhosa que divide os dois países. O problema começou com uma troca de acusações sobre desrespeito à LAC.

Então, em 15 de junho de 2020, a paz foi definitivamente quebrada e houve confronto entre soldados indianos e chineses em Ladakh. Na ocasião, 20 soldados indianos e quatro chineses morreram em combates corporais entre as tropas das duas nações. O confronto envolveu basicamente paus e pedras, sem nenhum tiro ter sido disparado.

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