O Cinema Ariana, um dos últimos símbolos da vida cultural moderna de Cabul, começou a ser demolido pelo regime talibã para dar lugar a um shopping center avaliado em US$ 3,5 milhões. Construído no início da década de 1960, o prédio atravessou guerras, mudanças de regime e décadas de repressão cultural, até sucumbir aos tratores no centro da capital afegã. As informações são do The New York Times.
O cinema permaneceu fechado desde 2021, quando o Taleban retomou o poder no Afeganistão, sendo utilizado apenas de forma esporádica para exibições de propaganda. Ainda assim, seguia como um marco urbano e afetivo para gerações de afegãos que viam no espaço uma lembrança de arte, lazer e convivência pública.

Segundo a prefeitura de Cabul, no local será construído um complexo de oito andares com mais de 300 lojas, restaurantes, um hotel e uma mesquita. De acordo com o porta-voz municipal Nematullah Barakzai, o projeto busca gerar receitas em um contexto de isolamento internacional, sanções econômicas e perda quase total da ajuda externa.
A demolição ocorre em um momento em que o Taleban endurece ainda mais as restrições culturais no país. Emissoras de televisão estão proibidas de exibir séries estrangeiras e imagens de seres vivos, enquanto plataformas digitais como o YouTube sofrem crescente vigilância. Outros cinemas históricos de Cabul permanecem fechados, sem perspectiva de reabertura.
Embora o Banco Mundial aponte crescimento econômico de 4,3% no Afeganistão neste ano, o avanço não se reflete na renda per capita, pressionada pelo retorno de refugiados e pelo aumento populacional. Ao mesmo tempo, esse movimento tem impulsionado o setor da construção civil, visto pelo Taleban como uma das poucas alternativas para arrecadação interna.
Para artistas e intelectuais afegãos, a destruição do Cinema Ariana representa mais do que a perda de um prédio. O ator e diretor Basir Mujahid afirma que o local simbolizava uma época de esperança e abertura cultural em Cabul. Ele relembra que, durante o cessar-fogo do Eid em 2018, até combatentes do Taleban frequentaram o cinema, um gesto que alimentou expectativas de tolerância cultural que não se confirmaram.
Já a prefeitura de Cabul sustenta que o edifício não possui valor histórico formal, por se tratar de um empreendimento comercial. Pelo contrato firmado, o município ficará com 45% da participação no novo shopping, enquanto o restante caberá a uma empresa privada. A previsão é de que a obra seja concluída em cerca de um ano.