Facebook deve indenizar minoria muçulmana em Mianmar, diz Anistia Internacional

Grupo de direitos humanos afirma que Meta estava ciente de que seus algoritmos estavam amplificando o discurso de ódio anti-Rohingya, mas não fez nada para impedi-lo

A “busca imprudente pelo lucro” e a “contribuição às atrocidades perpetradas pelos militares de Mianmar” pela empresa-mãe do Facebook, Meta, deveria fazer a big tech pagar indenizações às comunidades rohingyas que foram expulsas do oeste do país em 2017, segundo a Anistia Internacional (AI). A denúncia foi feita em um relatório divulgado pelo grupo de direitos humanos na quinta-feira (29). As informações são da rede Radio Free Asia.

O estudo, intitulado The Social Atrocity: Meta and the right to remedy for Rohingya (“A Atrocidade Social: Meta e o direito de remédio para Rohingya”, em tradução literal), detalha como a empresa capitaneada por Mark Zuckerberg sabia – ou deveria saber – que os sistemas algorítmicos do Facebook estavam disseminando conteúdo anti-Rohingya em Mianmar e, mesmo assim, não agiu para estancar o problema.

No dia 25 de agosto de 2017, o governo birmanês deu início a um violento processo repressivo que posteriormente seria reconhecido como genocídio. Naquele ano, mais de 700 mil pessoas da minoria étnica muçulmana proveniente do oeste do país asiático fugiram através da fronteira para Bangladesh, onde hoje vivem em precários campos de refugiados.

Crianças da etnia rohingya no campo de refugiados Cox’s Bazar, Bangladesh (Foto: EU Civil Protection and Humanitarian Aid/Flickr)

“Nos meses e anos que antecederam as atrocidades, os algoritmos do Facebook intensificaram uma tempestade de ódio contra os rohingyas, o que contribuiu para a violência no mundo real”, disse a secretária-geral da AI, Agnès Callamard, em comunicado que acompanha a divulgação do relatório.

Agnès acrescentou que, ao mesmo tempo em que tropas birmanesas executavam crimes contra a humanidade ao varrer os rohingyas do país, a Meta fez dinheiro ao transformar a rede social em uma ferramenta de limpeza étnica”, numa espécie de câmara de ódio criada por seus algoritmos.

Facebook reconheceu que suas plataformas foram utilizadas para amplificar o discurso de ódio e alimentar conflitos sectários e étnicos em Mianmar. Desde 2017, foram removidas da rede social páginas de figuras militares de alto escalão, incluindo uma dedicada ao atual líder da junta, o general Min Aung Hlaing

Em 2018, a empresa sediada na Califórnia publicou as conclusões de um relatório no qual admitiu que “não estávamos fazendo o suficiente para ajudar a impedir que nossa plataforma fosse usada para fomentar a divisão e incitar a violência offline. Concordamos que podemos e devemos fazer mais”.

Após a divulgação do relatório, no entanto, a Meta não respondeu aos pedidos da reportagem para comentar as declarações da AI. Em junho, o grupo de direitos humanos relatou que a empresa se recusou a falar sobre as alegações trazidas pelo seu relatório.

Ajuda recusada

Grupos de refugiados rohingyas fizeram pedidos diretos à Meta para fornecimento de remédios, bem como um apelo para custear um projeto de educação orçado em US$ 1 milhão no campo de refugiados em Cox’s Bazar, Bangladesh. 

O pedido de financiamento, segundo a AI, representa 0,002% dos lucros da Meta, cerca de US$ 46,7 bilhões ao ano. Em fevereiro de 2021, a big tech rejeitou o pedido da minoria muçulmano, justificando da seguinte maneira: “O Facebook não se envolve diretamente em atividades filantrópicas”.

Por que isso importa?

Os rohingyas compõem um grupo étnico muçulmano minoritário de Mianmar, no sudeste da Ásia. Embora vivam nos Estados de Rahkine e Chin, no oeste do país, não têm direito à cidadania e são perseguidos pelas autoridades locais, com relatos de assassinatos, estupros e outros abusos.

Investigações indicam que os militares birmaneses foram responsáveis ​​por atrocidades que incluem ainda mutilações, crucificações, queima e afogamento de crianças, numa ação deliberada de “limpeza étnica” hoje classificada globalmente como genocídio. Ativistas de direitos humanos pressionam há tempos por esforços internacionais para responsabilizar Mianmar por crimes contra a humanidade.

Diante desse cenário, cerca de um milhão de pessoas da minoria fugiram para Bangladesh desde 2017, sendo abrigados em precários campos para refugiados como o de Cox’s Bazar, o mais superlotado do mundo.

Outros 600 mil rohingyas continuam em Mianmar, vivendo sob as leis opressivas do governo militar que comanda o país. A perseguição é tão violenta que tornou-se habitual as pessoas lotarem embarcações rumo a Bangladesh, embora as condições que os esperam no destino sejam terríveis e o trajeto até lá seja extremamente perigoso.

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