Condenada a quatro anos de prisão por ter relatado o início da pandemia de Covid-19 na China, a jornalista Zhang Zhan deveria ter sido libertada da prisão na segunda-feira (13), mas não fez qualquer aparição pública desde então, gerando preocupação entre grupos de defesa dos direitos humanos e um protesto do governo dos EUA. As informações são da rede BBC.
A ONG Repórteres Sem Fronteiras (RSF) foi uma das entidades a manifestar preocupação com o sumiço da jornalista após a data marcada para a libertação, com postagens diversas sobre o andamento do caso em seus perfis na rede social X, antigo Twitter. O mais recente foi ao ar nesta sexta-feira (17).
“A jornalista Zhang Zhan continua desaparecida. Ela deveria ser libertada na segunda-feira, após quatro anos de prisão, mas não foi rastreada desde então. Também há relatos de pressão sobre as pessoas ao seu redor. O assédio contra eles deve finalmente parar!”, disse a RSF no seu perfil em alemão.
#China: Die Journalistin #ZhangZhan ist noch immer verschwunden. Sie sollte am Montag nach 4 Jahren Haft entlassen werden, ist seitdem aber nicht mehr auffindbar. Zudem gibt es Berichte über Druck auf ihr Umfeld. Die Schikanen gegen sie müssen endlich aufhören! https://t.co/YaLDU7HRDu
— Reporter ohne Grenzen (@ReporterOG) May 17, 2024
O governo norte-americano também se manifestou, na quinta-feira (16). “Os Estados Unidos estão profundamente preocupados com os relatos de que a jornalista cidadã da RPC (República Popular da China), Sra. Zhang Zhan, desapareceu após sua esperada libertação da Prisão Feminina de Xangai, em 13 de maio”, disse o Departamento de Estado em comunicado assinado pelo porta-voz Matthew Miller.
Washington ainda criticou a repressão à atuação da imprensa na China. “Reiteramos nosso apelo à RPC para que respeite os direitos humanos da Sra. Zhang, incluindo o fim imediato das medidas restritivas que ela e todos os jornalistas da RPC enfrentam, que incluem vigilância, censura, assédio e intimidação. Os jornalistas na RPC devem estar seguros e poder informar livremente.”
O site Free Zhang Zhan, criado para defender a libertação da jornalista e que acompanha todo o caso, atualizou a situação pela última vez na manhã desta sexta (pelo horário de Brasília). “No quinto dia após cumprir sua sentença, continuamos esperando pela notícia de que Zhang Zhan foi libertada da prisão e voltou para casa”, diz a página.
A ONG Human Rights Watch (HRW) também se manifestou, de acordo com a BBC. “A comunidade internacional não deve esquecer Zhang Zhan e deve exigir que o governo chinês garanta que ela seja verdadeiramente livre”, declarou o grupo de defesa dos direitos humanos.
Aleksandra Bielakowska, responsável jurídica da RSF, relatou que a família da jornalista cortou contato com os apoiadores, sinal de que pode estar sob pressão do governo chinês. Ainda segundo ela, ativistas que compareceram para presenciar a libertação de Zhang foram presos. Também sugeriu que a jornalista possa ter sido transferida para outro local, incerto, a fim de evitar a exposição pública do caso.
De acordo com Jerome Cohen, especialista em legislação chinesa, a situação não é incomum. “A maioria dos defensores dos direitos humanos libertados são mantidos em silêncio através de meios informais de repressão. Alguns tentam deixar o país e conseguem continuar a denunciar violações dos direitos humanos na China, mas são exceções”, disse ele;
Quem é Zhang Zhan
Zhang criticou Beijing logo no início da pandemia e foi detida na cidade de Xangai em maio de 2020, sendo posteriormente condenada a quatro anos de prisão. Ela foi formalmente acusada e julgada por “criar contendas e provocar problemas”, devido a um vídeo no qual criticava o governo chinês pela forma como tratou o surgimento da pandemia.
Para protestar contra a detenção, ela iniciou uma greve de fome alternativa, consumindo quantidades reduzidas de alimento em vez de recusar tudo que lhe era oferecido. Assim, evitou que o governo impusesse uma alimentação por sonda. Zhang adoeceu e foi diagnosticada com problemas digestivos ligados à desnutrição, gerando uma campanha internacional para que fosse libertada.
Durante o período de cárcere, mesmo a família teve contato reduzido com a jornalista, embora eventualmente tivesse autorização para visitá-la. No ano passado, a rede Radio Free Asia (RFA) relatou que a mãe dela disse a um ativista que a filha estava “quase pele e osso”, pesando 37 kg, cerca de metade do peso ideal.
Em dezembro de 2022, quando foi julgada, ela compareceu ao tribunal em uma cadeira de rodas devido aos problemas de saúde. Na ocasião, declarou-se inocente, o que habitualmente leva a uma pena mais dura. Acusados que se dizem culpados costumam receber uma punição mais branda.