O general Min Aung Hlaing, que lidera a junta militar no poder em Mianmar desde o golpe de fevereiro de 2021, assumiu a presidência do país na segunda-feira (23). Myint Swe, que figurava como chefe de Estado por escolha dos militares, foi afastado sob o argumento de uma licença médica. As informações são da rede CNN.
De acordo com a mídia estatal birmanesa, Swe apresenta, desde o início de 2023, um quadro de “desnutrição” decorrente de um “retardo psicomotor”, o que o levou a se afastar da presidência em favor da autoridade militar.
“Como ele não pode realizar atividades diárias normais, incluindo comer, tratamentos médicos próximos estão sendo fornecidos ao presidente sob o arranjo do Conselho de Administração do Estado”, disse o jornal estatal Global New Light.

Swe foi o escolhido dos militares para oficialmente governar o país após o golpe de Estado, que viu as principais lideranças democráticas presas. Entre elas Aung San Suu Kyi, mais tarde julgada e condenada a 27 anos de prisão por acusações que seus seguidores classificam como politicamente motivadas, desde corrupção e incitação até vazamentos de segredos oficiais.
Inicialmente, os militares prometeram que em até dois anos realizariam novas eleições presidenciais, mas isso não aconteceu. A junta, então, decretou estado de emergência no país, cujo prazo se encerra na próxima semana e coincide com a ascensão do general Hlaing ao poder.
O afastamento de Swe ocorre, também, no momento em que as Forças Armadas sofrem com o avanço de grupos rebeldes armados que buscam derrubar os militares. A resposta do governo inclui o aumento dos ataque contra alvos civis, o que levou diversos Estados-membros da ONU (Organização das Nações Unidas) a emitirem na semana passada uma declaração conjunta expressando preocupação com a situação.
“Estamos profundamente preocupados com a intensificação da violência e do conflito, assim como com relatos confiáveis de violações do direito internacional humanitário e dos direitos humanos em Mianmar, o que está agravando a crise humanitária”, declarou Robert Wood, representante permanente adjunto dos EUA na ONU.
Desde o golpe militar em 2021, acrescentou, o número de pessoas necessitando de ajuda humanitária aumentou de um milhão para 18,6 milhões. “Mais de 2,9 milhões de pessoas foram recentemente deslocadas, incluindo 66 mil que buscaram refúgio em países vizinhos, além de mais de um milhão de refugiados rohingya que fugiram antes do golpe”, disse Wood.
Ele pediu que as Forças Armadas de Mianmar e todas as partes envolvidas reduzam a violência, respeitem o direito internacional humanitário e os direitos humanos e protejam os civis. Ainda reiterou a necessidade de um diálogo construtivo e inclusivo para encontrar uma solução pacífica para a situação em Mianmar.
Por que isso importa?
Mianmar enfrenta “uma campanha de terror com força brutal”, segundo palavras da ONU. A repressão imposta pelo governo militar foi uma reação às eleições presidenciais de novembro de 2020.
Na ocasião, o partido NLD venceu as eleições com 82% dos votos, ainda mais do que havia obtido no pleito de 2015. Em fevereiro de 2021, então, a junta militar, que já havia impedido a sigla de assumir o poder antes, prendeu a líder democrática Aung San Suu Kyi, dando início a protestos respondidos com violência pelas forças de segurança nacionais.
As ações abusivas da junta levaram ao isolamento global de Mianmar, e em dezembro de 2022 o Conselho de Segurança da ONU aprovou uma resolução histórica que insta os militares a libertar Suu Kyi. A Resolução 2669 ainda exige “o fim imediato de todas as formas de violência” e pede que “todas as partes respeitem os direitos humanos, as liberdades fundamentais e o Estado de Direito”.
A proposta, feita pelo Reino Unido, foi aprovada no dia 21 de dezembro de 2022 com 12 votos a favor. Os membros permanentes China e Rússia se abstiveram, optando por não exercer vetos. A Índia também se absteve.
Beijing e Moscou, por sinal, estão entre os poucos governos do mundo que mantêm relações formais com Mianmar, inclusive vetando resoluções que venham a condenar a brutalidade dos atos contra opositores e a população civil em geral, como no caso de dezembro de 2022.
Inicialmente, o golpe de Estado foi recebido com reprovação pela China, que vinha dialogando para firmar acordos comerciais com o governo eleito e perdeu financeiramente com a queda. Mas o cenário mudou rapidamente. Para não se distanciar da junta, Beijing classificou a prisão de Suu Kyi e de outros funcionários do governo como uma “remodelação de gabinete”, palavras usadas pela agência de notícias estatal Xinhua.
A China é um também dos principais fornecedores de armas para a juntar militar, desrespeitando um pedido de embargo global feito pela ONU para enfraquecer o regime birmanês. Há indícios de que as forças locais seguem se equipando com novos armamentos chineses, tendo ainda como fornecedores complementares a Rússia e o Paquistão.