Parlamento Europeu denúncia ‘coerção’ e diz que China distorce as regras internacionais

Órgão legislativo condena exercício militar no entorno de Taiwan e pede que a ilha volte a ter representantes em organismos multilaterais

As recentes manobras militares realizadas pela China no entorno de Taiwan, com o claro propósito de pressionar a ilha a aceitar se submeter ao domínio chinês, levaram o Parlamento Europeu, que equivale ao Poder Legislativo da União Europeia (UE), a emitir uma resolução condenando a postura de Beijing.

“O Parlamento condena as contínuas provocações militares da China contra Taiwan e rejeita firmemente qualquer mudança unilateral no status quo no Estreito de Taiwan”, diz o documento. “Essas tentativas, particularmente por meio de força ou coerção, não serão aceitas e incorrerão em uma reação decisiva e firme.”

A bandeira da União Europeia no Parlamento Europeu, em Bruxelas junho de 2013 (Foto: European Union/Pietro Naj-Oleari)

exercício militar realizado em 14 de outubro pelo Exército de Libertação Popular (ELP) marcou a maior incursão por parte da China em Taiwan, com um número recorde de aviões e navios no entorno da ilha. A manobra deixou claro que o governo chinês tem poder de fogo suficiente para sufocar o território vizinho, que reivindica como seu.

De acordo com a rede CNN, o Ministério da Defesa Nacional taiwanês identificou 153 aeronaves chinesas durante um período de 25 horas entre segunda e terça-feira. Destas, 111 cruzaram a Linha Mediana, uma fronteira informal que até recentemente era respeitada por Beijing. Antes, o maior número de aviões chineses no entorno da ilha havia sido de 103 ao longo de 24 horas, em setembro de 2023.

“O Parlamento rejeita veementemente as tentativas da China de distorcer a história e as regras internacionais e sublinha que a resolução 2758 da ONU não toma posição sobre Taiwan”, afirma o órgão legislativo.

O documento ainda condena a postura da China de pressionar seus aliados para que rejeitem a presença de representantes taiwaneses em organizações multilaterais como a Organização Mundial da Saúde (OMS) e a Organização Internacional de Polícia Criminal (Interpol). “Os eurodeputados também pedem à ONU que conceda aos cidadãos e jornalistas taiwaneses o direito de acessar suas instalações”, afirma o texto.

A resolução conclui afirmando que “o comportamento cada vez mais agressivo da China” atualmente “representa um risco à segurança regional e global” e pede às nações europeias que “intensifiquem suas próprias capacidades marítimas” nas imediações do estreito de Taiwan ante à ameaça chinesa e a sua aliança militar fortalecida com a Rússia.

Por que isso importa?

Taiwan é uma questão territorial sensível para a China, e a queda de braço entre Beijing e o Ocidente por conta da pretensa autonomia da ilha gera um ambiente tenso, com a ameaça crescente de uma invasão pelas forças armadas chinesas a fim de anexar formalmente o território taiwanês.

Nações estrangeiras que tratem a ilha como nação autônoma estão, no entendimento de Beijing, em desacordo com o princípio “Uma Só China“, que também vê Hong Kong como parte da nação chinesa.

Embora não tenha relações diplomáticas formais com Taiwan, assim como a maioria dos demais países, os EUA são o mais importante financiador internacional e principal parceiro militar de Taipé. Tais circunstâncias levaram as relações entre Beijing e Washington a seu pior momento desde 1979, quando os dois países reataram os laços diplomáticos.

A China, em resposta à aproximação entre o rival e a ilha, endureceu a retórica e tem adotado uma postura belicista na tentativa de controlar a situação. Jatos militares chineses passaram a realizar exercícios militares nas regiões limítrofes com Taiwan e habitualmente invadem o espaço aéreo taiwanês, deixando claro que Beijing não aceitará a independência formal do território “sem uma guerra“.

A crise ganhou contornos mais dramáticos após a visita da presidente da Câmara dos Representantes dos EUA, Nancy Pelosi, à ilha em 2022. Foi a primeira pessoa ocupante do cargo a viajar para Taiwan em 25 anos, atitude que mexeu com os brio de Beijing. Desde então, a tensão cresce até que, em outubro de 2024, a China realizou um de seus maiores exercícios militares no entorno da ilha.

O treinamento mostrou que Beijing tem condições de impor um bloqueio eficaz, impedindo tanto o transporte marítimo quanto a aviação no entorno da ilha. Trata-se de uma hipótese que vem sendo levantada há tempos por analistas, pois permitira à China sufocar Taiwan sem necessariamente iniciar uma guerra. Se colocada em prática, a medida aceleraria o consumo de materiais essenciais e levaria Taiwan ao colapso, jogando para os aliados ocidentais a decisão de abrir fogo ou não.

Apesar das alternativas apresentadas nas recentes manobras militares, uma invasão militar segue no radar chinês. “Estamos dispostos a lutar pela perspectiva de reunificação pacífica com a máxima sinceridade e empenho”, disse Chen Binhua, porta-voz do Gabinete de Assuntos de Taiwan na China, citado pela agência Reuters. “Mas nunca nos comprometeremos a renunciar ao uso da força”, adicionou.

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