Investimento estrangeiro direto: diferente de EUA e UE, Brasil abre mão de mecanismos de proteção

País adota postura liberal para atrair dinheiro de fora, mas sem um sistema centralizado de fiscalização assume riscos que muitos se esforçam para evitar

Nos últimos anos, o Brasil consolidou sua posição no cenário global de investimentos como um dos principais destinos para o investimento estrangeiro direto (IED). Prova disso é que, em 2023, segundo a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o país ocupou o segundo lugar no ranking global de destinos do IED, destacando-se pela atratividade de seu mercado interno e potencial de crescimento.

Mas, ao contrário dos Estados Unidos e da União Europeia (UE), que possuem estruturas sólidas de proteção ao investimento e dependem fortemente de uma vasta rede de Tratados Bilaterais de Investimento (TBIs) e de organismos como o Centro Internacional para Arbitragem de Disputas sobre Investimentos (ICSID), o Brasil adota uma abordagem diferenciada e flexível.

Em relação a outros países em desenvolvimento, o Brasil foi visto por muitos anos como um “rebelde” na regulação do IED. Na década de 1990, enquanto o mundo seguia em direção a uma regulação do investimento por meio de TBIs, o Brasil se opunha a esse modelo, argumentando que ele entrava em conflito com a sua Constituição e a soberania nacional. Essa postura fez com que o país adotasse mecanismos alternativos de atração e proteção ao investimento.

Cédulas de dólar, euro e libras esterlinas (Foto: Pickpik)

Entre as principais iniciativas está a criação dos Acordos de Cooperação e Facilitação de Investimentos (ACFIs), uma alternativa aos TBIs, focados em cooperação mútua e facilitação de investimentos, que priorizam a mitigação de riscos, a transparência e a resolução amigável de disputas por meio de comissões de conjuntos, em vez de arbitragem internacional.

Outro instrumento estratégico é o Conselho Nacional de Investimentos, responsável por coordenar políticas de atração de capital estrangeiro. A ideia é criar um ambiente de negócios mais favorável, promovendo a simplificação de processos e a redução de burocracias que dificultam o fluxo de investimentos.

Além disso, o Brasil conta com os Programas de Parcerias de Investimentos (PPIs), que visam fomentar investimento em setores estratégicos como infraestrutura, energia e transportes. São iniciativas de parcerias público-privadas (PPPs) que promovem maior colaboração entre o governo e investidores internacionais incluem.

De acordo com especialistas, essa abordagem pode ser interpretada como uma tentativa do Brasil de atrair mais investimentos estrangeiros, ao oferecer um ambiente mais receptivo e com menos burocracia. No entanto, essa flexibilidade também pode acarretar riscos, como a ausência de proteção suficiente contra práticas desleais e a chance de desvalorização de ativos.

Como funciona nos EUA e UE

Nos Estados Unidos, o Committee on Foreign Investments in the United States (CFIUS) é o órgão responsável por revisar investimentos estrangeiros diretamente, conforme o relatório da Unctad de 2021. Liderado pelo Departamento de Justiça, o comitê atua sob o Foreign Investment Risk Review Modernization Act (Firrma), vigente desde 2018, focando em áreas estratégicas como tecnologias críticas, infraestrutura essencial e negócios relacionados a dados pessoais. A análise prioritária é sobre riscos à segurança nacional.

Os investimentos em setores estratégicos devem, obrigatoriamente, passar pelo crivo do CFIUS. Contudo, o comitê tem autonomia para revisar operações não enquadradas como obrigatórias, caso identifique riscos potenciais.

Na Europa, o Regulamento de Triagem da UE, lançado em outubro de 2020, fortaleceu a cooperação entre a Comissão Europeia e os Estados-membros na análise de investimentos estrangeiros. A Comissão pode emitir pareceres não vinculativos em casos que ameacem a segurança ou a ordem pública de mais de um país.

Embora o regulamento europeu defina critérios claros para revisão de investimentos, cada Estado-Membro mantém autonomia para conduzir análises e aplicar restrições. As áreas prioritárias incluem infraestrutura crítica, tecnologias sensíveis e investimentos de origem governamental, alinhando-se em parte ao modelo norte-americano.

Atração e desafios para o capital estrangeiro no Brasil

Como parte da política liberal que adota, o Brasil reforça esforços para atrair investimentos estrangeiros em setores estratégicos como energia, infraestrutura e agronegócio. O Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC) lançou a Janela Única de Investimentos, plataforma que centraliza informações e facilita processos para o setor privado.

A neutralidade do Brasil em conflitos internacionais é um elemento-chave de sua política externa, o que atrai investimentos estrangeiros. Diferente de países envolvidos em disputas, o Brasil mantém boas relações diplomáticas com a maioria das nações, tornando-se um parceiro comercial atraente, especialmente para quem busca diversificação de mercados e fontes de abastecimento, ao oferecer estabilidade política e acesso a recursos e consumidores, segundo o Diplomatique.

Apesar dos avanços, o país enfrenta desafios. Em 2024, investidores estrangeiros já retiraram R$ 25,9 bilhões da Bolsa de Valores brasileira (B3), segundo a consultoria Elos Ayta, marcando a maior fuga de capital desde 2016, repercutiu a IstoÉ Dinheiro.

Os principais setores que atraíram investimentos estrangeiros no Brasil incluem:

  1. Setor de Energia e Petróleo: com investimentos em exploração e produção de petróleo e gás natural.
  2. Setor de Manufatura: incluindo indústrias automotivas, de alimentos e bebidas, e produtos químicos.
  3. Setor de Serviços: como telecomunicações, finanças e seguros.
  4. Setor de Tecnologia da Informação: com foco em startups e desenvolvimento de software.

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