Cinquenta mortos de Srebrenica são enterrados nos 27 anos do genocídio

Ato lembrou os mais de 8 mil homens e meninos muçulmanos bósnios presos e mortos pelas forças sérvias no país

Em memória ao 27º aniversário do genocídio de Srebrenica, lembrado nesta segunda-feira (11) na Bósnia, milhares de pessoas estiveram reunidas para acompanhar o enterro de restos mortais de 50 vítimas que foram identificadas recentemente. O massacre, que deixou 8 mil mortos em 1995, é tido como o pior na Europa desde a Segunda Guerra Mundial. As informações são da rede Radio Free Europe.

Mais de 3 mil pessoas participaram da Marcha da Paz 2022, uma caminhada de 110 quilômetros feita durante três dias até o cemitério memorial de Potocari, local em que ocorreu a cerimônia e onde descansam cerca de 6.670 mortos.

O ato foi uma homenagem às vítimas, homens e adolescentes muçulmanos da cidade de Srebrenica, assassinadas pelas forças sérvias da Bósnia. O crime é considerado um ato de genocídio, primeiro em 2001 pelo Tribunal Penal Internacional (TPI) e depois em 2007 pela Corte Internacional de Justiça. Autoridades sérvias e sérvias-bósnias rechaçam a classificação.

Centro Memorial Potocari, local onde as vítimas do genocídio descansam (Foto: Remembering Srebrenica/Divulgação)

Passados 27 anos, o episódio permanece como dos principais muros étnicos entre as comunidades bósnia (muçulmanos) e sérvia (cristãos ortodoxos).

A lembrança da tragédia também repercutiu em um inédito pedido de desculpas da Holanda à comunidade de Srebrenica, como forma de reconhecimento pelo fracasso suas forças em impedir o massacre durante a guerra dos bálcãs, que se estendeu de 1992 a 1995.

Naquele julho de 1995, a pequena cidade de Srebrenica, no leste da atual Bósnia e Herzegovina, era considerada uma “zona segura” pela missão de paz da Uniprofor (Força de Proteção das Nações Unidas), ativa entre 1992 e 1995, durante a guerra civil após a dissolução da antiga Iugoslávia.

Durante o conflito, muitas das vítimas fugiram para lá, onde acabaram descobrindo que as forças de paz holandesas em menor número não tinham capacidade para defendê-las. Quando os soldados das forças sérvias-bósnias, lideradas por Ratko Mladic – hoje condenado à prisão perpétua – cercaram a cidade, os 370 soldados holandeses não impediram nem a tomada nem a matança, que se estendeu até 22 de julho.

O primeiro-ministro holandês, Mark Rute, argumentou que as forças de seu país foram enviadas para uma missão com equipamento e apoio militar inadequados, que “acabou por se revelar impossível de cumprir”, repercutiu o jornal português Observador. Rute acrescentou que “os únicos responsáveis pelo genocídio foram os sérvios bósnios”.

Segundo a ministra da Defesa holandesa, Kasja Ollongren, que participou da cerimônia nesta segunda (11), “a comunidade internacional não ofereceu proteção adequada ao povo de Srebrenica”.

“O governo holandês compartilha a responsabilidade pela situação em que ocorreu essa falha. Por isso, oferecemos nossas mais profundas desculpas”, lamentou.

“Cidade de vida”

Hamdija Fejzic, presidente do comitê que organizou o evento e vice-prefeito de Srebrenica, disse que teve a sorte de ter sobrevivido ao genocídio, que chamou de “derrota da humanidade”.

Ele instou as autoridades da Bósnia-Herzegovina para que medidas concretas sejam tomadas para fazer de Srebrenica “uma cidade de vida, não um lugar de morte”.

“Em Srebrenica, as crianças nascidas após o genocídio crescem e são nossa esperança”, disse ele. “É nossa obrigação proporcionar a essas crianças condições normais de vida. Não precisamos de grandes palavras, mas de passos concretos que permitirão que as crianças cresçam juntas, independentemente da filiação nacional e religiosa”.

Crimes de ódio em alta no mundo

Segundo a ONG Remembering Srebrenica, uma organização de caridade com sede no Reino Unido que aumenta a conscientização sobre o genocídio da Bósnia, os crimes de ódio relatados aumentaram 9% desde o ano passado para um recorde de 124.091, com quase três quartos desses incidentes sendo crimes com motivação racial. 

“Estas estatísticas preocupantes sublinham a dimensão do problema que as nossas comunidades enfrentam, mas ainda há aqueles que continuam a negar a gravidade da questão que precisa ser abordada e não tomam as medidas necessárias, apesar dessas estatísticas e das experiências vividas daqueles na extremidade receptora de tal crime de ódio”.

Por que isso importa?

Na Bósnia, entre 1992-1995, cerca de 100 mil pessoas foram mortas, mais de 2 milhões foram deslocadas à força e entre 20 mil e 50 mil mulheres foram estupradas como parte da campanha sistemática de genocídio e limpeza étnica decretada pelas forças sérvias, segundo números da Remembering Srebrenica.

Em julho de 1995, quando as forças sérvias entraram na área segura de Srebrenica, eles dividiram as mulheres e os homens e começaram a massacrar brutalmente milhares de homens, meninos e qualquer um que estivesse em seu caminho. 

Na tentativa de esconder seus crimes em Srebrenica, os restos mortais das vítimas foram transferidos para valas comuns, eventualmente até valas comuns secundárias e, em alguns casos, valas comuns terciárias.

Desde o fim da brutal Guerra da Bósnia, cientistas forenses, bem como a Comissão Internacional para Pessoas Desaparecidas (ICMP) localizaram centenas de valas comuns em toda a Bósnia e Herzegovina. 

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