Desinformação russa: rede de sites falsos tenta impactar eleições na Alemanha

Ex-xerife norte-americano refugiado na Rússia criou mais de cem páginas com conteúdo falso gerado por IA para servir a Moscou

A poucos meses das eleições alemãs, uma rede de desinformação gerada por inteligência artificial (IA) está disseminando notícias falsas para influenciar o cenário político do país. Ligada ao fugitivo norte-americano John Dougan, a operação imita veículos de comunicação legítimos para espalhar conteúdos favoráveis ao partido de extrema direita Alternativa para a Alemanha (AfD) e atacar legendas tradicionais, como os Verdes. Pesquisadores afirmam que a estratégia reflete um modelo já utilizado nas eleições dos Estados Unidos no ano passado. As informações são da France24.

Segundo investigações da organização alemã Correctiv e do grupo americano NewsGuard, Dougan gerencia mais de 100 sites falsos que veiculam narrativas alinhadas aos interesses do Kremlin. O ex-xerife adjunto da Flórida, que fugiu para a Rússia enquanto enfrentava acusações como extorsão, nega qualquer envolvimento com o governo russo. No entanto, especialistas em inteligência associam sua rede à operação russa Storm-1516, uma campanha de influência digital conduzida pelo GRU, o serviço de inteligência militar de Moscou.

Estande de informações do partido Alternativa para a Alemanha (Foto: WikiCommons)
Fake news e manipulação política

Entre os conteúdos falsos propagados pelos sites da rede de Dougan está a alegação de que Robert Habeck, líder dos Verdes e atual ministro da Economia alemão, teria cometido abuso sexual. A acusação, sem qualquer base real, lembra uma campanha anterior do mesmo grupo, que espalhou boatos semelhantes contra o ex-candidato a vice-presidente dos EUA, Tim Walz.

Outra narrativa falsa amplamente compartilhada é a de que Berlim estaria planejando importar 1,9 milhão de trabalhadores do Quênia. A afirmação, desmentida por autoridades, foi construída para alimentar o sentimento anti-imigração que fortalece o discurso da AfD. Além de circular na Alemanha, a informação também foi publicada por sites de notícias africanos, uma tática que, segundo especialistas, visa esconder sua origem russa.

Além disso, a rede de Dougan disseminou um suposto escândalo de corrupção envolvendo o desaparecimento de pinturas do museu Gemäldegalerie, em Berlim. A história, também sem fundamento, procurava implicar políticos alemães, como Habeck e Claudia Roth, em um suposto esquema de desvio de recursos.

Táticas conhecidas, impacto reduzido

Pesquisadores que monitoram operações de influência russas afirmam que a Storm-1516 segue um padrão recorrente: criar múltiplos sites falsos, abastecê-los com artigos gerados por IA e ativá-los conforme necessário para campanhas específicas. Relatórios de inteligência europeus citados por veículos da imprensa americana descrevem Dougan como um propagandista do Kremlin financiado e orientado pelo GRU.

“O Kremlin está cada vez mais utilizando cidadãos não russos e fugitivos ocidentais para espalhar propaganda, evitando a detecção direta de seu envolvimento”, afirmou McKenzie Sadeghi, analista da NewsGuard, à AFP.

Ainda assim, os esforços de Dougan na Alemanha parecem ter um impacto menor do que nos Estados Unidos. De acordo com especialistas, a falta de familiaridade do operador com o cenário político e cultural alemão, aliada à exposição repetida de suas táticas, tornou a campanha mais fácil de identificar e rejeitar.

Reação das autoridades alemãs

Diante da ameaça crescente, o Ministério do Interior da Alemanha criou uma força-tarefa para combater desinformação, sabotagem, espionagem e ataques cibernéticos. O alerta das autoridades alemãs destaca que o Kremlin e seus aliados podem intensificar ações de interferência para impulsionar partidos extremistas e enfraquecer a confiança no sistema democrático.

Pesquisadores alertam que um governo alemão menos alinhado à Otan e à Ucrânia e mais cético em relação à integração europeia poderia beneficiar os interesses estratégicos da Rússia. Por isso, as operações de influência digital devem continuar até a eleição, com novas tentativas de manipulação da opinião pública.

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