Dia da Vitória na Rússia tem 11 mil soldados nas ruas, discurso de Putin e o Ocidente como vilão

Data comemorativa, que recorda o triunfo sobre os nazistas, teve discurso de Putin, mas em tom bem mais ameno que o imaginado

Nas últimas semanas, criou-se grande expectativa para o dia 9 de maio. Nessa data, a Rússia comemora o Dia da Vitória, lembrando o triunfo sobre os nazistas no fim da Segunda Guerra Mundial, em 1945. Especulava-se que o presidente Vladimir Putin, neste ano, aproveitaria o momento para declarar guerra formalmente à Ucrânia, ou quem sabe anunciar a vitória sobre o país vizinho. No final, as expectativas não se confirmaram, e a manifestação do líder russo até foi modesta.

O 9 de maio de 2022 em Moscou foi marcado por um grande desfile na Praça Vermelha, como ocorre todo ano. Participaram 11 mil militares e 131 peças de equipamento militar, segundo o Kremlin. Uma forma de mostrar ao Ocidente o poder militar russo, em meio às alegações de que suas tropas estão atoladas na Ucrânia e foram obrigadas a desistir de conquistar Kiev devido à forte e inesperada resistência do inimigo.

A grande presença de representantes das forças armadas na Praça Vermelha, porém, não se deve apenas ao fato de que o país está em guerra e precisa aumentar a propaganda estatal. Ela está totalmente alinhada com a relevância da data. “O dia 9 de maio foi planejado para se exibir para a torcida local, intimidar a oposição e agradar o ditador da época”, disse à rede CNN James Nixey, diretor do Programa Rússia-Eurásia da ONG britânica Chatham House.

Dia da Vitória na Rússia tem 11 mil soldados nas ruas, discurso de Putin e o Ocidente como vilão
Presidente Vladimir Putin no Dia da Vitória, 9 de maio, em Moscou (Foto: en.kremlin.ru/)
Passado x presente

O “ditador da época”, no caso Putin, adotou um tom épico em seu discurso nesta segunda-feira (9). “O dia 9 de maio de 1945 ficou para sempre consagrado na história mundial como um triunfo do povo soviético unido, sua coesão e poder espiritual, um feito sem paralelo nas linhas de frente e na frente doméstica”, disse Putin no discurso oficial.

Além de relembrar o caráter histórico da data, que, nas palavras do presidente russo, é “intimamente querida por todos nós”, Putin tratou de inseri-la no contexto atual. E fez referência à justificativa que tem dado para a invasão: “desnazificar” a Ucrânia,.

“Temos orgulho da geração corajosa invicta dos vencedores, temos orgulho de ser seus sucessores e é nosso dever preservar a memória daqueles que derrotaram o nazismo e nos confiaram a tarefa de vigilância e de tudo fazer para frustrar o horror de outra guerra global”, disse o presidente.

Ainda segundo Putin, o Ocidente é o verdadeiro responsável pelo conflito, pois se recusou a atender às demandas russas. “Em dezembro passado, propusemos a assinatura de um tratado sobre garantias de segurança. A Rússia instou o Ocidente a manter um diálogo honesto em busca de soluções significativas e comprometedoras e a levar em conta os interesses de cada um”, disse ele. “Tudo em vão. Os países da Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte) não queriam nos atender”.

O presidente ainda citou nominalmente os EUA, adotando um tom que remete aos dias de Guerra Fria. “Uma ameaça absolutamente inaceitável para nós estava sendo constantemente criada em nossas fronteiras. Havia todas as indicações de que um confronto com neonazistas e banderitas apoiados pelos Estados Unidos e seus asseclas era inevitável”.

Dia da Vitória na Rússia tem 11 mil soldados nas ruas, discurso de Putin e o Ocidente como vilão
Desfile no Dia da Vitória, 9 de maio, na Praça Vermelha, Moscou (Foto: en.kremlin.ru/)

Embora seja naturalmente um feriado importante, um dos mais relevantes do calendário russo, o 9 de maio tem ganhado ainda mais importância a cada ano. Vinha sendo usado sobretudo para fortalecer a imagem das forças armadas e seduzir os cidadãos russos, como quem prepara terreno para a guerra.

E, agora que o conflito está em andamento, coube a Putin exaltar seus soldados, colocando-os no papel de seus antepassados há 77 anos. “Você está lutando pela pátria, pelo futuro dela e para que ninguém se esqueça das lições da Segunda Guerra Mundial. Para que não haja lugar no mundo para carrascos, esquadrões de extermínio e nazistas”, disse o presidente da Rússia, sem citar que, ao menos aos olhos do Ocidente, são os russos os vilões da história em 2022.

Por que isso importa?

A escalada de tensão entre Rússia e Ucrânia, que culminou com a efetiva invasão russa ao país vizinho, no dia 24 de fevereiro, remete à anexação da Crimeia pelos russos, em 2014, e à guerra em Donbass, que começou naquele mesmo an. Aquele conflito foi usado por Vladimir Putin como argumento para justificar a invasão integral, classificada por ele como uma “operação militar especial”.

“Tomei a decisão de uma operação militar especial”, disse Putin pouco depois das 6h de Moscou (0h de Brasília) de 24 de fevereiro. Cerca de 30 minutos depois, as primeira explosões foram ouvidas em Kiev, capital ucraniana, e logo em seguida em Mariupol, no leste do país.

No início da ofensiva, o objetivo das forças russas era dominar Kiev, alvo de constantes bombardeios. Entretanto, diante da inesperada resistência ucraniana, a Rússia foi forçada a mudar sua estratégia. As tropas, então, começaram a se afastar de Kiev e a se concentrar mais no leste ucraniano, a fim de tentar assumir definitivamente o controle de Donbass e de outros locais estratégicos naquela região.

Em meio ao conflito, o governo da Ucrânia e as nações ocidentais passaram a acusar Moscou de atacar inclusive alvos civis, como hospitais e escolas, dando início a investigações de crimes de guerra ou contra a humanidade cometidos pelos soldados do Kremlin.

O episódio que mais pesou para as acusações foi o massacre de Bucha, cidade ucraniana em cujas ruas foram encontrados dezenas de corpos após a retirada do exército russo. As imagens dos mortos foram divulgadas pela primeira vez no dia 2 de abril, por agências de notícias, e chocaram o mundo.

O jornal The New York Times realizou uma investigação com base em imagens de satélite e associou as mortes em Bucha a tropas russas. As fotos mostram objetos de tamanho compatível com um corpo humano na rua Yablonska, entre 9 e 11 de março. Eles estão exatamente nas mesmas posições em que foram descobertos os corpos quando da chegada das tropas ucranianas, conforme vídeo feito por um residente da cidade em 1º de abril.

Fora do campo de batalha, a Rússia tem sido alvo de todo tipo de sanções. As esperadas punições financeiras impostas pelas principais potencias globais já começaram a sufocar a economia russa, e o país tem se tornado um pária global. Desde a invasão da Ucrânia, em 24 de fevereiro, mais de 600 empresas ocidentais deixaram de operar na Rússia, seja de maneira temporária ou definitiva, parcial ou integral.

Os mortos de Putin

Desde que assumiu o poder na Rússia, em 1999, o presidente Vladimir Putin esteve envolvido, direta ou indiretamente, ou é forte suspeito de ter relação com inúmeros eventos, que levaram a dezenas de milhares de mortes. A lista de vítimas do líder russo tem soldados, civis, dissidentes e até crianças. E vai aumentar bastante com a guerra que ele provocou na Ucrânia.

Na conta dos mortos de Putin entram a guerra devastadora na região do Cáucaso, ações fatais de suas forças especiais que resultaram em baixas civis até dentro do território russo, a queda suspeita de um avião comercial e, em 2022, a invasão à Ucrânia que colocou o mundo em alerta.

A Referência organizou alguns dos principais incidentes associados ao líder russo. Relembre os casos.

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