Os promotores da cidade ucraniana de Kherson estão trabalhando com uma equipe jurídica internacional recentemente enviada à região. O esforço conjunto entre as autoridades locais e a Global Rights Compliance (GRC) visa a reunir evidências de abusos sexuais cometidos por militares russos durante a guerra iniciada em 24 de fevereiro. As informações são da agência Reuters.
“Viemos para uma missão de três dias para apoiar o Gabinete do Procurador-Geral. Especificamente, a equipe investiga a violência sexual relacionada ao conflito”, disse Julian Elderfield, um dos consultores jurídicos que participaram da visita, que se estendeu de quinta (8) a sábado (10).
Junto dos promotores ucranianos, os representantes da GRC visitaram hospitais, um centro de distribuição de ajuda e outros locais. Nesses lugares, o trabalho investigativo se deu a partir de entrevistas com vítimas de supostos abusos, incluindo violência sexual.
Quem também está reunindo evidências em vídeo e fotografias que podem auxiliar na identificação dos agressores para futuros processos é a unidade especial de crimes de guerra da Ucrânia para violência sexual relacionada a conflitos.
Arma de guerra
Anna Sosonska, vice-chefe da unidade de crimes de guerra da Ucrânia para violência sexual, está à frente da investigação. Segundo ela, o possível papel de líderes políticos e militares russos nesses crimes será analisado.
“Em todos os lugares onde os soldados russos estavam baseados, eles cometeram crimes de guerra, cometeram violência sexual e torturaram, assassinaram”, disse ela, que acrescentou: “De acordo com os resultados desta viagem, descobrimos os fatos de violência sexual relacionadas ao conflito e as informações foram inseridas no registro unificado de investigações preliminares”.
Segundo Pramila Patten, representante especial da ONU (Organização das Nações Unidas) sobre violência sexual na guerra, tais crimes são parte da “estratégia militar” da Rússia, uma “tática deliberada para desumanizar as vítimas”. A afirmação foi feita por ela em maio, quando esteve em Kiev.
Moscou nega as alegações de que teria cometido crimes de guerra ou alvejado civis, bem como rechaça as acusações de violência sexual por suas tropas no país invadido.
Na sexta-feira (10), a porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da Rússia, Maria Zakharova, disse que um relatório de direitos humanos feito pela ONU, que relatou casos de violência sexual contra crianças, que foram estupradas, torturadas e mantidas reféns, foi baseado em “rumores e fofocas”.
Por que isso importa?
Andriy Kostin, procurador-geral ucraniano, afirmou no dia 19 de novembro que estão em andamento investigações a respeito de mais de 45 mil crimes de guerra atribuídos às tropas russas durante o conflito. Segundo ele, foram documentadas 8.311 mortes de civis por forças russas, sendo que 437 das vítimas são crianças. Há ainda mais de 11 mil feridos, tudo isso sem computar os dados dos territórios ocupados.
Inclusive, há dezenas de casos de violação do direito internacional já levados aos tribunais da Ucrânia, com uma sentença emitida: a do soldado russo Vadim Shishimarin, primeiro militar a enfrentar um processo do gênero. Ele foi condenado à prisão perpétua em maio, por matar um civil desarmado no dia 28 de fevereiro.
As investigações de crimes de guerra conduzidas por Kiev contam com o suporte ocidental, que ajuda a financiar os esforços do governo ucraniano e também tem suas próprias equipes em ação.
A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, disse também em novembro que a União Europeia (UE) tem planos de criar um tribunal especializado, apoiado pela ONU (Organização das Nações Unidas), para investigar e processar possíveis atrocidades cometidas pelas forças russas no país invadido.
Um grupo de especialistas em direitos humanos designados pela ONU constatou que crimes de guerra de fato foram cometidos na Ucrânia desde o início do conflito na Europa, no dia 24 de fevereiro. As evidências coletadas podem ser usadas por cortes internacionais, como o Tribunal Penal Internacional (TPI), para julgar futuros casos de crimes de guerra.