Ex-membro do Wagner Group que fugiu para a Noruega denuncia execuções sumárias

Andrei Medvedev, mantido no país escandinavo sob status de testemunha, diz se arrepender de ter servido à organização

Execuções sumárias de membros da própria facção fazem parte da rotina do Wagner Group, organização paramilitar privada russa que tem desempenhado papel decisivo a favor de Moscou na guerra da Ucrânia. A denúncia, que já havia feita em outras ocasiões, foi reforçada por Andrei Medvedev, de 26 anos, um ex-mercenário que fugiu para a Noruega e recebeu por lá o status de testemunha.

Em entrevista à agência Reuters, Medvedev afirmou que “o mais assustador” de servir como mercenário foi “perceber que existem pessoas que se consideram seus compatriotas e que podem vir e matá-lo em um instante ou por ordem de alguém”. E acrescentou: “Seu próprio povo. Isso provavelmente foi a coisa mais assustadora”.

O ex-combantente explicou que, em casos assim, as vítimas são ex-presidiários que aceitaram combater pelo Wagner Group em troca do perdão por seus crimes. “Houve um caso em que trouxeram dois presos que se recusaram a lutar e atiraram neles na frente de outros, por não seguirem ordens”, contou Medvedev ao jornal independente The Moscow Times. “Houve muitos desses casos”. 

Integrantes da organização paramilitar russa Wagner Group (Foto: VK/reprodução)

Nascido na Sibéria, Medvedev perdeu a mãe quando era jovem, e o pai fugiu pouco depois. Criado em orfanatos, juntou-se às forças armadas da Rússia aos 18 anos, em meio à guerra de Donbass, em 2014. Depois, chegou a ser preso algumas vezes, inclusive por roubo, até se juntar ao Wagner Group em julho de 2022

Ele conta que lutou na atual guerra da Ucrânia por quatro meses antes de abandonar o front em novembro do ano passado, quando a organização estendeu o contrato indefinidamente, mesmo contra a vontade dele. Ele diz que fugiu da Rússia pelo Ártico, conseguiu driblar a fiscalização de fronteira e chegou à Noruega, onde foi detido.

Interrogado pelas autoridades norueguesas, Medvedev sinalizou que estaria disposto a testemunhar contra figuras importantes da organização da qual fez parte. Ele está atualmente sob a tutela do Kripos, o Serviço Nacional de Investigação Criminal, uma agência especial da polícia norueguesa.

Execuções são rotineiras

O chefe do Wagner Group é Evgeny Prigozhin, importante aliado do presidente russo Vladimir Putin. Ele próprio teria sido responsável por recrutar presos para se juntar à organização em troca de anistia. Em setembro do ano passado, um vídeo compartilhado através do aplicativo de mensagens Telegram pela equipe do oposicionista russo Alexei Navalny mostra um indivíduo que se parece fisicamente com Prigozhin supostamente recrutando os criminosos.

No vídeo, o homem fala a um grande grupo de presos, todos com uniformes escuros. Ele se apresenta como membro da organização paramilitar Wagner Group e explica as condições que devem ser atendidas para o recrutamento. O contrato é para seis meses de serviços no campo de batalhas. Entre os avisos, ele diz que desertores serão fuzilados, justamente como denunciou Medvedev.

Denúncia semelhante foi feita em dezembro por um russo que se tornou prisioneiro de guerra das forças ucranianas. Porém, ele serve às forças armadas da Rússia, não ao Wagner Group, e foi identificado como Vladislav Izmailov. O homem disse ter visto dois soldados de sua unidade serem mortos após hesitarem diante do inimigo durante uma batalha.

“No primeiro ataque, eu era do segundo grupo. A equipe de evacuação estava à minha frente. Havia duas pessoas lá que estavam com medo. Era a primeira vez deles na guerra. E então esses dois foram ‘anulados’ na base”, disse ele. “Foram simplesmente baleados e enterrados”.

Também em dezembro, o Ministério da Defesa do Reino Unido disse, em seu balanço de inteligência sobre a guerra, que combatentes recrutados nos presídios russos são levados à Ucrânia para atuar na linha de frente e assim reduzir o risco à vida dos membros mais experientes do Wagner Group.

Os ex-presidiários, geralmente menos experientes, recebem um tablet ou celular que mostra a eles em um mapa a rota que deve ser seguida na linha de frente. Já os comandantes, aqueles com melhor treinamento, ficam na retaguarda, onde o risco é consideravelmente menor, de acordo com o governo britânico.

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