Exigências inaceitáveis da Rússia mantêm a inviabilidade de um cessar-fogo na Ucrânia

Plano de trégua entregue por Moscou antes da reunião em Istambul prevê retirada de tropas, veto à Otan e cessão de territórios

A proposta entregue pela Rússia para um cessar-fogo na Ucrânia impõe condições que já foram repetidamente rejeitadas por Kiev no passado, como a retirada de tropas de regiões ocupadas, a renúncia à entrada na Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte) e o reconhecimento das anexações promovidas por Moscou. O documento foi apresentado antes da rodada de conversas realizada na segunda-feira (2) em Istambul. Mas, ante às exigências, são mínimas as chances de um avanço concreto, segundo a agência Associated Press (AP).

A proposta russa oferece duas opções de trégua. A primeira exige que a Ucrânia retire suas tropas de Donetsk, Luhansk, Zaporizhzhya e Kherson, quatro regiões anexadas ilegalmente pela Rússia e ainda parcialmente sob o controle de Kiev. A segunda, descrita como um “pacote”, inclui a suspensão da mobilização militar, o congelamento das entregas de armas ocidentais, a interrupção de movimentações militares internas, a revogação da lei marcial e a realização de eleições.

O mesmo documento lista condições para um eventual tratado de paz. Moscou quer o reconhecimento internacional da anexação da Crimeia e das quatro regiões ocupadas, a neutralidade permanente da Ucrânia na disputa entre Rússia e Ocidente, o abandono da candidatura à Otan e a limitação do poder das Forças Armadas ucranianas. Também exige a oficialização do idioma russo no país vizinho e a dissolução de grupos considerados “nacionalistas”.

Guerra Ucrânia x Rússia (Foto: FlyD/Unsplash)

Do lado ucraniano, o posicionamento entregue antes do encontro reforça pontos que já vinham sendo repetidos desde o início do conflito. Kiev propõe um cessar-fogo imediato e sem pré-condições, defende sua soberania sobre todos os territórios internacionalmente reconhecidos e reafirma seu direito de buscar entrada na Otan. O texto também pede o retorno de crianças deportadas pela Rússia e propõe uma troca total de prisioneiros.

Com exigências claramente incompatíveis, o avanço das negociações é considerado improvável, e a proposta tende a funcionar apenas como um fortalecimento da posição russa. “Mesmo um documento não assinado dá ao Kremlin uma base diplomática mais sólida”, afirmou Sergei Poletaev, analista de defesa baseado em Moscou.

Para Tatiana Stanovaya, do think tank Carnegie Russia Eurasia Center, a proposta russa mostra que “a guerra deve continuar, ainda que as interações diplomáticas prossigam”. Observou, ainda, que o Kremlin oferece duas opções para empurrar Kiev a aceitar aquela que congela a ajuda militar ocidental, por saber que a retirada de quatro regiões “não é viável”.

Troca de prisioneiros

Ante à inviabilidade de um cessar-fogo, dada a distância entre as propostas de Kiev e Moscou, o encontro em Istambul serviu apenas para os negociadores acertarem uma nova troca de prisioneiros de guerra. O acordo prevê a libertação mútua de combatentes gravemente feridos e jovens ucranianos e russos, mas ainda não há data definida para sua execução.

Kiev também apresentou uma lista com 339 crianças deportadas ilegalmente pela Rússia e exigiu sua devolução, reiterando que o retorno dos menores é condição fundamental para qualquer avanço humanitário.

Apesar do impasse em torno do cessar-fogo e da ausência de consenso sobre os termos de paz, as duas delegações indicaram disposição para manter os canais de diálogo abertos. Autoridades turcas afirmaram que uma nova rodada de negociações poderá ocorrer nas próximas semanas, embora nenhuma data tenha sido confirmada até o momento.

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