Kosovo acusa a Sérvia de acumular tropas na fronteira e vê semelhanças com a invasão da Ucrânia

Governo kosovar diz que mercenários foram enviados por Belgrado em 24 de setembro para tentar iniciar uma guerra entre os dois países

A tensão na fronteira entre Sérvia e Kosovo aumentou a ponto de chamar a atenção dos Estados Unidos, que dizem monitorar a intensa a movimentação militar na região. O governo kosovar acusa Belgrado de acumular tropas perto da linha divisória em preparação para uma invasão em grande escala, nos moldes do que fez a Rússia com a Ucrânia.

“Não temos os números exatos, mas é um novo recorde, segundo nos informaram os norte-americanos”, afirmou a ministra das Relações Exteriores do Kosovo, Donika Gervalla-Schwarz, em entrevista à emissora alemã Deutschlandfunk. “Essa concentração de tropas nunca aconteceu nos últimos anos, bem como a potência das armas, com tanques e tudo. Nos deixa apreensivos porque não sabemos até que ponto a comunidade internacional está preocupada com o assunto.”

Gervalla-Schwarz, então, traçou um paralelo entre a situação atual e os eventos que antecederam a agressão russa em fevereiro de 2022. “Há dois anos e meio que alertamos para a escalada. Especialmente desde a guerra na Ucrânia, temos alertado com ainda mais urgência, porque não só as tropas estão sendo trazidas para a fronteira, mas todos os padrões são os mesmos”, disse ela. “A retórica, a escolha das palavras, os métodos… tudo é semelhante ao modo como Putin se comporta na Ucrânia.”

Soldados do exército da Sérvia, imagem de junho de 2018: conflito à vista? (Foto: nara.getarchive.net)

Em entrevista à agências Al Jazeera, o primeiro-ministro kosovar Albin Kurti disse que os sérvios estão em busca de uma justificativa para atacar. Para obterem tal argumento, teriam enviado cerca de 30 homens fortemente armados ao norte do Kosovo em uma missão de desestabilização no dia 24 de setembro.

Os mercenários teriam invadido a aldeia de Banjska, entrando em confronto com policiais. Um oficial kosovar e três invasores foram mortos durante uma troca de tiros em um mosteiro ortodoxo sérvio.

Segundo Kurti, havia no mosteiro um grande arsenal. “O que sabemos é que confiscámos cinco milhões de euros (R$ 26,5 milhões) em munições e armas e tudo foi produzido em fábricas na Sérvia”, disse. “Granadas de mão, metralhadoras, tudo o que confiscamos foi produzido na Sérvia e não pode ser encontrado no mercado. É óbvio que o exército da Sérvia deu isto às formações paramilitares.”

De acordo com o líder kosovar, o objetivo da Sérvia era iniciar a guerra naquele mesmo dia, exatamente como começou a guerra da Bósnia há três décadas. “Em 1º de março de 1992, durante um casamento, um padre ortodoxo sérvio foi ferido. Tomamos muito cuidado para que algo semelhante não acontecesse. Mas penso que queriam repetir os cenários do início da guerra.”

Nesta segunda-feira (2), o premiê usou sua conta na rede social X, antigo Twitter, para dar mais detalhes sobre os resultados da investigação referente ao incidente no norte do Kosovo.

“Com base na documentação confiscada, a polícia do Kosovo confirmou que o ataque terrorista fazia parte de um plano mais amplo para anexar o norte do Kosovo através de uma ação coordenada a 37 posições distintas. A isso se seguiria o estabelecimento de um corredor para a Sérvia, para permitir o fornecimento de armas e tropas”, publicou.

O primeiro-ministro, então, reforçou a denúncia de que os invasores atuaram a serviço de Belgrado. “Os terroristas que realizaram os ataques treinaram em Pasuljanske Livade, uma das principais bases do exército sérvio, cerca de quatro dias antes dos ataques. Outros exercícios aconteceram na base Kopaonik. Os ataques contaram com total apoio e planejamento do Estado sérvio.”

Reação norte-americana

John Kirby, porta-voz do Conselho de Segurança Nacional da Casa Branca, confirmou algumas das alegações de Kurti, mas disse que o propósito por trás do acúmulo de tropas não está claro. E afirmou que os Estados Unidos fizeram um apelo à Sérvia “para que retire essas forças da fronteira”, de acordo com a Al Jazeera.

“Estamos monitorando um grande destacamento militar sérvio ao longo da fronteira com o Kosovo”, disse Kirby na sexta-feira (29). “Isso inclui um acúmulo sem precedentes de artilharia sérvia avançada, tanques e unidades de infantaria mecanizada. Acreditamos que este é um desenvolvimento muito desestabilizador.”

Instado pelo secretário de Estado norte-americano Antony Blinken a “reduzir imediatamente a escalada e retornar ao diálogo”, o presidente da Sérvia, Aleksandar Vucic, minimizou o acúmulo de tropas e negou que suas forças armadas estejam em alerta máximo e prontas para uma invasão.

“Neguei inverdades que falam sobre o mais alto nível de prontidão de combate de nossas forças porque simplesmente não assinei isso e não é preciso”, disse o presidente na sexta-feira (29). “Não temos nem metade das tropas que tínhamos há dois ou três meses.”

Nesta segunda, o chefe do exército sérvio, general Milan Mojsilović, reforçou o argumento de que houve uma redução de tropas na fronteira, conforme relatou a Deutschlandfunk. O militar alega que em certo momento houve 8,3 mil soldados perto da linha divisória com o Kosovo, onde atualmente estariam 4,5 mil combatentes.

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