Nas universidades russas, cresce a repressão política contra estudantes e professores

Desde a invasão da Ucrânia, expulsões e demissões em instituições de ensino superior têm se tornado ferramentas de controle ideológico

Nos últimos dez anos, 86 estudantes foram expulsos e 92 professores demitidos de universidades russas por razões políticas, de acordo com levantamento do site The Insider. A repressão, que ganhou força após a invasão da Ucrânia em 2022, tem como epicentros instituições como a Universidade Estadual de São Petersburgo (SPbU) e a Universidade Islâmica Kunta-Haji, na Chechênia.

O aumento de expulsões é evidente em São Petersburgo, onde 23 estudantes foram afastados desde o início do conflito. Em um dos casos mais emblemáticos, 17 estudantes chechenos foram expulsos por se recusarem a participar de atos de apoio aos referendos organizados para anexar territórios ucranianos à Rússia. Apesar de os números serem alarmantes, especialistas acreditam que a repressão é ainda maior em regiões com menos transparência, como a Chechênia.

Polícia da Rússia atua no enterro de Alexei Navalny (Foto: x.com/USEmbRu)
Estudantes e professores como alvos da repressão

Desde 2017, quando protestos liderados por Alexei Navalny colocaram jovens no centro da oposição ao governo, universidades russas têm se tornado palco de punições exemplares. Expulsões com justificativas como “danos à reputação da instituição” ou “violação de princípios morais” se tornaram comuns.

“Expulsar estudantes por ações políticas fere o direito constitucional à educação, mesmo que as universidades tentem justificar isso com regulamentos internos”, avalia o advogado Timur Tukhvatullin, ligado ao projeto de direitos humanos Molniya.

Casos como o de Oleg Tarasov, estudante da Universidade Estatal de Moscou (MSU), evidenciam a arbitrariedade das punições. Ele foi expulso após renomear sua rede Wi-Fi para “Slava Ukraini!” (Glória à UcrâniaI). A administração universitária considerou a atitude “imoral” e em desacordo com os valores da instituição, e o jovem disse que em nenhum momento imaginou que uma ação como a dele poderia ter desdobramento tão sério.

Entre os professores, a situação é igualmente crítica. Na Universidade Superior de Economia (HSE), 34 docentes foram demitidos, 12 deles após o início da guerra. Mikhail Belousov, professor de história na SPbU, foi dispensado por postagens anti-guerra. Em outros casos, acadêmicos foram afastados sob alegações vagas de “comportamento inadequado”, como no caso de Maxim Kulaev, que protestou contra a presença de um sacerdote em um conselho acadêmico.

Controle político transforma as universidades russas

A repressão nas universidades está ligada à centralização do poder iniciada nos anos 2000. A partir de 2009, a eleição de reitores foi abolida em instituições como MSU e SPbU, permitindo que o governo nomeasse lideranças alinhadas a seus interesses. “Hoje, os reitores dessas universidades são essencialmente líderes todo-poderosos com a capacidade de agir sem limitações”, diz o ativista político exilado Mikhail Lobanov, ex-professor da MSU.

Essa mudança estrutural também permitiu que contratos de curto prazo fossem usados para controlar professores. “Isso coloca os professores em uma posição dependente, onde eles exigem menos, e a administração está pronta para realizar demissões sempre que for instruída a fazê-lo”, avalia Lobanov.

O historiador Dmitry Dubrovsky vê os estudantes cada vez mais enfraquecidos. “Isso criou uma situação em que o poder real nas universidades, pelo menos nas principais, mudou do ‘parlamento’, o conselho acadêmico, para reitores e professores titulares individuais. Esses indivíduos, motivados por altos salários, estavam dispostos a tolerar a falta de democracia e permaneceram inalterados por violações de direitos.”

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