Conforme o governo da Rússia aumenta a repressão e dificulta a vida de quem quer se posicionar contra o presidente Vladimir Putin ou a guerra da Ucrânia, os dissidentes criam novas e curiosas maneiras de protestar. Uma delas foi sugerida na quinta-feira (1º) pelo líder da oposição Alexei Navalny, que cumpre pena de 30 anos de prisão em um centro de detenção no Ártico.
Através de sua conta na rede social X, antigo Twitter, que é atualizada por apoiadores, Navalny sugeriu que os russos dispostos a contestar Putin apareçam para votar nas eleições presidenciais em um mesmo horário, meio-dia, no terceiro e último dia de votação. Assim, deixariam claro que há um bom número de pessoas contra o presidente.
“Gosto da ideia de os eleitores anti-Putin irem juntos às assembleias de voto ao meio-dia. Ao meio-dia contra Putin”, disse ele. “Isso poderia ser uma forte demonstração do sentimento nacional. Os eleitores reais versus a ficção do voto eletrônico. Pessoas reais fazendo fila para votar contra Putin, versus votos falsos e fraudulentos de ‘sim’.”
1/15 I like the idea of anti-Putin voters going to the polling stations together at 12 noon.
— Alexey Navalny (@navalny) February 1, 2024
At noon against Putin.
Segundo Navalny, simplesmente ir às urnas e depositar votos contra o presidente não teria um efeito prático, sob o argumento de que o pleito é fraudulento e será vencido por Putin de qualquer forma.
“Simplesmente participar das eleições e votar contra Putin não é uma luta contra ele, e sim uma forma de se frustar”, declarou. “Na verdade, é exatamente isso que Putin quer que você faça: venha votar como quiser, mas não faça mais nada.”
Já a iniciativa de ir aos locais de votação em um mesmo horário, ainda que sem expor qualquer símbolo ou mensagem de oposição, seria uma forma de protestar em silêncio e deixar isso registrado. E uma iniciativa que dificultaria a resposta das forças de segurança, segundo Navalny.
“Esta ação de protesto é totalmente legal e segura”, afirmou o oposicionista, lembrando que as próprias autoridades russas têm incentivado a presença de eleitores nos locais de votação. Ele diz, ainda, que o horário foi escolhido porque é naturalmente mais movimentado, o que garantiria aos manifestantes uma desculpa caso sejam abordados pela polícia.
“Não há como impedir esta ação. Bem, o que eles podem fazer? Fecharão as assembleias de voto ao meio-dia? Organizarão uma ação em apoio a Putin às 10h? Eles registrarão todos que compareceram ao meio-dia e os colocarão na lista de pessoas não confiáveis?”
A ideia do protesto, entretanto, não partiu do próprio Navalny, que diz ser apenas um porta-voz da iniciativa. Segundo ele, quem sugeriu a manifestação foi Maxim Reznik, um ex-deputado regional de São Petesburgo que passou a ser perseguido por ter se colocado contra Putin.
Por que isso importa?
Navalny ganhou destaque ao organizar manifestações e concorrer a cargos públicos na Rússia. A rede dele chegou a ter 50 sedes regionais em toda a Rússia e, entre outras ações, denunciava casos de corrupção envolvendo o governo Putin e figuras importantes ligadas a ele. Isso levou o Kremlin a agir judicialmente para proibir a atuação do opositor, que então passou a ser perseguido.
Em agosto de 2020, durante viagem à Sibéria, Navalny foi envenenado e passou meses se recuperando em Berlim. Ele voltou a Moscou em 17 de janeiro de 2021 e foi detido no aeroporto. Um mês depois, foi julgado e condenado por violar uma sentença suspensa de 2014, sob acusação de fraude. Promotores alegaram que ele não se apresentou regularmente à polícia em 2020, justamente quando estava em coma pela dose tóxica.
Encarcerado em uma colônia penal de alta segurança, ele chegou a fazer uma greve de fome de 23 dias em abril de 2021, para protestar contra a falta de atendimento médico. Depois, em junho daquele ano, um tribunal russo proibiu os escritórios regionais de Navalny e sua Fundação Anticorrupção (FBK) de funcionarem, classificando-os como “extremistas”.
Atualmente ele cumpre pena de 19 anos de prisão por acusações diversas, que vão desde fraude até extremismo, esta a mais grave. Navalny alega que as acusações são politicamente motivadas, uma forma de conter suas ações em oposição a Putin.