Papa define trabalho de mercenários russos na Ucrânia como ‘monstruoso’

Em entrevista, o sumo pontífice também se revelou contrário à ideia de minimizar a complexidade do conflito a heróis de um lado e vilões de outro, bem como mencionou os interesses da indústria de armas

O uso de mercenários pela Rússia na guerra da Ucrânia é “monstruoso”. Foi o que declarou o papa Francisco em entrevista à revista jesuíta La Civiltà Cattolica, publicada nesta terça-feira (14). Durante conversa com editores do veículo no mês passado, o pontífice, ao mesmo tempo em que condenou a “ferocidade e crueldade das tropas russas”, advertiu sobre o que poderia ser uma percepção fantasiosa do bem contra o mal. As informações são do jornal católico National Catholic Register.

“O que estamos vendo é a brutalidade e ferocidade com que esta guerra está sendo conduzida pelas tropas, geralmente mercenárias, usadas pelos russos. Os russos preferem enviar mercenários chechenos e sírios”, disse o papa.

Papa Francisco durante a 70ª Assembleia Geral da ONU em setembro de 2015 (Foto: UN Photo/Kim Haughton)

Além do desastre humanitário, o líder da Igreja Católica também fez menção aos interesses paralelos da indústria bélica no conflito, que estariam escondidos nos bastidores.

“Mas o perigo é que só vemos isso, que é monstruoso, e não vemos todo o drama que se desenrola por trás dessa guerra, que talvez tenha sido provocada ou não evitada. E note o interesse em testar e vender armas. É muito triste, mas no final das contas é isso que está em jogo”, lamentou.

O sumo pontífice também rechaçou qualquer sugestão de que seria favorável ao presidente russo Vladimir Putin. E procurou se distanciar de maniqueísmos relacionados à guerra, enfatizando que era contrário à ideia de minimizar a profundidade do conflito a uma separação entre heróis de um lado e vilões de outro.

“Alguém pode me dizer neste momento: então você é pró-Putin! Não, não suo. Seria simplista e errado dizer uma coisa dessas. Sou simplesmente contra reduzir a complexidade à distinção entre mocinhos e bandidos sem raciocinar sobre raízes e interesses, que são muito complexos”. 

A fala pode ter ligação com o fato de que o religioso tem enfrentado críticas por sugerir que “talvez” a Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte) possa ter provocado a guerra ao “latir nos portões” da Rússia, que “são imperiais e não podem ter nenhuma potência estrangeira se aproximando deles”, apontou a revista cristã America Magazine

“Precisamos nos afastar do padrão habitual de Chapeuzinho Vermelho, em que Chapeuzinho Vermelho era bom e o lobo era o mau”, disse ele. “Algo global está surgindo e os elementos estão muito entrelaçados”.

O papa Francisco também falou sobre sua expectativa de falar pessoalmente com o patriarca Cirilo, líder da Igreja Ortodoxa Russa e aliado de Putin. O encontro deve ocorrer no Cazaquistão, em setembro.

“Espero poder cumprimentá-lo e conversar um pouco com ele como pastor”, comentou.

Em maio, o papa contestou a passividade do patriarca Cirilo no que tange à guerra na Ucrânia e disse que ele “não pode se transformar no coroinha de Putin“. 

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