Rússia acusa 92 militares ucranianos de ‘crimes contra a humanidade’ e gera protesto da Anistia Internacional

Anistia Internacional contesta falta de provas contra os acusados e diz que o processo judicial russo pode configurar crime de guerra

Alexander Bastrykin, chefe do Comitê Investigativo da Rússia, afirmou ao jornal estatal local Rossiyskaya Gazeta, na segunda-feira (25), que Moscou investiga mais de 1,3 mil casos de supostos abusos cometidos por cerca de 400 militares ucranianos na guerra. Ao menos 220 indivíduos são suspeitos de “crimes contra a paz e a segurança da humanidade”, sendo que 92 deles já sofreram acusações formais. A situação levou a um protesto da Anistia Internacional.

“Um total de 92 comandantes e seus subordinados foram acusados, e 96 pessoas foram colocadas na lista de procurados, em particular 51 comandantes das Forças Armadas da Ucrânia“, disse Bastrykin, que citou casos de ” desenvolvimento de armas de destruição em massa por funcionários do Ministério da Saúde da Ucrânia” e “participação de mercenários na prática de atos criminosos no território da Ucrânia”.

Operação do exército ucraniano no leste do país (Foto: WikiCommons)

Segundo ele, a decisão de abrir as investigações aconteceu devido à convicção da Rússia de que os tribunais internacionais ignorariam os supostos abusos ucranianos. “Levando em conta a posição do “ocidente coletivo“, que patrocina abertamente o nacionalismo ucraniano e apoia o regime de Kiev, a criação de tal tribunal sob os auspícios da ONU na perspectiva atual é extremamente duvidosa”, afirmou.

Julgamento justo?

A iniciativa russa, que pode render a pena de morte em determinados casos, levou a uma manifestação de repúdio da ONG Anistia Internacional. “Ao acusar esses 92 membros das forças armadas ucranianas em procedimentos que carecem de transparência e dependem de e buscam alimentar desinformação, as autoridades russas mais uma vez revelaram seu descarado desrespeito aos direitos internacionais de julgamento justo e ao direito internacional humanitário”, disse Denis Krivosheev, vice-diretor da entidade para Europa Oriental e Ásia Central.

Segundo ele, Moscou atribui a militares ucranianos crimes de guerra cometidos pelas próprias forças russas, caso da destruição do teatro de Mariupol. Quanto aos crimes contra a humanidade citados, Krivosheev diz que não foram apresentadas evidências.

“Privar intencionalmente um prisioneiro de guerra do direito a um julgamento justo constitui um crime de guerra. As autoridades russas só devem processar prisioneiros de guerra se houver provas genuínas e admissíveis de crimes de guerra ou crimes contra a humanidade, caso em que devem ter direito a um julgamento justo de acordo com os padrões internacionais”, afirmou.

Em junho, uma corte da região separatista de Donetsk já havia anunciado a aplicação da pena de morte contra os britânicos Aiden Aslin e Shaun Pinner e o marroquino Saaudun Brahim, capturados enquanto lutavam pela Ucrânia, supostamente defendendo a cidade portuária de Mariupol, no sul.

Por que isso importa?

No início deste mês, o governo ucraniano disse que estão em andamento investigações de 21.897 crimes de guerra atribuídos às tropas russas durante o conflito iniciado no dia 24 de fevereiro. Segundo a procuradoria-geral do país, entre 200 e 300 denúncias são recebidas diariamente.

As investigações de crimes de guerra conduzidas por Kiev contam com o suporte ocidental, que ajuda a financiar os esforços do governo ucraniano e também tem suas próprias equipes em ação. A Alemanha, por exemplo, disse no final de junho que analisa centenas de crimes de guerra possivelmente cometidos por tropas da Rússia.

Já o TPI (Tribunal Penal Internacional) afirmou recentemente que planeja abrir ainda neste ano o primeiro caso contra as forças armadas da Rússia. Não foram revelados detalhes de qual poderia ser este primeiro processo, embora venha sendo debatida com Kiev a entrega de pelo menos um oficial russo ao tribunal. Trata-se de um prisioneiro de guerra disposto a testemunhar contra altos comandantes russos. 

No início de junho, a Comissão Europeia anunciou que destinaria 7,25 milhões de euros ao TPI, a fim de apoiar as investigações. “Neste contexto, é crucial garantir o armazenamento seguro de provas fora da Ucrânia, bem como apoiar as investigações e processos por várias autoridades judiciárias europeias e internacionais”, disse o órgão na ocasião.

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