Venda de petróleo russo à Índia dispara e reduz impacto das sanções ocidentais

Nova Délhi aumentou mais de 13 vezes a compra do combustível e rendeu US$ 37 bilhões a Moscou em 2023, segundo estudo

Em 2023, a Rússia faturou US$ 37 bilhões somente com a venda de petróleo cru à Índia, que aumentou mais de 13 vezes o volume de compra do produto na comparação com o período anterior à guerra da Ucrânia. E parte do combustível já refinado, um montante de US$ 1,3 bilhão, acabou nos Estados Unidos, segundo reportagem da rede CNN.

Dados fornecidos pelo Centro de Pesquisa em Energia e Ar Limpo (CREA, na sigla em inglês) indicam que Nova Délhi assumiu o vão deixado por muitas nações que reduziram ou suspenderam a compra de petróleo cru de Moscou devido à guerra. Na visão de especialistas, o comércio com a Índia é crucial para a Rússia reduzir o impacto das sanções de que foi alvo em virtude da guerra.

Via de regra, as negociações não desrespeitam as sanções, graças às exceções previstas para o transporte do produto que permitem à Índia negociar. Porém, há indícios de irregularidade no preço, já que parte do petróleo cru é transportada pela chamada “frota sombria”, uma estratégia adotada por Moscou para dificultar a fiscalização.

Plataforma de petróleo no Mar Negro: combustível sustenta a guerra russa (Foto: Wikimedia Commons)

A “frota sombria” é composta por embarcações muitas vezes antigas e em mau estado de conservação que também usam seguros inadequados, uma perigosa combinação que gerou alertas de ambientalistas para os riscos que elas representam.

A propriedade desses navios é um mistério, cabendo muitas vezes a empresas de fachada para dificultar a fiscalização. A transferência do petróleo cru de um navio para outro durante a rota de transporte é outra estratégia para viabilizar os negócios e proteger seus protagonistas de punições por desrespeitarem as sanções.

“As transferências às vezes são feitas legalmente, mas também podem ser usadas como uma tática ilícita para evitar sanções”, disse o analista David Tannenbaum, da empresa de inteligência marítima Pole Star Global. “Você está adicionando várias camadas ao jogo dos navios enquanto eles tentam confundir as autoridades sobre a origem do petróleo e quem o compra no final das contas.”

Controle de preço

Na visão dos especialistas ouvidos pela CNN, o que levou Moscou a adotar tais táticas é o teto do preço do petróleo, fixado em US$ 60 por barril em dezembro de 2022. Trata-se de uma estratégia do G7, grupo das maiores economias democráticas do mundo, para tentar conter o faturamento da Rússia. Assim, com ajuda da “frota sombria”, o Kremlin consegue vender seu produto por valores superiores.

“Quanto mais longas forem as cadeias de abastecimento, mais difícil será desembaraçar as transferências entre navios e mais difícil será determinar o custo real de um barril russo”, afirmou Viktor Katona, chefe de análise de petróleo bruto na empresa de pesquisa comercial Kpler.

No caso das transações entre Rússia e Índia, uma parte é feita dentro das regras do jogo. Outra, no entanto, adota os subterfúgios citados. Tannenbaum diz que que isso ocorre possivelmente para driblar as sanções, já que o produto refinado acabará nos EUA ou na União Europeia (UE) e por isso estará sujeito ao teto de preço.

Os EUA, aliás, são os maiores compradores de produtos petrolíferos refinados da Índia, tendo investido US$ 1,3 bilhão desde que foi adotado o teto de preço até o fim do ano passado. E tais negociações não são cobertas pelas sanções, algo que os analistas enxergam como uma omissão que precisa ser corrigida.

Em sua defesa, Nova Délhi argumenta que as transações com Moscou respeitam as regras. E acrescenta que ajudam a sustentar o preço global do barril, que teria disparado com o petróleo russo fora do mercado.

A Rússia por sua vez, fatura também com o processo de refinamento, vez que uma empresa do país opera uma refinaria na Índia por onde passa o petróleo cru. E assim Putin consegue manter sua máquina de guerra em operação, apesar das sanções.

Em 2023, as receitas federais da Rússia atingiram US$ 320 bilhões, com a previsão de que aumentem ainda mais neste ano. Um terço dessa quantia foi investido na guerra da Ucrânia, fatia que igualmente tende a ser maior em 2024. Do outro lado, a Ucrânia vê o dinheiro escassear, com o apoio financeiro crucial dos EUA e da UE cada vez menor.

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