Em um email aos funcionários, o secretário-geral da ONU, António Guterres, negou nesta terça (9) haver proibição de expressões pessoais em solidariedade ou engajamento pacífico em protestos antirracismo. A informação é da revista norte-americana Foreign Policy.
A declaração desta terça vai na contramão da instrução dada na última semana para que os funcionários não participassem de manifestações. As passeatas ocorrem em todo o mundo após a morte de George Floyd por brutalidade policial, em 25 de maio.
De acordo com a circular, as demonstrações públicas de apoio ao movimento afetam a reputação de imparcialidade do órgão. Guterres havia endossado essa recomendação, pedindo “contenção” aos funcionários.
As recomendações abordavam ainda a necessidade de manter o distanciamento social e evitar aglomerações durante a pandemia.
Neste primeiro momento, o secretário-geral também advertiu que os funcionários da ONU tinham status de servidores civis internacionais.
Quem quisesse se manifestar sobre o assunto deveria limitar suas atividades ao compartilhamento de comunidades de imprensa e posts de mídia social publicados pela própria ONU.
“Há uma coisa que todos nós podemos fazer que é retweetar e divulgar as mensagens da ONU que já foram emitidas em relação [aos protestos]”, teria dito Guterres em uma reunião virtual a qual a revista teve acesso.
A política da ONU sobre a participação de funcionários em protestos públicos é detalhada em uma série de diretrizes e regulamentos, que visam limitar participação em atividades políticas.
Críticas
A decisão gerou reações negativas de funcionários da organização e de defensores independentes de direitos humanos que atuam na ONU.
Segundo os críticos, a recomendação ia contra os direitos à liberdade de expressão e de reunião pacífica, que contam Carta da ONU e no Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos.
“Embora eu entenda a necessidade de garantir a imparcialidade de seu serviço público internacional, está claro que as regras internas da ONU não podem se sobrepor às amplas normas internacionais de direitos humanos”, disse o relator especial da ONU sobre direitos à liberdade de reunião pacífica e de associação, Clément Voule.
Segundo o advogado togolês, as questões discutidas nos protestos são as mesmas pelas quais a ONU luta desde a sua criação.
O recuo da ONU ocorre também depois da família de George Floyd fazer um apelo para que o Conselho de Direitos Humanos da ONU convoque uma sessão especial para investigar a violenta repressão policial em protestos nos EUA.
Em uma declaração, o Sindicato dos Funcionários da ONU disse confiar no “bom senso para encontrar o equilíbrio certo, para evitar comentários negativos e manter declarações e postagens construtivas e voltadas para o futuro.”
Dentro da ONU
Na declaração nesta terça, Guterres declarou que a própria ONU não está imune as acusações de discriminação e observou que 60% dos cargos de chefia eram ocupados por ocidentais.
Segundo o secretário-geral, haverá um debate interno sobre o racismo dentro da organização e que irá elaborar um plano de ação para enfrentá-lo.
Para Guterres, a brutalidade policial é um sintoma do racismo e uma incapacidade de lidar com desafios de administrar uma sociedade diversificada.