Grupo de especialistas afirma que não é seguro o retorno de refugiados à Síria

Comissão de Inquérito da ONU não vê perspectiva para o fim do conflito e afirma que não é seguro o retorno dos refugiados ao país

O futuro para o povo da Síria é “cada vez mais sombrio”. A afirmação foi feita na terça-feira (14) por um grupo de especialistas nomeados pela ONU (Organização das Nações Unidas), que destacam a escalada do conflito em várias áreas do país devastado pela guerra, a retomada das táticas de cerco à população civil e as manifestações populares em protesto contra a crise econômica.

De acordo com a Comissão de Inquérito da ONU sobre a Síria, o país não é seguro para o retorno dos refugiados que deixaram sua pátria em meio a um conflito que já dura uma década.

As conclusões do painel surgem em meio a um aumento da violência no noroeste, no nordeste e no sul do país, onde os comissários destacaram o arrepiante retorno do cerco contra a população civil por forças pró-governo.

“As partes em conflito continuam a perpetrar crimes de guerra e crimes contra a humanidade e a infringir os direitos humanos básicos dos sírios”, afirmou o chefe da comissão, o brasileiro Paulo Pinheiro. “A guerra contra os civis sírios continua, e é difícil para eles encontrarem segurança ou refúgio seguro”.

Crianças aprisionadas

Pinheiro também classificou como “escandaloso” o fato de que muitos milhares de crianças não sírias nascidas de ex-combatentes do Estado Islâmico (EI) continuam detidas em condições terríveis no nordeste da Síria. “A maioria das crianças estrangeiras continua privada de liberdade, já que seus países de origem se recusam a repatriá-las”, disse ele a jornalistas presentes à 48ª sessão do Conselho de Direitos Humanos em Genebra.

Cerca de 40 mil crianças continuam sendo mantidas em campos, incluindo o de Al Hol. Quase metade são iraquianos e 7,8 mil são de quase 60 outros países que se recusam a repatriá-los, de acordo com o relatório da Comissão de Inquérito, que cobre o período de 1º de julho de 2020 a 30 de junho de 2021.

Criança atingida por bombardeios mostra local onde morava em Homs, na Síria, em fevereiro de 2020 (Foto: Unicef/Abdulaziz Al-Droubi)

Cerco a civis

Os especialistas em direitos humanos também condenaram um cerco por forças pró-governo à cidade de Dar’a Al-Balad, o berço do levante em 2011, junto com “táticas de cerco” nas províncias de Quineitra e Rif Damasco.

“Três anos após o sofrimento que a Comissão documentou no leste de Ghouta, outra tragédia se desenrolou diante de nossos olhos em Dar’a Al-Balad”, disse o comissário Hanny Megally, em referência ao cerco ao leste de Ghouta, que durou mais de cinco anos – e que os comissários anteriormente rotularam de “bárbaro e medieval”.

Além dos perigos representados por pesados ​​bombardeios de artilharia, dezenas de milhares de civis presos em Dar’a Al-Balad não tinham acesso a alimentos e cuidados de saúde, obrigando muitos a fugir, disseram os comissários.

Nas regiões de Afrin e Ra’s al-Ayn, os comissários descreveram como as pessoas viviam com medo de carros-bomba “que são frequentemente detonados em áreas civis lotadas”, visando mercados e ruas movimentadas.

Pelo menos 243 mulheres, homens e crianças foram mortos em sete desses ataques durante o período de relatório de 12 meses, disseram eles, acrescentando que o número real provavelmente será consideravelmente maior.

Bombardeios indiscriminados também continuaram, incluindo um em 12 de junho, quando as munições atingiram vários locais na cidade de Afrin, no noroeste da Síria, matando e ferindo muitos e destruindo partes do hospital al-Shifa.

Paz distante

A insegurança nas áreas sob o controle das Forças Democráticas da Síria (SDF) no nordeste da Síria também piorou, de acordo com a Comissão de Inquérito, com o aumento dos ataques de “remanescentes” extremistas e conflito com as forças turcas.

Os comissários observaram que, embora o presidente Assad controle cerca de 70% do território e 40% da população, parece não haver “movimentos para unir o país ou buscar a reconciliação. Pelo contrário.”

Bashar Al-Assad, presidente da Síria (Foto: Wikimedia Commons)

Apesar de uma queda bem-vinda no nível de violência em comparação com anos anteriores, a Comissão de Inquérito destacou os perigos que continuam a ser enfrentados por não-combatentes

Os especialistas também destacaram o crescente descontentamento e os protestos entre a população, impactada pela escassez de combustível e a insegurança alimentar, que aumentou 50% em um ano, para 12,4 milhões, citando dados do UNFPA.

“As dificuldades que os sírios estão enfrentando, especialmente nas áreas onde o governo está de volta ao controle, estão começando a se mostrar em termos de protestos de sírios que têm sido leais ao Estado”, disse o Megally. Eles agora estão dizendo: ‘Dez anos de conflito, nossas vidas estão piorando em vez de melhorando. Quando veremos um fim para isso?’”.

Conteúdo adaptado do material publicado originalmente em inglês pela ONU News

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