Hamas montou arsenal graças a Teerã e Moscou e a um sofisticado sistema de túneis

Irã é o principal parceiro e fornecedor de armas e tecnologia do grupo radical, que ainda conta com o aval russo para produzir rifles e munição

O ataque realizado contra Israel no último sábado (7) expôs o enorme poder de fogo do Hamas, que usou parapentes motorizados e motos para transportar cerca de mil combatentes fortemente armados. Além disso, mais de cinco mil mísseis foram disparados contra o território israelense desde então, segundo as Forças de Defesa de Israel (IDF, na sigla em inglês). Mas, afinal, mesmo isolado na Faixa de Gaza, onde o acesso é fortemente controlado por Israel e Egito, como o grupo radical montou tamanho arsenal? A explicação está não somente no apoio do Irã e na conivência da Rússia, mas também na construção de um sofisticado sistema de túneis, segundo especialistas ouvidos pela rede CNN.

O apoio de Teerã é crucial para a sobrevivência do Hamas. Em relatório de contraterrorismo que aborda o ano de 2020, o Departamento de Estado norte-americano afirmou que o governo iraniano “fornece até US$ 100 milhões anualmente em apoio combinado a grupos terroristas palestinianos, incluindo o Hamas, a Jihad Islâmica Palestina e a Frente Popular para a Libertação da Palestina.”

E, desde o ataque, têm se acumulado denúncias de que o Irã contribuiu inclusive para esta ação, apesar de Washington manter cautela quanto à denúncia. Altos membros de grupos radicais ouvidos pelo jornal The Wall Street Journal (WSJ) alegam que agentes da Guarda Revolucionária Islâmica (IRGC, na sigla em inglês), a elite das forças armadas iranianas, atuaram em colaboração com o Hamas desde agosto para planejar uma ofensiva abrangente contra Israel.

Armas de um militante do Hama apreendidas pelas Forças de Defesa de Israel (Foto: IDF/WikiCommons)

De acordo com as fontes, o ataque a Israel, o mais grave no Estado judeu desde a Guerra do Yom Kippur, em 1973, foi planejado em várias reuniões realizadas em Beirute, no Líbano. Nesses encontros, estiveram presentes funcionários da IRGC e representantes de quatro grupos terroristas apoiados pelo Irã, incluindo o Hamas e o Hezbollah.

Embora os governos ocidentais, sobretudo o dos Estados Unidos, hesitem em acusar diretamente o Irã de envolvimento neste ato em particular, especialistas dizem que não há duvidas quanto à aliança ampla entre a República Islâmica e o grupo radical. Ela funciona não somente para o envio de armas ao Hamas, mas também para a formação de engenheiros capazes de construir em Gaza parte do arsenal da facção.

“Anos de acesso a sistemas mais avançados deram aos engenheiros do Hamas o conhecimento necessário para melhorar significativamente a sua capacidade de produção doméstica”, disse Charles Lister, membro do Programa de Defesa e Segurança do think tank Instituto do Oriente Médio (MEI, na sigla em inglês).

“Os engenheiros de foguetes e mísseis do Hamas fazem parte da rede regional do Irã. Então, o treino e o intercâmbio frequentes no próprio Irã são parte integrante dos esforços do Irã para profissionalizar as suas forças por procuração em toda a região”, acrescentou Lister.

Daniel Byman, membro sênior do Projeto de Ameaças Transnacionais do think tank Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais (CSIS, na sigla em inglês), reforça esse argumento. “O Irã também ajudou o Hamas com a sua produção local, permitindo ao Hamas criar os seus próprios arsenais”, declarou.

A CIA ratifica essa informação em seu World Factbook (livro de fatos mundiais, em tradução literal), uma publicação anual com informações de todos os países do mundo. Nele, a agência de inteligência norte-americana diz que “o Hamas adquire as suas armas através de contrabando ou construção local e recebe algum apoio militar do Irã.”

No domingo (8), um dia após o ataque, um alto funcionário do Hamas confirmou que muitas armas são realmente produzidas dentro da Faixa de Gaza. Em entrevista ao canal russo em árabe RTArabic, Ali Baraka, chefe de Relações Exteriores do Hamas, disse que inclusive Moscou tem uma parcela de responsabilidade.

“Temos fábricas locais para tudo: para foguetes com alcance de 250 quilômetros, de 160 quilômetros, de 80 quilômetros e de 10 quilômetros. Temos fábricas de morteiros e projéteis”, disse ele. “Temos fábricas de Kalashnikovs (rifles AK) e suas balas. Estamos fabricando as balas com permissão dos russos. Estamos construindo isso em Gaza.”

Há, porém, muitas armas, bem como o material necessário para a fabricação de seu próprio arsenal, que chegam ao Hamas através de contrabando, como diz a CIA. Para isso, o grupo conta com um sofisticado sistema de túneis que permite o transporte do material sem submetê-lo à fiscalização nos acessos a Gaza.

De acordo com Bilal Saab, investigador e diretor do Programa de Defesa e Segurança do MEI, “a infraestrutura de túneis do Hamas ainda é enorme, apesar de Israel e Egito a degradarem regularmente.” Lister, por sua vez, ressalta que componentes usados para a construção de armas chegam também por via marítima, sendo igualmente necessário driblar o patrulhamento.

De quebra, o grupo desenvolveu uma pequena indústria de reciclagem que reaproveita de tudo, desde sucata de ferro até munições israelenses de ataques anteriores. Nesse sentido, Aaron Pilkington, analista da força aérea dos EUA para o Oriente Médio, alerta que a própria contraofensiva de Israel tem servido para armar o Hamas, que reaproveitará toda a munição que puder recolher.

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