Suspeita de contrabando de armas dos EUA pelo Taleban persiste, apesar das negações

Arsenal abandonado no Afeganistão pelas forças norte-americanas vem surgindo no vizinho Paquistão e em outros lugares

Após o esvaziamento em agosto de 2021 da base militar de Bagram, que durante 20 anos foi o centro do poder militar dos EUA e de seus aliados no Oriente Médio no Afeganistão, as armas do exército norte-americano apreendidas pelo Taleban têm se espalhado além das fronteiras do país. As informações são da rede Voice of America (VOA).

No mês passado, um comandante israelense, que preferiu manter sua identidade anônima, revelou à revista Newsweek que as armas de fogo americanas capturadas em território afegão foram parar nas mãos de grupos palestinos na Faixa de Gaza. Além disso, esses armamentos que ficaram para trás têm surgido em outras regiões, incluindo o vizinho Paquistão.

Denúncias da imprensa levam a crer que a organização extremista está lucrando com o comércio ilegal dessas armas apreendidas, levantando preocupações de que eles possam estar controlando um mercado negro alicerçado em espólio de guerra.

Combatentes talibãs em Cabul, agosto de 2021 (Foto: WikiCommons)

O Taleban nega, mas os fatos contam outra história. Em 10 de julho, o porta-voz do Emirado Islâmico do Afeganistão, Zabihullah Mujahid, manifestou em sua conta no Twitter uma negação veemente das acusações de que os talibãs teriam vendido armas e equipamentos americanos deixados no país. Segundo ele, todo o equipamento foi armazenado em depósitos sob o controle total dos atuais governantes, e nenhuma venda ilegal ocorreu.

No entanto, relatórios indicam o contrário. Membros do Taleban foram diretamente implicados na comercialização dessas armas dos EUA no mercado negro. Embora o grupo tenha reforçado o controle sobre seus estoques de armas, a realidade é que algumas delas acabaram sendo vendidas ilegalmente, contradizendo a versão apresentada pelo porta-voz.

Durante o longo processo de evacuação das tropas ocidentais do Afeganistão, armas, veículos e outros itens de uso militar foram deixados para as forças armadas afegãs. Concluída a retirada dos militares aliados, o Taleban afegão tomou o poder e assumiu o controle de todo o arsenal do governo antecessor, repassando parte do material ao Tehrik-e Taliban Pakistan (TTP), popularmente conhecido como Taleban do Paquistão.

Em agosto de 2022, o Departamento de Defesa dos EUA estimou que o estoque do antigo governo afegão, no momento de seu colapso, continha equipamentos financiados por Washington no valor de US$ 7,12 bilhões. Esses equipamentos, que abrangiam aeronaves militares, veículos terrestres, armas e outros equipamentos militares, foram em grande parte apreendidos pelo Taleban.

Em novembro de 2021, o jornal The New York Times entrevistou traficantes de armas em Kandahar, no sul do Afeganistão, onde o Taleban tem sua base. Nessa ocasião, os criminosos estavam abertamente vendendo armas americanas, algumas das quais haviam sido adquiridas diretamente dos insurgentes.

Em setembro de 2021, a rede France 24 entrevistou um homem identificado como Murtaza, um vendedor de Kandahar, que revelou: “Assim que o Talibã tomou controle da base do exército afegão, compramos todas essas coisas deles. Agora, estamos trazendo tudo para o mercado e vendendo.”

Grande estoque

No início deste mês, um relatório conjunto divulgado pela Small Arms Survey (Levantamento de armas de pequeno porte, em tradução livre), uma organização independente de pesquisa com sede em Genebra focada em armas leves e violência armada, e pela ONG Afghan Peace Watch, baseada nos Estados Unidos, revelou que o Taleban havia reforçado seu controle sobre grandes estoques de armas americanas, além de estar envolvido em contrabando em menor escala.

Apesar disso, o relatório apontou que o “contrabando de armas” e a “venda civil de armas” ainda estão em andamento, especialmente onde as autoridades locais do Taleban impõem taxas sobre essas atividades. Além disso, o tráfico clandestino e não autorizado de armas também foi observado como uma realidade presente.

Segundo Asfandyar Mir, especialista em Sul da Ásia no Instituto de Paz dos Estados Unidos, o Taleban provavelmente “tem controle e impõe tributos sobre o emergente mercado negro de armas”.

Além disso, armas dos EUA também foram parar na Caxemira, a região mais ao norte do subcontinente indiano, onde Índia e Paquistão estão envolvidos em uma disputa territorial de longa data.

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