A fragilidade das alianças globais e a imprevisibilidade do governo de Donald Trump estão levando potências como Alemanha, Polônia, Coreia do Sul e Japão a reconsiderar o uso de armas nucleares como forma de garantir sua segurança. Com receio da confiabilidade do “guarda-chuva nuclear” dos EUA, esses países agora debatem abertamente suas opções de defesa nuclear, segundo o jornal Financial Times.
Na Alemanha, o debate ganhou força após Friedrich Merz, considerado o próximo chanceler do país, sugerir que o país deveria avaliar se a segurança nuclear garantida pelo Reino Unido e França poderia ser aplicada também à Alemanha. Embora Berlim abrigue cerca de 20 bombas nucleares dos EUA na base de Büchel desde 1983, políticos e especialistas discutem se o país deveria desenvolver sua própria capacidade nuclear, mesmo que isso possa gerar retaliações de Moscou e de outras nações europeias.

Na Polônia, o primeiro-ministro Donald Tusk se tornou o primeiro líder do país a mencionar a possibilidade de desenvolver armas nucleares ou pelo menos firmar um acordo de compartilhamento nuclear com a França. Seu rival político, o presidente Andrzej Duda, defende que os EUA deveriam transferir ogivas nucleares para território polonês, uma ideia considerada provocativa por Moscou e que Washington reluta em aceitar.
Na Ásia, a Coreia do Sul enfrenta uma crescente ansiedade com o progresso contínuo do programa nuclear da Coreia do Norte e a aliança cada vez mais próxima entre Pyongyang e Moscou. Autoridades sul-coreanas debatem a ideia de alcançar o status de “limiar nuclear”, mantendo infraestrutura para construir armas nucleares rapidamente, caso necessário. “O apoio para que a Coreia do Sul adquira suas próprias armas nucleares está se ampliando e se consolidando”, afirmou Sangsin Lee, pesquisador do Instituto de Unificação Nacional da Coreia.
O Japão, o único país do mundo a ter sofrido um ataque nuclear, enfrenta um dilema ainda mais complexo. Apesar de sua Constituição pacifista, o Japão mantém um significativo estoque de plutônio que poderia ser usado para fabricar armas nucleares em poucos meses, caso um consenso político seja atingido.
“O plano A é abraçar os EUA. O plano B é abraçar os EUA mais forte, e assim por diante. O plano Z, neste momento, é obter armas nucleares”, afirmou Stephen Nagy, professor de política e estudos internacionais da Universidade Cristã Internacional de Tóquio.
Embora a construção de arsenais nucleares seja considerada uma alternativa improvável por enquanto, os debates em torno do tema evidenciam uma crescente insegurança global. Para muitos desses países, a possibilidade de construir suas próprias armas nucleares passou de uma ideia impensável para uma opção que deve ser seriamente considerada diante de ameaças regionais e da possível perda do apoio dos EUA.
“O fenômeno Trump forneceu um poderoso acelerador para vozes em Estados aliados dos EUA que agora veem armas nucleares em suas próprias mãos como solucionadoras fundamentais do problema colocado pela falta de confiabilidade americana”, avalia Ankit Panda, analista do think-tank Carnegie Endowment e autor do livro The New Nuclear Age (A Nova Era Nuclear, em tradução literal).