O Estado Islâmico (EI) representa atualmente uma ameaça reduzida às nações ocidentais, graças à eficiente campanha de combate ao terrorismo realizada em todo o mundo. Ainda assim, o perigo não pode ser ignorado, sobretudo na Europa. Tais informações constam de um relatório divulgado na segunda-feira (14) pela ONU (Organização das Nações Unidas), elaborado por uma equipe de monitoramento e atualizado a cada seis meses.
No caso do continente europeu, o documento destaca que a organização tem usado “seu aparato de mídia” para realizar, desde janeiro, uma “campanha de incitação”, convocando “atores solitários” a responderem com violência aos seguidos episódios de queima do Alcorão em países europeus.
Além dos seguidores eventuais, geralmente recrutados pela internet, o EI conta com a força de sua facção no Afeganistão, o Estado Islâmico-Khorasan (EI-K). Diz o documento que a entidade “pode realizar ataques de alto impacto contra os países ocidentais e seus interesses no exterior no médio prazo, como evidenciado por um ataque recentemente interrompido em Estrasburgo, na França.”
Líderes mortos
Globalmente, o EI tem se enfraquecido cada vez mais, um processo iniciado desde que a organização foi derrotada em seus dois principais redutos. No Iraque, o exército iraquiano retomou todos os territórios que o grupo dominava desde 2014. Já as FDS (Forças Democráticas Sírias), uma milícia curda apoiada pelos EUA, anunciaram em 2019 o fim do “califado” criado pela organização extremista na Síria.
Ainda assim, o relatório afirma que o EI “continua a comandar entre cinco mil e sete mil membros em todo o Iraque e na República Árabe da Síria, a maioria dos quais combatentes”. No entanto, “adotou deliberadamente uma estratégia para reduzir os ataques, a fim de facilitar o recrutamento e a reorganização”.
Atualmente, a maioria dos líderes do EI permanece no noroeste da Síria, mas “o grupo realocou algumas figuras-chave em outros lugares”. Um continente de forte presença da organização é a África, com afiliados locais representando uma ameaça constante aos governos da região.
Um desses afiliados é o Estado Islâmico no Grande Saara (EIGS), que ampliou suas áreas de atuação, com aumento de ataques no Mali e, em menor escala, em Burkina Faso e no Níger. Recentemente, tem feito esforços para estabelecer “um corredor para a Nigéria para fins logísticos, de abastecimento e recrutamento, possivelmente em colaboração com o ISWAP” (Estado Islâmico da África Ocidental).
A avaliação da equipe de monitoramento da ONU, entregue ao Conselho de Segurança no final de julho, surge em meio a mais um momento crucial da luta contra o terrorismo. Desde fevereiro de 2022, o EI sofreu diversos duros golpes, com três líderes da organização mortos em operações de combate ao terrorismo.
O mais recente deles foi Abu al-Hussein al-Husseini al-Qurashi, morto em abril. O governo turco reivindicou a ação, embora a própria organização terrorista alegue que o comandante morreu em confronto com o Hayat Tahrir Al-Sham (HTS), uma organização extremista associada à Al-Qaeda e listada pelo governo norte-americano como terrorista.
“Apesar do progresso feito no direcionamento de suas operações financeiras e quadros de liderança, a ameaça representada pelo Daesh (sigla árabe para se referir ao grupo) e suas afiliadas regionais permaneceu alta e dinâmica nas amplas áreas geográficas onde está presente”, diz o relatório, citando a África como uma região de particular preocupação.
Terrorismo no Brasil
Episódios recentes mostram que o Brasil é visto como porto seguro pelos extremistas. Em dezembro de 2013, levantamento do site The Brazil Business indicava a presença de ao menos sete organizações terroristas no Brasil: Al-Qaeda, Jihad Media Battalion, Hezbollah, Hamas, Jihad Islâmica, Al-Gama’a Al-Islamiyya e Grupo Combatente Islâmico Marroquino.
Em 2001, uma investigação da revista Veja mostrou que 20 membros terroristas de Al-Qaeda, Hamas e Hezbollah viviam no país, disseminando propaganda terrorista, coletando dinheiro, recrutando novos membros e planejando atos violentos.
Em 2016, duas semanas antes do início dos Jogos Olímpicos no Rio, a PF prendeu um grupo jihadista islâmico que planejava atentados semelhantes aos dos Jogos de Munique em 1972. Dez suspeitos de serem aliados ao Estado Islâmico foram presos e dois fugiram.
Mais recentemente, em dezembro de 2021, três cidadãos estrangeiros que vivem no Brasil foram adicionados à lista de sanções do Tesouro Norte-americano. Eles são acusados de contribuir para o financiamento da Al-Qaeda, tendo inclusive mantido contato com figuras importantes do grupo terrorista.
Para o tenente-coronel do exército brasileiro André Soares, ex-agente da Abin (Agência Brasileira de Inteligência), os recentes anúncios do Tesouro causam “preocupação enorme”, vez que confirmam a presença do país no mapa das organizações terroristas islâmicas.
“A possibilidade de atentados terroristas em solo brasileiro, perpetrados não apenas por grupos extremistas islâmicos, mas também pelo terrorismo internacional, é real”, diz Soares, mestre em operações militares e autor do livro “Ex-Agente Abre a Caixa-Preta da Abin” (editora Escrituras). “O Estado e a sociedade brasileira estão completamente vulneráveis a atentados terroristas internacionais e inclusive domésticos, exatamente em razão da total disfuncionalidade e do colapso da atual estrutura de Inteligência de Estado vigente no país”. Saiba mais.