Dez anos após sequestro, 82 garotas não foram libertadas pelo Boko Haram

Anistia Internacional relembra a data e diz que falta 'vontade política' às autoridades da Nigéria para resolver o problema

No dia 14 de abril de 2014, 276 meninas foram sequestradas pelo grupo extremista Boko Haram de um dormitório escolar em Chibok, nordeste da Nigéria. Dez anos se passaram, e 82 das vítimas jamais foram libertadas. A Anistia Internacional usou a data para cobrar maior eficiência das autoridades nigerianas, instando-as a adotar medida capazes de assegurar o retorno seguro das jovens.

“É chocante que, nos dez anos desde o rapto na escola de Chibok, as autoridades nigerianas não tenham aprendido quaisquer lições ou tomado medidas eficazes para prevenir ataques às escolas. O número de raptos ocorridos desde 2014, inclusive no mês passado, e o fato de centenas de crianças ainda estarem sob custódia de homens armados, mostram a falta de vontade política das autoridades para resolver o problema”, disse Isa Sanusi, diretor da Anistia na Nigéria.

Embora o rapto das meninas tenha chamado a atenção para a prática, ela não foi devidamente combatida nos últimos anos. Ao contrário, tornou-se frequente. De acordo com a ONG, ao menos 17 casos de raptos em massa foram registrados desde então, com mais de 1,7 mil crianças levadas de escolas por homens armados.

Vídeo divulgado pelo Boko Haram em agosto de 2016 mostra parte das meninas sequestradas em escola de Chibok, na Nigéria, em 2014 (Foto: Reprodução/Youtube/Boko Haram)

O governo nigeriano chegou a estabelecer um programa de combate ao problema, a Iniciativa Escola Segura. Porém, denúncias de corrupção e obstáculos burocráticos impedem que o programa funcione corretamente.

“A realidade mostra que o governo não tem vontade nem compromisso para acabar com estes ataques às crianças e às suas escolas”, afirmou Sanusi, acrescentando os ataques a escolas e o rapto de estudantes podem constituir crimes de guerra.

A insegurança também afastou milhares de crianças da escola, com os pais temerosos de que possam ter o mesmo destino. Em Chibok, o estabelecimento onde ocorreu o sequestro, incendiado posteriormente pelos terroristas, foi reconstruída, ganhou curso secundário diurno e uma escola técnica. A frequência, entretanto, é mínima atualmente.

Casos recentes

Conforme a onda de sequestros persiste, o alto comissário da ONU (Organização das Nações Unidas) para os Direitos Humanos, Volker Turk, se manifestou em março sobre a questão e deu razão às alegações da Anistia. Ele pressionou o governo nigeriano para que realize investigações “imediatas, completas e imparciais” sobre os casos e responsabilize os envolvidos.

De acordo com relatórios recentes, pelo menos 564 pessoas foram vítimas de sequestro desde o dia 7 de março. Entre elas, mais de 280 alunos foram sequestrados em uma escola na cidade de Kuriga, localizada no estado de Kaduna.

Pelo menos 200 outras pessoas, em sua maioria mulheres e crianças deslocadas internamente, foram sequestradas no mesmo dia em Gamboru Ngala, no estado de Borno, quando supostamente buscavam lenha. 

Dois dias depois, homens armados invadiram um colégio interno no vilarejo de Gidan Bakuso, no estado de Sokoto, e sequestraram pelo menos 15 alunos. Em 12 de março, cerca de 69 pessoas foram sequestradas em dois ataques a uma aldeia na área de Kajuru, no estado de Kaduna.

Por que isso importa?

Os terroristas do Boko Haram lutam para criar um califado islâmico no nordeste da Nigéria. A ação já se espalhou para países vizinhos como Camarões, Chade, Níger e Benin, com assassinatos regulares, queima de mesquitas, igrejas, mercados e escolas e ataques a instalações militares.

Ultimamente, porém, o grupo passou a colecionar derrotas. Em junho de 2021, militantes do Boko Haram gravaram um vídeo no qual confirmaram a morte de Abubakar Shekau, seu notório ex-comandante.

Shekau morreu no dia 19 de maio daquele ano, em um confronto com jihadistas do rival ISWAP (Estado Islâmico da Província do Oeste da África) na floresta de Sambisa. “Shekau detonou uma bomba e se matou”, disse um militar nigeriano à época, em áudio ouvido pelo Wall Street Journal.

Formado por dissidentes do Boko Haram, o ISWAP se afastou de Shekau em 2016 e passou a se concentrar em alvos militares e ataques de alto perfil, inclusive trabalhadores humanitários. Depois da morte de Shekau, informações sugerem que houve uma aproximação entre os dois grupos, algo jamais confirmado oficialmente.

A insurgência islâmica na região já matou dezenas de milhares de pessoas, principalmente na Nigéria, e deslocou cerca de três milhões, segundo a ONU (Organização das Nações Unidas).

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