EUA denunciam crimes de guerra e contra a humanidade no conflito do Sudão

Forças Armadas Sudanesas e Forças de Apoio Rápido, em choque desde abril, são acusadas de assassinatos, estupros e limpeza étnica

Crimes de guerra, crimes contra a humanidade e limpeza étnica têm sido registrados no conflito que ocorre desde abril no Sudão. A denúncia foi feita na quarta-feira (6) pelo Departamento de Estado norte-americano e é direcionada às duas partes envolvidas no conflito, as Forças Armadas Sudanesas (SAF, na sigla em inglês) e as Forças de Apoio Rápido (RSF, na sigla em inglês).

“Com base na análise cuidadosa da lei e dos fatos disponíveis por parte do Departamento de Estado, determinei que membros das SAF e RSF cometeram crimes de guerra no Sudão. Também determinei que membros das RSF e milícias aliadas cometeram crimes contra a humanidade e limpeza étnica”, diz comunicado assinado pelo secretário de Estado Antony Blinken.

O documento traça um paralelo entre a situação atual e o genocídio contra os grupos étnicos fur, masalit e zaghawa ocorridos em Darfur em 2003, afirmando que a violência atual é “seletiva contra algumas das mesmas comunidades de sobreviventes.”

“Civis masalit foram caçados e deixados mortos nas ruas, suas casas foram incendiadas, e foram informados de que não há lugar para eles no Sudão”, afirma Blinken.

O texto denuncia, ainda, a violência sexual contra mulheres e meninas, bem como casos de pessoas que foram mortas sob detenção pelas duas partes envolvidas no conflito.

Por fim, Washington pede que a ajuda humanitária seja autorizada a entrar nas áreas de hostilidades e que uma solução seja encontrada para encerrar o conflito.

“Os Estados Unidos estão empenhados em desenvolver esta determinação e em utilizar as ferramentas disponíveis para pôr fim a este conflito e acabar com as atrocidades e outros abusos que privam o povo sudanês da liberdade, da paz e da justiça”, diz o documento.

Protestos no Sudão ocorreram em Cartum e outras partes do país (Foto: Salah Naser/ONU News)
Por que isso importa?

O Sudão vive um violento conflito armado que coloca frente a frente dois generais que comandam o país africano desde o golpe de Estado de 2021: Abdel Fattah al-Burhan, chefe das SAF, e Mohamed Hamdan “Hemedti” Daglo, à frente da milícia das RSF.

As tensões decorrem de divergências sobre a incorporação dos combatentes das RSF às Forças Armadas, o que levou a milícia a se insurgir. Hemedti tem entre 70 mil e cem mil homens sob seu comando, de acordo com a rede Deutsche Welle (DW), enquanto al-Burhan lidera um efetivo de cerca de 200 mil.

No dia 16 de abril, um domingo, explosões puderam ser ouvidas no centro da capital Cartum, mais precisamente no entorno do quartel-general militar do Sudão e do palácio presidencial, locais estratégicos reivindicados tanto por militares quanto pelas RSF.

O aeroporto internacional da capital, tomado pela milícia, foi bombardeado com civis dentro. Aeronaves foram destruídas, e caças da força aérea sudanesa e tanques foram usados contra os paramilitares.

Embora as SAF sejam mais bem equipadas e em maior número, as RSF são igualmente bem treinadas, o que equilibra as ações. O balanço de forças apenas prolonga as hostilidades e a violência decorrente, com nenhum dos dois lados conseguindo se impor sobre o inimigo.

Desde que o conflito se espalhou, primeiro pela capital, depois por outras regiões do país, as nações estrangeiras que tinham cidadãos e representantes diplomáticos no Sudão realizaram um processo de evacuação, viabilizado por um frágil cessar-fogo que não foi totalmente respeitado pela partes.

Os números de civis mortos e vítimas de abusos diversos não param de crescer desde então. A situação levou o secretário-geral da ONU (Organização das Nações Unidas), António Guterres, a dizer em julho que o país africano está “à beira de uma guerra civil.“

As Nações Unidas calculam que o conflito deslocou mais de 4,8 milhões de pessoas, sendo que cerca de 1,2 milhões buscaram abrigo nos países vizinhos.

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