Grupo paramilitar do Sudão é responsabilizado por massacre de civis

Governo diz que as Forças de Apoio Rápido 'indiscriminadamente abriram fogo contra moradores desarmados', com 85 mortes

As Forças de Apoio Rápido (RSF, na sigla em inglês), um grupo paramilitar liderado pelo general Mohammed Hamdan “Hemedti” Daglo, são acusadas de protagonizar um massacre que deixou 85 pessoas mortas em uma vila do Sudão, com mulheres e crianças entre a vítimas. As informações são da agência Associated Press (AP).

De acordo com o Ministério das Relações Exteriores do Sudão, as RSF, que enfrentam as Forças Armadas Sudanesas (SAF, na sigla em inglês) no conflito que assola o país, realizavam pequenas operações na vila de Galgani, província de Sennar, desde julho. Então, na semana passada, enviaram um pequeno grupo para assumir o controle da vila, mas a população resistiu.

Em resposta à resistência dos moradores, centenas de outros rebeldes chegaram em caminhonetes, armados com rifles automáticos, e realizaram o massacre.

O general Mohamed Hamdan Daglo, conhecido como Hemedti, líder das RSF, uma fação paramilitar envolvida no conflito no Sudão (Foto: Twitter pessoal)

Em comunicado, o Ministério afirmou que os membros da milícia “indiscriminadamente abriram fogo contra moradores desarmados da vila.” Os médicos que atuam na região dizem que há 24 corpos de mulheres e crianças entre os 85 mortos confirmados, com ao menos 150 pessoas feridas.

A denúncia do governo do Sudão é corroborada por testemunhas, sobretudo sobreviventes. De acordo com uma das fontes, um morador da vila, a violência se intensificou na última quinta-feira (15), com residências saqueadas e queimadas pelos rebeldes. Outro morador afirmou que os homens da milícia rebelde “estão nas ruas, e as pessoas não conseguem recuperar seus mortos e enterrá-los.”

Limpeza étnica

Em maio, a ONG Human Rights Watch (HRW) acusou a mesma milícia de realizar uma campanha de limpeza étnica contra os Massalit e outras comunidades não árabes sobretudo na capital de Darfur Ocidental, El Geneina.

De acordo com a ONG, o grupo armado aparente objetiva remover permanentemente esses grupos da cidade. Para tanto, realizou ataques nos quais visava “sistematicamente” homens e meninos, matando ainda pessoas que já haviam sido feridas, inclusive mulheres e crianças.

Membros proeminentes da comunidade, como médicos, advogados acadêmicos e defensores dos direitos humanos, foram vítimas de abusos, com bairros inteiros da cidade destruídos. A situação levou milhares de pessoas a deixarem suas casas, buscando refúgio na porção norte de El Geneina ou atravessando a fronteira nacional rumo ao Chade.

A operação realizada pelas RSF causou a morte de “milhares” de pessoas e o deslocamento de “centenas de milhares”, de acordo com a HRW. O caso vem sendo investigado pelo Tribunal Penal Internacional (TPI), que ao menos até o momento não usou a palavra “genocídio” em suas alegações.

Por que isso importa?

O Sudão vive um violento conflito civil que coloca frente a frente dois generais que comandam o país africano desde o golpe de Estado de 2021: Abdel Fattah al-Burhan, chefe das SAF, e Mohamed Hamdan “Hemedti” Daglo, à frente da milícia das RSF.

As tensões decorrem de divergências sobre a incorporação dos combatentes das RSF às Forças Armadas, o que levou a milícia a se insurgir. Hemedti tem entre 70 mil e cem mil homens sob seu comando, de acordo com a rede Deutsche Welle (DW), enquanto al-Burhan lidera um efetivo de cerca de 200 mil.

No dia 16 de abril, um domingo, explosões puderam ser ouvidas no centro da capital Cartum, mais precisamente no entorno do quartel-general militar do Sudão e do palácio presidencial, locais estratégicos reivindicados tanto por militares quanto pelas RSF.

O aeroporto internacional da capital, tomado pela milícia, foi bombardeado com civis dentro. Aeronaves foram destruídas, e caças da força aérea sudanesa e tanques foram usados contra os paramilitares.

Embora as SAF sejam mais bem equipadas e em maior número, as RSF são igualmente bem treinadas, o que equilibra as ações. O balanço de forças apenas prolonga as hostilidades e a violência decorrente, com nenhum dos dois lados conseguindo se impor sobre o inimigo.

Desde que o conflito se espalhou, primeiro pela capital, depois por outras regiões, cerca de dez milhões de pessoas foram deslocadas dentro do país, com mais de dois milhões forçadas a cruzar as fronteiras para o exterior. A crise maciça deixou 25 milhões de pessoas necessitando de ajuda humanitária e proteção.

A terrível situação é agravada por uma grave escassez de suprimentos essenciais, já que as entregas de produtos comerciais e de ajuda humanitária foram fortemente restringidas pelos combates e pelos desafios de acesso ao território controlado pelas RSF.

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