Jihadistas invadem campo para refugiados e matam 11 civis no norte do Mali

Autoridades alegam que a ação foi uma represália contra jovens que haviam escapado de ataques anteriores

Um grupo de extremistas islâmicos invadiu um campo para refugiados e matou 11 civis no norte do Mali, na última segunda-feira (21). A informação foi divulgada somente dois dias depois por trabalhadores humanitários, de acordo com o site The Defense Post.

O cenário da violência foi o campo de Kadji, próximo à cidade de Gao, a capital regional. Trata-se de uma área com forte presença de grupos extremistas, sendo o mais ativo deles o Estado Islâmico do Grande Saara (EIGS). Entretanto, nenhuma facção assumiu a autoria da ação.

O campo recebe dezenas de milhares de pessoas que fugiram justamente da violência em suas regiões de origem, sendo a maioria proveniente de Tessit.

De acordo com as autoridades malianas, o ataque foi uma represália dos jihadistas porque em Kadji se refugiam muitos jovens que fugiram de ataques anteriores.

“É terrível o que aconteceu”, disse um político local que falou sob condição de anonimato, por razões de segurança. “(O ataque) aconteceu no acampamento para os deslocados, para onde o povo de Tessit tem vindo desde que houve ataques às nossas casas”.

A violência extremista que atinge o Mali gerou dezenas de milhares de refugiados internos nos últimos anos, de acordo com a ONU (Organização das Nações Unidas). Somente em Gao foram registrados cerca de 60 mil deslocados.

Soldados do exército do Mali durante o golpe de Estado de 2012 (Foto: Wikimedia Commons()
Por que isso importa?

O Mali vive um período de instabilidade que começou com o golpe de Estado em 2012, quando vários grupos rebeldes e extremistas tomaram o poder no norte do país. De quebra, a nação, independente desde 1960, viveu em maio de 2021 o terceiro golpe de Estado em um intervalo de apenas dez anos, seguindo o que já havia ocorrido em 2012 e também em 2020.

A mais recente turbulência política começou semanas antes do golpe, com a demissão do primeiro-ministro Moctar Ouane pelo presidente Bah Ndaw. Reconduzido ao cargo pouco depois, Ouane não conseguiu formar um novo governo, e a tensão aumentou com a falta de pagamento dos salários dos professores. O maior sindicato da categoria, então, começou a se preparar para uma greve.

Veio a noite do dia 24 de maio, quando o coronel Assimi Goita, vice-presidente do país, destituiu Ndaw e Ouane de seus cargos e ordenou a prisão de ambos na capital Bamako. Segundo ele, os dois líderes civis violaram a carta de transição ao não consultarem o militar na formação do novo governo.

Ao contrário do que ocorreu em golpes anteriores, que contaram com apoio popular, desta vez a maior parte da população malinesa rejeitou a tomada de poder por Goita, que derrubou o governo de transição recém-instituído e assumiu o comando do país. A população civil não foi às ruas protestar contra o militar, mas usou as redes sociais para mostrar sua insatisfação.

Em meio à instabilidade política, cresceu no país a presença de grupos jihadistas ligados à Al-Qaeda e principalmente ao EI, o que levou a uma explosão da violência nos confrontos entre extremistas e militares, com milhares de civis entre as vítimas.

Os conflitos, antes concentrados no norte do Mali, se expandiram inclusive para os vizinhos Burkina Faso e Níger. Assim, a região central maliana se tornou um dos pontos mais violentos de todo o Sahel africano, com frequentes assassinatos étnicos e ataques extremistas contra as forças do governo.

A situação torna-se ainda mais delicada devido à retirada das tropas da França, que até agosto deste ano colaboravam com o governo nacional nas operações de contraterrorismo. A decisão de Paris gera dúvidas quanto à capacidade de o país africano sustentar os avanços obtidos na luta contra os insurgentes.

Quem assumiu o vácuo dos franceses foi o Wagner Group, um grupo russo de mercenários que firmou acordo de cooperação com Goita. Fontes sustentam que o pagamento pelos serviços da organização russa seria de US$ 10,8 milhões por mês, dinheiro que viria da extração de minerais.

Segundo o general francês Laurent Michon, comandante da Operação Bakhane das forças armadas da França, a retirada de suas tropas não tem nenhuma relação com a chegada dos mercenários, como se especulava. Ele diz que o governo militar maliano desde o início deixou claro seu desejo de “nos ver partir sem demora”.

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