Os rebeldes da TPLF (Frente de Libertação do Povo Tigré), partido político com um braço armado, anunciaram a decisão de recuar para a região de Tigré, após ganharem território em regiões vizinhas e avançarem rumo à capital da Etiópia, Adis Abeba. O anúncio é um passo importante rumo a um cessar-fogo que pode encerrar o violento conflito instalado no país há mais de um ano. As informações são da agência catari Al-Jazeera.
“Confiamos que nosso ousado ato de retirada será uma abertura decisiva para a paz”, disse Debretsion Gebremichael, chefe da TPLF, em uma carta enviada nesta segunda-feira (20) à ONU (Organização das Nações Unidas).
“Decidimos nos retirar dessas áreas para Tigré. Queremos abrir a porta para a ajuda humanitária”, disse Getachew Reda, porta-voz do grupo. “Não temos interesse em assumir a província de Afar. Não estamos interessados em fazer uma barganha difícil em Adis Abeba. Estamos apenas interessados em garantir que o cerco que foi impiedosamente imposto ao nosso povo seja rompido”.
Segundo Reda, a decisão de recuar para Tigré foi tomada há algumas semanas, e o processo já foi concluído. “Acabamos de concluir a retirada de nossas forças das regiões de #Amhara e #Afar. Ao fazer isso, acreditamos ter acabado com qualquer desculpa da comunidade internacional para explicar sua lentidão quando se trata de colocar pressão sobre #AbiyAhmed e seus parceiros regionais”, disse ele no Twitter.
We have just completed the withdrawal of our forces from both #Amhara&#Afar regions. By doing so, we believe we have taken away whatever excuse the the international community to explain its feet-dragging when it comes to putting pressure on #AbiyAhmed & his regional partners in
— Getachew K Reda (@reda_getachew) December 20, 2021
A contrapartida exigida pelos rebeldes inclui o fim das ações da força aérea etíope nos céus de Tigré, um embargo de armas na Etiópia e na vizinha Eritreia e um mecanismo gerido pela ONU para verificar a saída das tropas estrangeiras da região. A carta fala ainda em libertação de presos políticos e uma investigação internacional para apurar crimes de guerra.
Segundo Gebremichael, também é necessário o envio de ajuda humanitária à região. “Esperamos que, ao se retirar, a comunidade internacional faça algo sobre a situação em Tigré, já que não podem mais usar como desculpa que nossas forças estão invadindo Amhara e Afar”, disse.
O governo, porém, diz que a decisão dos rebeldes é resultado direto das vitórias obtidas pelo exército nacional e inclusive questiona a possibilidade de uma armadilha. “A TPLF sofreu grandes perdas nas últimas semanas e, portanto, está reivindicando ‘retirada estratégica’ para compensar a derrota”, disse Billene Seyoum, porta-voz do primeiro-ministro Abiy Ahmed.
Por que isso importa?
A região de Tigré, no extremo norte da Etiópia, está imersa em conflitos desde novembro de 2020, quando disputas eleitorais levaram Addis Abeba a determinar a tomada das instituições locais. A disputa opõe a TPLF às forças de segurança nacionais da Etiópia.
Os militares chegaram a reconquistar Tigré, mas os rebeldes viraram o jogo e começaram a ganhar território. No final de junho, eles anunciaram um processo de “limpeza” para retomar integralmente o controle da região e assumiram o comando de Mekelle, a capital regional.
Pouco após a derrota do exército, o governo da Etiópia decretou um cessar-fogo e deixou Tigré. Os soldados do exército aliada Eritreia também deixaram de ser vistos por lá. Posteriormente, com o avanço dos rebeldes e a conquista das regiões vizinhas de Afar e Amhara, o exército foi enviado novamente para apoiar as tropas locais.
Durante o conflito, a TPLF se aliou ao OLA (Exército de Libertação Oromo, da sigla em inglês), que no ano passado se desvinculou do partido político homônimo e passou a defender de maneira independente a etnia Oromo, a maior da Etiópia.
A coalizão passou superar o exército nos confrontos armados e atualmente ruma para a capital. A chegada a Adis Abeba pode representar a vitória derradeira dos rebeldes, o que levou o governo a convocar a população para pegar em armas em defesa da soberania nacional. Nas últimas semanas, os militares etíopes iniciaram uma campanha vitoriosa que levou ao recuo da TPLF e abriu espaço para a negociação de um cessar-fogo.