Combate à insegurança alimentar na América Latina exige reforço da proteção social e agrícola

Agências da ONU alertam que guerra na Ucrânia e crises internacionais comprometem acesso da região a alimentos e insumos

Um relatório da ONU apresentado na terça-feira (6) indica que América Latina e Caribe precisam fortalecer sua produção agrícola e sistemas de proteção social para acabar com a fome. O documento da Comissão Econômica para a região (Cepal) foi assinado também pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) e pelo Programa Mundial de Alimentos (PMA).

As agências da ONU dizem que essas medidas são necessárias para responder ao desafio de combater a insegurança alimentar, o aumento da pobreza extrema e apoiar a produção de alimentos na região.

As crises no mundo e a guerra na Ucrânia comprometem o acesso da América Latina e do Caribe aos alimentos e a insumos importantes para a agricultura regional.

O trabalho aponta que impacto da guerra na Ucrânia sobre os setores produtivos deve ser entendido no contexto das diversas crises, que afetaram a economia mundial nos últimos 15 anos. O estudo cita a crise financeira de 2008, as tensões comerciais entre os Estados Unidos e a China e a pandemia de Covid-19.

O relatório explica que essas crises resultaram em rupturas em diversas cadeias produtivas primárias e manufatureiras, seja pelo aumento das barreiras comerciais ou por disfunções no sistema de produção e transporte global de bens.

Agricultor Sidnei Peter, que cultiva soja em Planaltina (Foto: Tony Winston/Agência Brasília)

Já o conflito na Ucrânia afetou diretamente o comércio internacional de petróleo cru, gás natural, cereais, fertilizantes e metais.

Assim, o aumento dos preços da energia e dos alimentos é um dos fatores que levaram a uma redução do crescimento global em 2022. Prevê-se que a economia mundial cresça 3,1% em 2022, 1,3% menos que o prognosticado antes da guerra.

Segundo as últimas projeções da Cepal, o crescimento da América Latina e do Caribe será de 3,2% neste ano, mas se desacelerará para 1,4% em 2023, devido ao contexto internacional desfavorável.

A extensão da crise atual, com diversas ameaças de caráter produtivo, comercial, climático e geopolítico, não só ameaça a segurança alimentar, mas também pode levar a região e o mundo a grandes retrocessos em matéria de pobreza, desigualdade, ação climática e desenvolvimento sustentável, adverte o relatório.

Setor agropecuário

O secretário executivo da Cepal, José Manuel Salazar-Xirinachs, afirmou que, apesar de a região contar com um importante superávit comercial agropecuário,  ela está exposta a problemas de produção e comercialização e ao aumento dos preços, causado pela guerra na Ucrânia. Ele afirma que a região importa mais de 80% dos fertilizantes utilizados na agricultura.

Em sua avaliação, uma redução nos rendimentos e nas colheitas de produtos importantes para a segurança alimentar devido a um menor uso de fertilizantes se somaria aos efeitos daninhos da inflação de alimentos sobre a população mais vulnerável.

Inflação e insegurança alimentar

Como destaca o relatório, a inflação de alimentos aumenta o risco de problemas de acesso a uma alimentação saudável, insegurança alimentar e fome, pois afeta mais os domicílios de baixa renda.

Na região, a inflação que afeta os setores mais pobres é 1,4% mais alta que a correspondente aos setores mais ricos. Entre as pessoas de baixa renda, os alimentos correspondem a mais de dois terços da inflação geral enquanto o valor é menos da metade entre os mais ricos.

Os preços dos alimentos aumentaram mais que a inflação geral na região desde o fim de 2018 e se aceleraram a partir de maio de 2020. O índice de preços dos alimentos na região em 12 meses alcançou 1,7% em setembro de 2022, frente a 7,1% no caso da inflação geral.

Segundo a FAO, em março de 2022 o índice de preços dos alimentos, medido em termos reais, alcançou seu máximo nível histórico: 156,3 pontos.

Proteção social

O estudo indica que é preciso reforçar o papel ativo que os sistemas de proteção social, inclusive os programas nacionais de alimentação escolar, desempenharam durante a fase mais crítica da pandemia para evitar que os segmentos mais vulneráveis da população, como crianças e idosos, sejam irreversivelmente afetados pelo aumento dos preços dos alimentos.

Garantir o acesso dos pequenos produtores a fertilizantes e biofertilizantes é uma medida necessária e válida se for concentrada nos produtores que mais necessitam e condicionada à melhoria da eficiência no uso destes insumos e da sustentabilidade da atividade agropecuária.

O financiamento dessas iniciativas deve incluir não só os orçamentos públicos, mas também os bancos de desenvolvimento, privados e alternativas de financiamento internacional, como os títulos verdes e sociais, acrescenta o documento.

Finalmente, o relatório enfatiza que a complexidade e a magnitude das políticas necessárias para conciliar as respostas de emergência com a redução de problemas estruturais e fiscais demandam a coordenação em diversas áreas — macroeconômica, social e produtiva — e a articulação das respostas na região.

Conteúdo adaptado do material publicado originalmente pela ONU News

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