ONU aponta lacunas no Brasil no direito à terra e à saúde e na luta contra a discriminação

Comitê dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais propõe que país avance em demarcação de terras de povos tradicionais

Conteúdo adaptado de material publicado originalmente pela ONU News

O Brasil foi um dos seis países avaliados durante a última sessão do Comitê dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais das Nações Unidas. 

As conclusões, publicadas na segunda-feira (17), indicam que o país precisa avançar mais na proteção de direitos de povos tradicionais, na oferta de cuidados de saúde sexual e reprodutiva e na luta contra a discriminação, dentre outras recomendações.

O Comitê afirmou ainda estar preocupado com o fato de o Estado brasileiro “não estar no caminho certo para cumprir a sua contribuição determinada a nível nacional no âmbito do Acordo de Paris”, que trata de metas sobre o clima. 

Os especialistas do comitê afirmam que os relatos sobre apropriação de terras e o impacto negativo de alguns investimentos em grande escala e da exploração de recursos naturais nos direitos econômicos, sociais e culturais e no ambiente também são preocupantes. 

Indígenas da etnia Warao em alojamentos para deslocados de Manaus, Brasil (Foto: Acnur/Felipe Irnaldo)

Nesse sentido, a proposta é “agilizar a demarcação, regularização e titulação das terras e territórios dos povos indígenas, quilombolas e outras comunidades tradicionais de acordo com os padrões internacionais e defender os seus direitos, rejeitando a aplicação e institucionalização da doutrina do marco temporal.”

Outra sugestão é de que a concessão de licenças para tais atividades econômicas passem por “consultas destinadas a obter o consentimento livre, prévio e informado dos Povos Indígenas, Quilombolas e outras comunidades tradicionais.”

O grupo pede ainda que sejam reforçados mecanismos legais, alinhados com os padrões internacionais, para garantir que os povos tradicionais “sejam consultados sobre medidas legislativas ou administrativas que possam afetá-los.”

Saúde das mulheres e direito ao aborto legal

Em relação à saúde, o Comitê apontou preocupações com “os obstáculos que as mulheres enfrentam na obtenção de acesso ao aborto seguro, mesmo nos casos em que é legalmente permitido, especialmente por mulheres que enfrentam formas cruzadas de discriminação.” 

Os especialistas recomendam ao Brasil fazer a “revisão da legislação penal que proíbe o aborto, para torná-lo compatível com a integridade, autonomia e saúde das mulheres.”

O relatório menciona preocupação com as “elevadas taxas de mortalidade materna e com a falta de acesso a serviços e informações de saúde sexual e reprodutiva adequados” nas zonas rurais e periféricas.

Outros pontos de atenção mencionados no documento são o aumento de mortes relacionadas com doenças não transmissíveis e “a inadequação do financiamento e o frequente desvio de financiamento para implementar políticas de saúde.” 

Reparação histórica aos afrodescendentes

Para os especialistas, o Brasil precisa investir mais em medidas para prevenir e combater “a discriminação persistente, o racismo institucionalizado e a desigualdade estrutural das pessoas de ascendência africana.”

O grupo recomenda que o país adote uma “política específica de desenvolvimento social e econômico como forma de reparação histórica e com o objetivo deliberado de alcançar a sua mobilidade social e acesso em pé de igualdade a todos os direitos humanos, especialmente aos direitos econômicos, sociais e culturais.”

O documento aponta também que a prevalência de desigualdades socioeconômicas, raciais e de gênero, bem como com o estigma social tem relação com a ausência de legislação abrangente contra a discriminação.

O Comitê parabenizou medidas legislativas, administrativas e políticas adotadas pelo Brasil como a Emenda Constitucional que estabeleceu o direito à alimentação como um direito social fundamental na Constituição Federal, a criação do Ministério dos Povos Indígenas, do Ministério da Igualdade Racial, do Ministério da Mulher, a adoção da estratégia Brasil Sem Fome e a realização da Cúpula da Amazônia 2023.

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