Padres católicos que fizeram oração por preso político são presos na Nicarágua

Membros da Igreja são frequentemente acusados de traição por oferecerem ajuda a dissidentes e por contestarem a ditadura de Daniel Ortega

O governo do ditador Daniel Ortega na Nicarágua ordenou na quinta-feira (28) a prisão de dois padres católicos, as mais recentes vítimas da perseguição do regime contra a Igreja. Segundo a agência Reuters, as detenções ocorreram porque os religiosos fizeram orações em público pelo bispo Rolando Álvarez, preso político no país.

As detenções foram confirmadas por uma fonte que pediu para ter a identidade preservada, com medo de ser igualmente perseguida pelo ditador. Os padre foram identificados como Carlos Aviles e Hector Treminio, que seriam próximos da liderança católica nicaraguense.

O presidente da Nicarágua, Daniel Ortega, em foto de 2012 (Foto: Chancelaria do Equador)

A Igreja Católica, que desde 2018 tem oferecido ajuda a cidadãos perseguidos pelo regime, tornou-se assim alvo preferencial da repressão na Nicarágua, sob a justificativa do governo de combater casos de traição contra o Estado e outros crimes, como tentativa de golpe. Com as detenções de Aviles e Treminio, são ao menos seis os padres católicos presos por acusações do gênero.

Na semana passada, a rede CNN anunciou a prisão do bispo Dom Isidoro Mora, igualmente detido após rezar uma missa na qual citou a prisão de Rolando Álvarez. Ele também teria feito críticas ao governo durante a pregação.

Bispo de Matagalpa, Álvarez foi sentenciado a 26 anos de prisão por crimes como conspiração e traição, após se negar a deixar o país, em fevereiro deste ano, junto com um grupo de 222 pessoas que faziam oposição ao governo e foram expulsas da Nicarágua.

Chamado de “terrorista” por Ortega, ele deixou a prisão domiciliar e foi levado para um presídio, dando início à etapa mais dura da perseguição do governo aos líderes católicos locais.

“A perseguição contra a Igreja na Nicarágua é muito forte. Nos calamos porque se dissermos algo enfrentamos ameaças. Sabemos que o mundo sabe, mas sofremos a dor”, disse uma fonte ouvida pela CNN que igualmente pediu anonimato.

Por que isso importa?

Protestos populares tomaram as ruas da Nicarágua em 2018, quando a população se ergueu contra o regime de Ortega após medidas que mexeram nas pensões dos cidadãos. As manifestações ganharam corpo e amplitude, passando a contestar o regime como um todo.

A violenta repressão das forças de segurança matou centenas de pessoas e levou outras tantas a deixarem o país. Igrejas e demais instalações católicas tonaram-se um abrigo seguro para muitos manifestantes perseguidos, tornando padres e bispos um alvo central do governo.

Nesse cenário, grupos de defesa dos direitos humanos atribuem ao presidente e à mulher dele, a vice Rosario Murillo, diversas atrocidades, como execuções extrajudiciais, prisões arbitrárias, tortura, privação arbitrária da nacionalidade e do direito de permanecer em seu próprio país.

De acordo com relatório publicado pela ONU (Organização das Nações Unidas) em março de 2023, pelo menos 3.144 organizações civis foram fechadas desde dezembro de 2018, e praticamente todos os canais independentes de mídia e de organizações de direitos humanos operam atualmente a partir do exterior.

A perda de nacionalidade tornou-se uma prática comum na Nicarágua. Em fevereiro de 2023, 222 pessoas foram expulsas do país após serem acusadas de “trair a pátria”, enquanto o Tribunal de Apelos de Manágua declarou outros 94 indivíduos como traidores, retirando-lhes a nacionalidade.

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