Hong Kong adotou novas e duras regras de imigração para impedir a entrada de pessoas consideradas “indesejáveis”. Agora, todo visitante terá suas informações pessoais checadas antes do voo, permitindo que seja vetado, antes mesmo da viagem, o acesso ao território de qualquer um visto como uma ameaça aos interesses do governo chinês. As informações são da rede Radio Free Asia (RFA).
Os principais alvos da medida tendem a ser jornalistas e membros de grupos de direitos humanos que se posicionem contra o autoritarismo da China. As regras, em vigor a partir do dia 3 de setembro, determinam que as companhias aéreas que operem rotas para o território preparem um compilado das informações pessoais de cada passageiro e as enviem ao governo para uma triagem.
“O sistema de informações antecipadas sobre passageiros processará as informações instantaneamente e fornecerá uma mensagem de resposta, ou seja, uma orientação de embarque ou não embarque para cada viajante, de volta ao operador da aeronave”, disse um porta-voz do Departamento de Imigração.
A partir da resposta do sistema automatizado, caberá à própria companhia aérea a missão de impedir o embarque do passageiro. As restrições à entrada em Hong Kong de pessoas “indesejáveis” já eram uma prática comum no território, mas as novas regras facilitarão o trabalho de repressão por parte das autoridades.
A ativista Anna Kwok, diretora executiva do Conselho para a Democracia de Hong Kong, concorda que o principal alvo da medida serão jornalistas e defensores dos direitos civis. “O governo de Hong Kong teme que, se permitir que eles entrem na cidade, isso lhes dará a oportunidade de falar sobre a supressão dos direitos humanos em Hong Kong”, disse ela.
A medida é voltada somente a estrangeiros sem o direito de residência, não atingindo cidadãos de Hong Kong ou residentes. Contra esses, a principal arma de repressão do governo chinês continua sendo a lei de segurança nacional, que foi atualizada em março.
A aprovação do novo texto legal atende a uma determinação da Lei Básica, uma espécie de Constituição do território. Ela exigia em seu artigo 23 que um mecanismo legal próprio fosse estabelecido para substituir o anterior, este imposto emergencialmente pela China em 2020 para conter as manifestações populares pró-democracia de 2019.
A lei pune crimes como traição, insurreição, incitação de membros das Forças Armadas ao motim e conluio com forças externas. Também cita o crime de sedição, que não constava no texto antigo, e os casos mais graves são puníveis com a prisão perpétua.
Por que isso importa?
Após a transferência do domínio britânico para o chinês, em 1997, Hong Kong passou a operar sob um sistema mais autônomo e diferente do restante da China. Entretanto, apesar da promessa inicial de que as liberdades individuais seriam respeitadas, a submissão a Beijing sempre foi muito forte, o que levou a protestos em massa de 2019.
A resposta de Beijing aos protestos veio com autoritarismo, representado pela lei de segurança nacional, que deu ao governo de Hong Kong poder de silenciar a oposição e encarcerar os críticos. O antigo texto vinha sendo usado até março deste ano, quando uma nova lei, ainda mais dura, foi aprovada.
Os críticos ao governo local alegam que os direitos de expressão e de associação têm diminuído cada vez mais, com o aumento da repressão aos dissidentes graças à lei. Já as autoridades de Hong Kong reforçam a ideia de que a normativa legal é necessária para preservar a estabilidade do território.
O Reino Unido, por sua vez, diz que ela viola o acordo estabelecido quando da entrega do território à China. Isso porque havia uma promessa de que as liberdade individuais, entre elas eleições democráticas, seriam preservadas por ao menos 50 anos. Metade do tempo se passou, e Beijing não cumpriu sua parte no acordo. Muito pelo contrário.
Nos últimos anos, os pedidos por democracia foram silenciados, a liberdade de expressão acabou e a perspectiva é de que isso se mantenha por um “longo prazo”. Nas palavras do presidente Xi Jinping, “qualquer interferência deve ser eliminada.”