Justiça de Hong Kong acusa de sedição dois cidadãos que bateram palmas em tribunal

Acusados se manifestaram durante julgamento ligado à vigília em memória das vítimas do Massacre na Praça da Paz Celestial

Um homem e uma mulher de Hong Kong foram condenados por sedição após terem batido palmas e contestado um juiz. O episódio ocorreu durante um julgamento ligado à vigília à luz de velas realizada no ano passado, na Praça Vitória, em memória das vítimas do Massacre na Praça da Paz Celestial, ocorrido em 1989 na China. As informações são da agência Associated Press (AP).

Os acusados são o reverendo Garry Pang Moon-yuen e uma dona de casa, Chiu Mei-ying. Durante o julgamento de um dos líderes da vigília, eles bateram palmas e direcionaram críticas ao magistrado. O homem afirmou que o juiz “perdeu a consciência”, enquanto a mulher disse que ele ignorou a lei e julgou o caso de forma arbitrária.

Em vez de acusar a dupla de desacato, a corte afirmou que ambos tentaram jogar a população contra a Justiça de Hong Kong e os enquadrou no crime de sedição. Vídeos publicados por Pang no YouTube, nos quais ele igualmente critica decisões judiciais, foram usados para ampliar a denúncia contra ele, que acabou condenado a um ano de prisão. Já Chiu cumprirá três meses.

A acusação contra os dois se baseia em crime não previsto na lei de segurança nacional imposta pela China em 2020 e que foi uma reação direta aos protestos pró-democracia do ano anterior. Porém, tribunais locais têm usado os poderes conferidos pela lei para aplicar normas da era colonial que previam a sedição.

A vigília era um evento tradicional, realizado anualmente na Praça Vitória, em Hong Kong, sempre no dia 4 de junho, para relembrar os protestos por democracia na China em 1989, que foram esmagados pelo exército e levaram a um número até hoje desconhecido de mortos. Acredita-se que milhares de pessoas possam ter morrido, dados que o governo chinês esconde.

Nos últimos três anos, porém, a vigília foi proibida pelo governo chinês, inicialmente devido ao risco de contágio pela Covid-19 em virtude da aglomeração. Ainda assim, um grupo decidiu realizar a vigília em 2021, o que levou a uma ação policial a aos consequentes processos criminais.

Tribunal de última instância de Hong Kong (Foto: WikiCommons)
Por que isso importa?

Após se transferir do domínio britânico para o chinês, em 1997, Hong Kong passou a operar sob um sistema mais autônomo e diferente do restante da China. Entretanto, apesar da promessa inicial de que as liberdades individuais seriam respeitadas, a submissão a Beijing sempre foi muito forte, o que levou a protestos em massa por independência e democracia em 2019.

A resposta de Beijing aos protestos veio com autoritarismo, representado pela lei de segurança nacional, que deu ao governo de Hong Kong poder de silenciar a oposição e encarcerar os críticos. A normativa legal classifica e criminaliza qualquer tentativa de “intervir” nos assuntos locais como “subversão, secessão, terrorismo e conluio”. Infrações graves podem levar à prisão perpétua.

Os críticos ao governo local alegam que os direitos de expressão e de associação têm diminuído cada vez mais, com o aumento da repressão aos dissidentes graças à lei. Já as autoridades de Hong Kong reforçam a ideia de que a normativa legal é necessária para preservar a estabilidade do território

O Reino Unido, por sua vez, diz que ela viola o acordo estabelecido quando da entrega do território à China. Isso porque havia uma promessa de que as liberdade individuais, entre elas eleições democráticas, seriam preservadas por ao menos 50 anos. Metade do tempo se passou, e Beijing não cumpriu sua parte no acordo. Muito pelo contrário.

Nos últimos anos, os pedidos por democracia foram silenciados, a liberdade de expressão acabou e a perspectiva é de que isso se mantenha por um “longo prazo”. Nas palavras do presidente Xi Jinping, “qualquer interferência deve ser eliminada”.

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