Repressão estatal se intensifica às vésperas das eleições em Bangladesh

Segundo ONG, autoridades em Daca estão perseguindo líderes e apoiadores da oposição antes das eleições gerais previstas para janeiro do ano que vem

À medida que as eleições gerais se aproximam, com data marcada para 7 de janeiro de 2024, as autoridades de Bangladesh estão engajadas na repressão a líderes e apoiadores da oposição, alertou a ONG Human Rights Watch (HRW) no domingo (26). A organização apela a uma investigação imparcial de todos os casos de violência, instando à responsabilização em meio às acusações mútuas entre os lados envolvidos.

Desde a manifestação organizada pela principal sigla de oposição, o Partido Nacionalista de Bangladesh (BNP), no dia 28 de outubro, quase 10 mil ativistas opositores foram detidos, enquanto a violência contínua no país do sul da Ásia resultou em pelo menos 16 mortes, incluindo dois policiais, e mais de 5,5 mil feridos.

Julia Bleckner, investigadora sênior sobre a Ásia da HRW, destacou a contradição entre o compromisso declarado do governo com eleições livres e justas e a detenção massiva de opositores políticos. Ela apela aos parceiros diplomáticos para que deixem claro que “a repressão comprometerá a cooperação econômica futura”.

Protesto contra a violência em Bangladesh (Foto: Faisal Akram/Flickr)

Com base em entrevistas, vídeos e relatórios policiais, a HRW descobriu evidências de uso excessivo de força, detenções arbitrárias em massa, desaparecimentos forçados, tortura e execuções extrajudiciais durante recentes pleitos eleitorais em Bangladesh. Após a violência registrada no final do mês passado durante os atos de protestos, uma greve geral convocada pelo BNP resultou em confrontos, onde, embora houvesse hostilidade de ambos os lados, a polícia, em alguns casos, usou força excessiva em resposta aos protestos.

As autoridades locais acusaram a oposição de provocar tumultos, fechando os escritórios do BNP e considerando-os locais de crime. Segundo a HRW, líderes governamentais, incluindo a primeira-ministra Sheikh Hasina, alimentaram a violência ao encorajar publicamente ataques a manifestantes da oposição. No começo do mês, ela instigou seus apoiadores, dizendo que aqueles pegos cometendo incêndios criminosos deveriam ser lançados no mesmo fogo, defendendo uma abordagem de “olho por olho” para ensinar lições.

Vídeos e relatos indicam uma preocupante colaboração entre a polícia e os partidários da Liga Awami – partido no poder em Bangladesh – em ameaças e ataques contra ativistas opositores. Essas ações conjuntas estão gerando temor na população, levando até mesmo apoiadores do BNP a evitarem sair de casa.

Nesse cenário, as autoridades de Bangladesh estão detendo em massa membros da oposição como parte de uma tentativa evidente de reprimir a oposição e eliminar concorrentes antes das eleições gerais. Segundo o Partido Nacionalista do Bangladesh, cerca de metade de seus cinco milhões de membros enfrenta processos judiciais por motivações políticas.

Ativistas afirmam que as detenções atingem todos os níveis, desde líderes até membros de base.

Segundo a HRW, os abusos do governo estão questionando sua elegibilidade para programas vinculados a normas de direitos humanos e laborais. O Parlamento Europeu e os líderes da União Europeia (UE) expressaram recentemente preocupações durante uma visita ao país.

Centenas de desaparecidos

Em agosto de 2021, um relatório da ONG Human Rights Watch (HRW) apontou que ao menos 86 pessoas estavam à época desaparecidas em Bangladesh, todas vítimas da ação violenta das forças de segurança nacionais. Diz o documento que Daca “ignora apelos de governos doadores, da ONU, de organizações de direitos humanos e da sociedade civil para lidar com a cultura de impunidade.”

O relatório destaca, ainda, que o problema é antigo e não começou no atual governo. Porém, os desaparecimentos forçados, em particular, tornaram-se mais comuns no durante o governo da primeira-ministra Sheikh Hasina.

A HRW, porém, conseguiu apurar apenas uma pequena parcela dos casos, sendo a realidade bem mais terrível. Segundo o próprio relatório, grupos de direitos humanos calculavam quase 600 desaparecidos à força no governo de Hasina, que chegou ao poder em 2009.

Muitas das vítimas foram libertadas ou apresentadas para julgamento após semanas ou meses de detenção secreta. “Outras foram vítimas de execuções extrajudiciais que são falsamente alegados como mortes durante tiroteios”, diz o documento.

O governo insiste em negar qualquer participação nos desaparecimentos. Porém, segundo relatos das famílias de vítimas, as autoridades habitualmente se recusam sequer a abrir investigação a respeito dos desaparecimento, citando “ordens de cima” como justificativa para a impunidade.

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