Engenheiro chinês que pressionou trabalhadores no Ramadã é preso por blasfêmia

Funcionário da China Gezhouba Group Company fez comentários sobre o ritmo lento do trabalho e despertou a ira dos subordinados

Um engenheiro chinês, identificado como “Tian”, ​​foi preso nesta segunda-feira (17) pela polícia do Paquistão por suposta blasfêmia contra o Islã. Ele foi detido após dar ordens à sua equipe para que trabalhasse mais rápido em meio ao Ramadã, o mês sagrado dos muçulmanos. As informações são da rede Voice of America (VOA).

“Tian foi preso por volta das 2h da manhã de segunda-feira, depois que os protestos em todo o distrito de Kohistan no domingo”, disse à agência EFE o policial Naseer Uddin.

O engenheiro ocupa o cargo de chefe de transporte pesado da China Gezhouba Group Company, uma empresa de construção e engenharia sediada em Wuhan que está à frente do projeto hidrelétrico Dasu, que integra o Corredor Econômico China-Paquistão (CPEC, da sigla em inglês). A obra é parte de uma série de projetos de infraestrutura chineses no Baluchistão, inseridos na Nova Rota da Seda.

“Ele passou a fazer comentários insultuosos e gestos depreciativos para menosprezar Alá e o profeta dos muçulmanos”, diz a queixa policial.

Autoridades levaram Tian sob custódia em Kohistan (Foto: Twitter/reprodução)

O suposto ato de blasfêmia de Tian deixou os trabalhadores revoltados, gerando protestos na noite de domingo (16) no distrito de Kohistan, onde o projeto da hidrelétrica está em curso. Milhares de manifestantes bloquearam a principal rodovia que liga o Paquistão à China.

Segundo o jornal South China Morning Post, Tian teria feito comentários sobre o ritmo lento de trabalho durante o mês sagrado islâmico, o que rendeu a ele ameaças de morte.

Durante as manifestações, para evitar que o tumulto ganhasse maiores proporções, a polícia interveio e fez disparos de advertência contra a multidão, que permaneceu no local por quase quatro horas, só saindo após a polícia dar garantias de que o engenheiro chinês enfrentaria consequências legais pelos seus atos.

A blasfêmia é uma ofensa no Paquistão que pode acarretar a pena de morte. Uma lei anti-blasfêmia foi instituída no país durante a era colonial britânica.

Por que isso importa?

O Paquistão enfrenta uma onda de rejeição à China que está atrelada à relação comercial entre Beijing e Islamabad, que inclui uma série de projetos de infraestrutura chineses no Baluchistão.

O Baluchistão se estende por três países, Paquistão, Irã e Afeganistão. É uma região árida, montanhosa e rica em recursos minerais, cujo nome vem dos baluchis, um povo muçulmano essencialmente sunita que é originário do Irã e habita a área.

A porção paquistanesa é a mais extensa e tem sido palco de muita violência nos últimos anos. Grupos separatistas que atuam na região entraram em conflito com o governo do Paquistão, o que gerou milhares de mortes desde 2004. Organizações extremistas islâmicas ajudam a aumentar a tensão.

A luta dos separatistas é por maior autonomia política em relação a Islamabad e pelo direito de explorar os vastos recursos da região. Isso gerou desavenças particularmente com a China, sob a acusação de que o CPEC, anunciado em 2015, estaria sugando as riquezas sem melhorar as condições da população local.

Com um orçamento de US$ 60 bilhões, o CPEC projeta ligar a cidade portuária de Gwadar, no Baluchistão, a Xinjiang, no noroeste da China, por meio de rodovias e ferrovias. O acordo ainda prevê projetos de energia para atender às necessidades de abastecimento do Paquistão.

Os baluchis argumentam que o projeto bilionário de infraestrutura não tem beneficiado a região, enquanto outras províncias paquistanesas colhem os frutos. O caso gera protestos generalizados, e os chineses são vistos como invasores dispostos a extrair as riquezas locais.

O principal grupo radical atuante no Baluchistão é o Exército de Libertação Balúchi (ELB), que em 2019 foi inserido pelos EUA na lista de grupos terroristas internacionais. A Frente de Libertação do Baluchistão (BLF) é outra organização de forte presença na região.

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