Fabricante chinesa de câmeras de vigilância deixa a Rússia e ameaça apagão de segurança

Hikvision chegou a ter 30% dos aparelhos ativos no país, e o fim do suporte técnico pode tirar muitos deles de operação

Em uma ação que pegou clientes e parceiros de surpresa e tem potencial para gerar um apagão de segurança na Rússia, a Hikvision, fabricante chinesa de câmeras de vigilância, suspendeu suas operações no país em guerra. A decisão coloca a empresa entre mais de mil outras que bateram em retirada desde a invasão da Ucrânia pelas forças presidente russo Vladimir Putin em 2022. As informações são da revista Newsweek.

Parceiros locais atribuem a saída da empresa à nova onda de sanções impostas pelos Estados Unidos, cujos alvos são empresas internacionais que apoiam a base industrial militar russa e têm se focado cada vez mais em companhias da China.

O site da Hikvision foi retirado do ar, conforme relatado na semana passada, através do Telegram, pela Videoglaz, uma empresa russa de consultoria de sistemas de segurança. Já os telefones da empresa em todas as cidades russas onde ela operava não estão sendo atendidos. A data exata em que parou de operar, porém, não foi divulgada.

Câmera da Hikvision: Austrália teme expor o governo á vigilância chinesa (Foto: WikiCommons)

A Hikvision é um dos maiores fabricantes mundiais de sistemas de vigilância por vídeo e em 2021 era responsável por até 30% das câmeras de vigilância no país, segundo a agência de mídia local RSpectr.

Mesmo com a entrada no mercado de novos fornecedores locais e chineses, a empresa vinha mantendo sua hegemonia na Rússia. Entretanto, a saída repentina pode levar a um apagão de segurança em partes do território russo caso as câmeras fiquem fora de operação, vez que o suporte técnico foi interrompido.

“A suspensão ou mudança dos canais de fornecimento pode, num futuro próximo, causar uma escassez de produtos Hikvision e de vários componentes eletrônicos, levando a um aumento nos preços”, escreveu a Videoglaz , destacando o futuro incerto do suporte técnico e dos serviços em nuvem da empresa chinesa na Rússia.

Diante da ameaça, a Videoglaz sugeriu que é o momento de mudar para fabricantes nacionais e marcas globais, a fim de garantir cadeias de abastecimento industriais mais confiáveis.

Espionagem estatal

Washington sancionou a própria Hikvision por suspeitar que os equipamentos da empresa sejam utilizados com fins de espionagem, além de acusar a empresa de fornecer aparelhos que facilitam a detenção de uigures em Xinjiang. Já o Reino Unido determinou, no fim de 2022, que os departamentos governamentais parassem de usar câmeras fabricadas na China em “locais sensíveis” do país. 

Após ser invadida, Kiev rotulou a empresa como “patrocinadora da guerra” devido às vendas na Rússia. No entanto, as câmeras Hikvision são comuns também na própria Ucrânia. Uma delas foi envolvida em um ataque com mísseis russos em Kiev, em janeiro, segundo a Radio Free Europe, citando fontes policiais. A agência de segurança estatal ucraniana suspeita que as forças russas tenham hackeado a câmera.

A Hikvision também foi associada a outras violações dos direitos humanos na China. Em 2023, o Internet Protocol Video Market, um grupo de pesquisa da indústria de vigilância baseado nos EUA, revelou que a empresa ganhou um contrato de US$ 9 milhões para desenvolver um sistema de “campus inteligente” para a Universidade Mingjiang em Fuzhou, capital da província de Fujian. O videomonitoramento rastreava atividades estudantis, inclusive hábitos alimentares. A empresa nega as acusações. 

Autoritarismo para exportação

Artigo publicado em 2022 no site especializado em cibersegurança Dark Reading aponta que a China vem exportando cada vez mais “não apenas sua tecnologia, mas os valores autoritários que ela sustenta”. O fenômeno é definido como “tecnoautoritarismo”.

Ouvido pelo veículo, Keith Krach, ex-subsecretário de Estado para Crescimento Econômico, Energia e Meio Ambiente do governo Trump, disse que tal disseminação precisa ser contida antes que se espalhe por todo o planeta.

“A China está essencialmente exportando uma ‘ditadura em uma caixa’ quando envia suas ferramentas de vigilância para o exterior. Estas são ferramentas que o pior dos ditadores só poderia ter sonhado. E é isso que permite o genocídio: todo o Estado de vigilância. Literalmente, controle do pensamento”, disse em entrevista.

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