Empresas estrangeiras contabilizam perdas de US$ 107 bilhões após saída da Rússia

Situação revela o impacto da invasão de Moscou no mundo empresarial e o súbito vazio da experiência ocidental na economia russa

Após a invasão russa à Ucrânia em 2022, empresas estrangeiras que deixaram a Rússia enfrentaram perdas superiores a US$ 107 bilhões. Os prejuízos conectados a essa debandada corporativa em apoio a Kiev aumentaram em um terço desde o último relatório, divulgado em agosto de 2023, evidenciando o impacto financeiro significativo da guerra iniciada por Vladimir Putin. Os dados foram divulgados pela agência Reuters.

Além disso, a situação ocasionou uma rápida retirada do expertise ocidental da economia russa. Ian Massey, diretor de Inteligência Corporativa na S-RM, uma consultoria global de risco que fornece serviços de inteligência corporativa e gestão de riscos em várias regiões do mundo, avaliou a situação. Para ele, com a campanha russa em curso e a ajuda militar ocidental vacilante, juntamente com sanções cada vez mais detalhadas, “as empresas que permanecem na Rússia provavelmente enfrentarão obstáculos maiores e enfrentarão maiores perdas.”

Após sua reeleição, que foi duramente criticada no Ocidente por ser considerada injusta e antidemocrática, o chefe do Kremlin, segundo Massey, agora possui um novo mandato para aprofundar o isolamento da Rússia em relação às nações ocidentais. Isso pode incluir medidas adicionais, como mais apreensões de ativos e aumento da pressão política.

Empresa francesa de alimentos Danone anunciou a retirada de suas comercializações de laticínios no país e amargou prejuízo de um bilhão de euros  (Foto: Openfoodfacts.org/Divulgação)

Moscou está pressionando por descontos de pelo menos 50% nas vendas de ativos estrangeiros e está tornando mais difícil para as empresas saírem do país, muitas vezes aceitando taxas nominais tão baixas quanto um rublo.

Empresas como Shell, HSBC, Polymetal International e Yandex NV venderam ativos no valor de quase US$ 10 bilhões este ano, muitas vezes com descontos de até 90%. Recentemente, a Danone obteve aprovações regulatórias para vender seus ativos na Rússia, resultando em uma perda total de US$ 1,3 bilhão.

Embora cerca de mil empresas tenham saído da Rússia, centenas, como a varejista francesa Auchan e a Benetton, ainda estão operando no país, embora muitas tenham interrompido suas atividades, de acordo com análises.

Retaliação russa

Após a invasão russa, países ocidentais tomaram medidas, congelando cerca de US$ 300 bilhões das reservas de ouro e câmbio do Banco da Rússia.

Em resposta, a Alemanha nacionalizou a subsidiária da estatal de gás da Rússia, a Gazprom Germania, renomeando-a como Sefe, e colocou a refinaria estratégica de Schwedt, majoritariamente controlada pela Rosneft, sob controle alemão.

No entanto, a Rússia prometeu retaliar contra as propostas da União Europeia (UE) para redistribuir os juros ganhos em seus ativos congelados, alertando sobre consequências graves e denunciando qualquer tentativa de confiscar seu capital ou juros como “banditismo”.

Do mesmo modo, os bancos ocidentais também estão preocupados com possíveis disputas legais decorrentes de apreensões de ativos.

Massey destacou a vulnerabilidade dos ativos ocidentais na Rússia enquanto o conflito persistir. Iss porque Moscou já tomou controle temporário de ativos pertencentes a empresas ocidentais como Fortum, Carlsberg, OMV e Uniper.

Cálculos da agência de notícias estatal russa RIA sugerem perdas potenciais para o Ocidente de pelo menos US$ 288 bilhões se Moscou retaliar, com os países da União Europeia detendo a maior parte desses ativos.

Êxodo não é total

Embora mais de mil empresas tenham reduzido suas atividades na Rússia desde que a guerra teve início, um número significativo ainda permanece. Entre essas, as empresas chinesas são as mais presentes, com outras dos EUA, Japão, Alemanha, França e Índia continuando a fazer negócios sem se intimidarem com o conflito.

Apesar dos desafios, algumas empresas de bens de consumo permanecem na Rússia, citando a dependência dos consumidores locais de seus produtos. Nomes como Mondelez International, PepsiCo, Auchan, Nestlé, Unilever, Reckitt e British American Tobacco mantêm suas operações, enquanto outras, como a Intesa Sanpaolo, enfrentam obstáculos burocráticos ao tentarem sair.

Não voltam

Muitos clientes de Jeremy Zucker, um advogado especialista em sanções ouvido pela Reuters, decidiram sair totalmente da Rússia e podem relutar em voltar mesmo depois que as hostilidades terminarem. Isso significa que tecnologias importantes estão deixando o país, o que pode afetar sua capacidade de apoiar produções de alta tecnologia.

Zucker, presidente da área de segurança nacional da empresa de advocacia Dechert, destacou que isso representa um grande prejuízo para a economia russa.

Por que isso importa?

Desde a invasão da Ucrânia pela Rússia, em 24 de fevereiro, mais de mil empresas ocidentais deixaram de operar em território russo, seja de maneira temporária ou definitiva, parcial ou integral. São companhias que querem evitar o risco de desobedecer as sanções ocidentais, ou mesmo a reação negativa da opinião pública caso continuem a lucrar no mercado russo. O levantamento foi feito pela Universidade de Yale, nos EUA.

A debandada tem prejudicado o consumidor local, privado de produtos de setores diversos, como entretenimento, tecnologia, automobilístico, vestuário e geração de energia.

No setor de alimentação, o McDonald’s vendeu seu negócio no país a um empresário russo. Ao fim de 2021, a rede tinha 847 lojas no país. Diferente do que ocorre no resto do mundo, onde habitualmente atua no sistema de franquias, 84% das lojas russas eram operadas pela própria companhia. Somado ao faturamento na Ucrânia, a operação respondia por 9% da receita global da empresa.

Loja do McDonald’s na Rússia: rede de lanchonetes vendeu seus ativos (Foto: Wikimedia Commons)

Duas importantes cervejarias da Europa, a holandesa Heineken e a dinamarquesa Carlsberg, também anunciaram a venda dos seus negócios e a saída da Rússia.

Outra decisão que causou problemas foi o fim dos serviços das companhias de cartões de crédito Mastercard e Visa.

No setor de vestuário, quem anunciou a retirada do mercado russo foi a Levi’s, sob o argumento de que quaisquer considerações comerciais “são claramente secundárias em relação ao sofrimento humano experimentado por tantos”. Nike e Adidas também suspenderam todas as operações no mercado russo. A sueca Ikea, gigante do setor de móveis, é outra que decidiu deixar a Rússia em função da guerra.

Nas áreas de entretenimento e tecnologia, alguns gigantes também optaram por suspender as vendas de produtos e serviços no país de Vladimir Putin. A Netflix interrompeu seus serviços e cancelou todos os projetos e aquisições na Rússia, enquanto WarnerDisney e Sony adiaram os lançamentos de suas novas produções no país. Já a Apple excluiu os aplicativos das empresas estatais russas de mídia RT e Sputnik e disse que não mais venderá seus produtos, como iPhones e iPads, em território russo. PanasonicMicrosoftNokiaEricsson e Samsung são outras que optaram por encerrar as operações no país.

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