Nos últimos anos, sob o governo do primeiro-ministro Manasseh Sogavare, as Ilhas Salomão entraram para o círculo de influência da China, manobra diplomática que rendeu a Beijing uma posição estratégica no Indo-Pacífico e gerou preocupação entre os aliados ocidentais. Nesta quarta-feira (17), a pequena nação insular será novamente observada por alguns dos países mais poderosos do mundo, conforme seus cidadãos vão às urnas para a eleição parlamentar.
Sogavare, que já ocupou o governo em quatro ocasiões, busca dessa vez algo inédito: um segundo mandato consecutivo. Favorito, conta com o apoio da China, embora o aliado negue qualquer tentativa de interferir no pleito indireto que elegerá 50 legisladores para que, então, seja escolhido o novo primeiro-ministro.
Governante pela primeira vez em 2000, ele deixou o poder em 2001, retornou em 2006 e teve um terceiro mandato em 2014. O atual, iniciado após a eleição de 2019, é o mais longo e marcou a guinada do país em direção a Beijing, deixando em segundo plano a tradicional aliança regional com a Austrália.
A fim de agradar o novo parceiro, Sogavare mudou para Beijing a aliança diplomática do país, antes voltada a Taiwan, e também assinou um pacto de segurança com o governo chinês. Na ocasião, vazou o que seria uma carta de intenções segundo a qual a China estabeleceria uma base militar nas Ilhas Salomão.
No documento, uma empresa chinesa de engenharia “demonstra intenção de estudar a oportunidade de desenvolver projetos navais e de infraestrutura em terrenos arrendados para a Marinha do Exército de Libertação Popular (ELP), para a Província de Isobel, com direitos exclusivos por 75 anos.”
Na mesma época em que a carta veio a público, Sogavare confirmou que estava prestes a assinar o acordo de segurança com a China e definiu como “insultantes” as preocupações australianas e neozelandesas de que o pacto poderia causar instabilidade na segurança da região.
Além doas aliados ocidentais, quem também não enxerga com muita satisfação a aliança é a população local. A relação comercial com a China é considerada particularmente predatória, com mais da metade de todos os frutos do mar, madeira e minerais extraídos do Pacífico em 2019 destinados ao gigante asiático. A estimativa é de que esse processo tenha movimentado US$ 3,3 bilhões, apontou uma análise de dados comerciais do jornal britânico The Guardian.
Para alimentar e gerenciar a população de quase 1,4 bilhão de habitantes, a China tirou do Pacífico mais recursos do que os dez países da região juntos. Nas Ilhas Salomão e em Papua Nova Guiné, por exemplo, mais de 90% do total de madeira exportada foi para os chineses.
Conforme Beijing ganha mais força na pequena nação insular, quem impõe a mais dura resistência é a Austrália, que vinha tentando renovar um antigo pacto de segurança firmado com as Ilhas Salomão em 2017. Ele prevê o envio de tropas australianas adicionais à nação insular, onde Camberra mantém mais de 200 soldados desde 2021, a pedido do governo local. Algo muito semelhante ao que foi acordado com a China.
Interferência chinesa?
Disposta a não perder a vantagem, Beijing tem a vitória de Sogavare como crucial. O governo chinês, no entanto, nega que venha interferindo no pleito, historicamente marcado pela compra de votos e por facilidades oferecidas por candidatos para que eleitores consigam votar viajando entre as mais de 900 ilhas que compõem o país.
O jornal Global Times, subordinado ao Partido Comunista Chinês (PCC), publicou um artigo nesse sentido e refutou as alegações ocidentais, supostamente encabeçadas pelos EUA, de que a China atua para que o primeiro-ministro ganhe um segundo mandato consecutivo.
“Desde o estabelecimento das relações diplomáticas, a cooperação e a assistência da China às Ilhas Salomão têm sido conduzidas sob o princípio do respeito mútuo, sem quaisquer condições políticas”, diz o Global Times, que cita ainda uma manifestação do porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, Lin Jian.
De acordo com Lin, “a China sempre aderiu ao princípio de não interferência nos assuntos internos de outros países e apoia o povo das Ilhas Salomão na escolha de um caminho de desenvolvimento que se adapte a suas condições nacionais.”