Imagens de satélite revelam a ampliação de uma base militar financiada pela China no Camboja

Beijing vive conflito diplomático com as nações vizinha e os EUA conforme tenta expandir sua influência no Sudeste Asiático

Imagens de satélite reveladas recentemente indicam a ampliação das instalações de uma base militar financiada pelo governo da China no Camboja. Se confirmada a movimentação, seria mais uma manobra de Beijing para expandir sua influência no Sudeste Asiático, algo que tem gerado embates diplomáticos com nações vizinhas e com os EUA. As informações são da rede Radio Free Asia (RFA).

A base de Ream fica na cidade de Sihanoukville, no Golfo da Tailândia, uma posição estratégica no Indo-Pacífico. Um acordo assinado entre os governos chinês e cambojano em 2019 autoriza Beijing a usar parte das instalações. Inicialmente, Phnom Penh negou a existência do pacto, revelado pelo Wall Street Journal. Porém, em junho do ano passado, as nações iniciaram um projeto de desenvolvimento conjunto da base.

Agora, imagens de satélite feitas pela empresa especializada Terra Planet Lab e acessadas pela RFA mostram que o local passou por profundas alterações. Na comparação com as imagens anteriores, de 1º de julho de 2022, é possível identificar uma enorme área desmatada e algumas novas construções.

Cidade de Sihanoukville, no Camboja, onde a China financiou uma base militar (Foto: WikiCommons)

Tom Shugart, membro sênior adjunto do think tank Centro para uma Nova Segurança Americana, com sede em Washington, diz que uma das novas instalações lembra uma fábrica de cimento, que poderia ser usada para fornecer o material necessário ao projeto de expansão da base. Há ainda dois novos píeres, aparentemente temporários, que seriam usados por navios civis para transportar suprimentos.

A área desmatada, de cerca de 66 acres, corresponde a 15% de toda a base e tende a ser usada para receber novas obras. “A velocidade e a escala da construção são simplesmente impressionantes”, disse Shugart.

Pelo acordo firmado em 2019, Beijing teria o direito de usar a base durante 30 anos, com a possibilidade de renovações automáticas do pacto a cada dez anos. Atualmente, o governo da China tem apenas uma base militar fora de seus territórios, no Djibuti, na África. Se confirmado a acesso dos militares chineses a Ream, esta seria a segunda presença militar do país no exterior.

De um lado, Beijing admite que terá acesso “exclusivo” a partes da base, segundo disse um oficial chinês ao jornal The Washington Post. Já Phnom Penh alega que vários países foram convidados a visitar a base e que as instalações não são “secretas”. Phay Siphan, porta-voz do governo cambojano, disse ainda que “não há acordo ou lei dizendo que a construção é reservada exclusivamente para benefício chinês”.

A China e o Pacífico

Antes do Camboja, as Ilhas Salomão protagonizaram outro episódio que incomodou Washington e seus aliados no Indo-Pacífico. No caso, um pacto de segurança firmado entre a nação insular e a China gerou a especulação de que Beijing também construiria ali uma base militar.

Dando sequência ao projeto de ampliar sua rede de influência na área, a China negociou com dez nações locais um acordo de segurança e comércio que prevê, entre outras coisas, cooperação em redes de dados, segurança cibernética e sistemas alfandegários inteligentes.

O acordo poderia abrir espaço para as redes 5G da gigante chinesa das telecomunicações Huawei, impedida de construir cabos submarinos ou de operar redes móveis nas ilhas do Pacífico pela Austrália e pelos EUA devido a alegações de espionagem em favor de Beijing.

Por que isso importa?

A China ostenta o segundo maior orçamento de defesa do mundo, atrás somente dos EUA. Com o dinheiro investido nas forças armadas nos últimos anos, Beijing tem hoje a maior marinha do mundo, à frente da norte-americana, o maior exército permanente do mundo e um arsenal balístico e nuclear capaz de rivalizar com qualquer outro. 

A marinha chinesa tem dois porta-aviões ativos e 360 navios, no que supera inclusive os EUA, estes com 300 embarcações militares. Já o exército permanente chinês tem cerca de dois milhões de soldados, maior que o de qualquer outra nação. A Índia é a segunda maior força do tipo no mundo, com cerca de 1,4 milhão de tropas, contra 1,35 milhão dos EUA, de acordo com o site World Atlas.

arsenal nuclear da China também tem aumentado num ritmo muito maior que o imaginado anteriormente, levando a nação asiática a reduzir a desvantagem em relação aos Estados Unidos nessa área. Relatório recente do Pentágono sugere que Beijing pode atingir a marca de 700 ogivas nucleares ativas até 2027, tendo a meta de mil ogivas até 2030.

O investimento chinês levou a uma corrida armamentista na região da Ásia-Pacífico, onde os gastos com Defesa ultrapassaram US$ 1 trilhão somente em 2021, segundo o Instituto Internacional de Estudos Estratégicos, de Londres. Beijing puxa esses números para cima, tendo aumentado seu orçamento militar por 27 anos consecutivos, de acordo com o Instituto Internacional de Pesquisa para a Paz de Estocolmo.

Em artigo publicado no jornal South China Morning Post em janeiro deste ano, Mark J. Valencia, analista de política marítima, comentarista político e consultor internacionalmente reconhecido com foco na Ásia, fez uma previsão alarmante para a região.

“A China e os EUA estão flertando com um desastre no Mar da China Meridional. Eles estão se apalpando como pugilistas no primeiro assalto. Até agora, eles evitaram uma colisão frontal, mas esta pode ser apenas a calmaria antes da severa tempestade militar”, disse ele no texto.

Tags: