Novas sanções ocidentais marcam segundo aniversário do golpe de Estado em Mianmar

Ruas de todo o país estiveram vazias nesta quarta, uma forma de o povo protestar silenciosamente contra a repressão

No aniversário de dois anos do golpe de Estado em Mianmar, orquestrado por uma junta militar em 1º de fevereiro de 2021, o país do sudeste asiático recebeu um novo pacote de sanções do Ocidente. Estados Unidos, Canadá e Reino Unido anunciaram novos embargos contra os golpistas que derrubaram e prenderam a líder democrática Aung San Suu Kyi, incluindo corte no fornecimento de combustível de aviação à força aérea, acusada de ataques a civis. As informações são do jornal britânico Guardian.

A exemplo do que aconteceu há exatamente um ano, ruas de todo o país estiveram vazias nesta quarta-feira (1º). O esvaziamento urbano foi simbólico: impedida de fazer manifestações, sob pena de punições severas, entre elas prisão perpétua, a população fez uma greve de silêncio para recordar a data. Espaços públicos em todo o país ficaram desertos a partir das 10h como forma de mostrar oposição aos militares.

Imagens de faixas penduradas em pontes na capital Yangon, com mensagens encorajando a população a se juntar à “revolução”, foram publicadas na mídia local. O movimento de resistência crescente chamado Força de Defesa do Povo (PDF, na sigla em inglês), formado por grupos armados, continua a encarar as tropas do governo. 

Protesto em maio de 2021 teve participação da atriz Phone Thiri Kyaw (Foto: Saw Wunna/Unplash

As sanções anunciadas por Ottawa proíbem a exportação, venda, fornecimento ou embarque de combustível de aviação para Mianmar. Já as penalidades britânicas têm foco em empresas e indivíduos associados ao grupo Asia Sun, que disse “fornecer combustível para a força aérea de Mianmar, permitindo sua bárbara campanha de ataques aéreos”.

Na visão do pesquisador de negócios e direitos humanos da Anistia Internacional (AI) Montse Ferrer, as medidas dos governos canadense e britânico serviram como “um passo importante para acabar com a contribuição das empresas para os crimes de guerra dos militares”. Um relatório da ONG documentou 16 ataques aéreos ilegais realizados pela junta entre março de 2021 e agosto de 2022.

Já as sanções de Washington têm como alvo o Ministério de Energia de Mianmar, a estatal de petróleo e gás Myanmar Oil and Gas Enterprise (MOGE), a força aérea do país e um traficante de armas que intermediou importações de drones de reconhecimento israelenses e peças de aeronaves para a força aérea de Mianmar. Também foram penalizados um membro da família de um parceiro comercial anteriormente designado pelos militares e a Comissão Eleitoral da União.

Segundo a ONU (Organização das Nações Unidas), o país tem sofrido um regresso em todas as áreas desde o golpe, que mergulhou os birmaneses em uma crise humanitária ainda mais profunda. O colapso é econômico, social, cultural, político, civil e de direitos humanos. 

Fontes dão conta de 2.890 mortes pelas mãos dos militares desde o golpe, sendo que 767 morreram sob custódia do Estado. E, por causa da violência, 1,2 milhão de birmaneses se tornaram deslocados internos. Mais de 13,2 milhões de birmaneses não têm o suficiente para comer, segundo a enviada especial da ONU (Organização das Nações Unidas) Noeleen Heyzer.

Além disso, há indícios de que, mesmo com embargo global de armas para enfraquecer a junta, as forças locais seguem se equipando com novos armamentos fornecidos por ChinaRússia e Paquistão, à medida que o número de civis mortos cresce.

No início desta semana, o secretário-geral da ONU, António Guterres, manifestou preocupação com a aparente intenção da junta militar de realizar eleições “em meio a intensificação do bombardeio aéreo e queima de casas de civis, juntamente com prisões, intimidações e perseguições contínuas de líderes políticos, atores da sociedade civil e jornalistas”.

Por que isso importa?

Mianmar enfrenta “uma campanha de terror com força brutal”, segundo a ONU. A repressão imposta pelo governo já causou a morte de ao menos 1252 pessoas desde o golpe de 1º de fevereiro deste ano, uma reação dos militares às eleições presidenciais de novembro de 2020.

Na ocasião, a NLD venceu as eleições com 82% dos votos, ainda mais do que havia obtido no pleito de 2015. Em fevereiro, então, a junta militar, que já havia impedido o partido de assumir o poder antes, derrubou e prendeu Aung San Suu Kyi.

O golpe deu início a protestos no país, respondidos com violência pelas forças de segurança nacionais. Centenas de pessoas foram presas sem indiciamento ou julgamento prévio, e muitas famílias continuam à procura de parentes desaparecidos. Jornalistas e ativistas são atacados deliberadamente, e serviços de internet têm sido interrompidos.

Inicialmente, o golpe em Mianmar foi recebido com reprovação pela China, que vinha dialogando para firmar acordos comerciais com o governo eleito e perdeu bastante com a derrubada. Atualmente, no entanto, Beijing frequentemente se coloca ao lado dos militares ao vetar resoluções que condenam a brutalidade dos atos contra opositores e a população civil em geral. O país também é um dos principais fornecedores de armas para a juntar militar.

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