Taiwan divulga cartilha de sobrevivência de olho em eventual invasão chinesa

Material leva à população da ilha diretrizes de emergência para o caso de uma crise militar com Beijing ou um desastre natural

Em meio a um cenário turbulento com a China, considerado o pior dos últimos 40 anos, Taiwan elaborou um manual de sobrevivência para orientar seus cidadãos sobre como agir na hipótese de uma invasão no futuro. As informações são da rede Radio Free Asia.

Intitulado ‘Manual de Defesa Nacional’, o documento tem 28 páginas. Nele, os taiwaneses podem encontrar “uma diretriz de resposta de emergência em uma crise militar ou desastre natural”, disse o Ministério da Defesa, responsável pela compilação e divulgação do material.

Taiwan vê paralelo entre sua situação e a da Ucrânia e teme sofrer destino semelhante. O governo do território semiautônomo está receoso quanto às intenções de Beijing em aproveitar a oportunidade, neste momento em que o mundo tem olhos para o conflito no Leste Europeu, para realizar um ataque contra a ilha. A ofensiva de Vladimir Putin ainda inspirou o Ministério da Defesa de Taipé a formar um grupo de estudos para analisar as táticas de guerra ucranianas.

Caça F-16 da força aérea taiwanesa decola da base de Hualien (Foto: WikiCommons)

O manual se espelhou em publicações semelhantes lançadas no Japão e na Suécia. O material traz orientações ilustradas sobre, por exemplo, como encontrar abrigos em caso de bombardeio e o que fazer em emergências como incêndios, ataques aéreos ou desastres naturais. Também ensina como interpretar as sirenes de alerta.

Nas ruas, a população parece dividida quanto à proposta. Uns aprovam. Outros têm dúvidas. “Nunca pensei que precisaríamos de algo assim, mas é bom que eles [o governo] tenham tomado essa precaução”, disse Cathy Hsieh, 35 anos, funcionária de um banco.

O manual fornece um conjunto de códigos QR para os cidadãos digitalizarem com seus telefones celulares e assim acessarem as informações necessárias, que inclui uma lista de números de emergência.

“Quando tudo acontecer, não acho que as pessoas vão querer confiar em códigos QR e redes móveis que com certeza não funcionarão”, analisou George Cai, 28 anos.

Esforços ‘fúteis’

Protocolos de segurança civil à parte, na terça-feira (12) as forças taiwanesas realizaram um exercício em larga escala com o objetivo de “ensaiar uma resposta rápida a um ataque simulado de aviões de guerra chineses”.

A simulação envolveu caças F-16, Indigenous Defense Fighters (IDFs), helicópteros Apache e outras aeronaves como parte de um esforço para “fortalecer a proteção de ativos importantes e combater ataques aéreos”.

“O exercício é uma parte importante do treinamento para combater um ataque da Força Aérea do Exército de Libertação Popular”, disse o coronel Sun Li-fang, porta-voz do Ministério da Defesa de Taiwan, em uma entrevista coletiva.

Beijing parece fazer pouco causo das preocupações da ilha. Um especialista militar chinês ouvido pela imprensa local classificou tanto o manual de sobrevivência quanto os exercícios como “fúteis para resistir à reunificação”.

Desde o início de abril, 25 aeronaves militares chinesas, incluindo 16 caças, seis aviões de observação e três helicópteros, foram rastreados na Zona de Identificação de Defesa Aérea (ADIZ, da sigla em inglês) de Taiwan, segundo o Ministério da Defesa.

Por que isso importa?

Taiwan é uma questão territorial sensível para os chineses. Nações estrangeiras que tratem a ilha como autônoma estão, no entendimento de Beijing, em desacordo com o princípio defendido de “Uma Só China“, que também encara Hong Kong como parte do território chinês. Diante da aproximação entre Taipé e Washington, desde 2020 a China endureceu a retórica contra as reivindicações de independência da ilha.

Embora não tenha relações diplomáticas formais com Taiwan, assim como a maioria dos países do mundo, os EUA são o mais importante financiador internacional e principal fornecedor de armas do território, o que causa imenso desgosto a Beijing, que tem adotado uma postura belicista na tentativa de controlar a situação.

Jatos militares chineses passaram a realizar exercícios militares nas regiões limítrofes com Taiwan e habitualmente invadem o espaço aéreo taiwanês, deixando claro que a China não aceitará a independência do território “sem uma guerra“.

embate, porém, pode não terminar em confronto militar, e sim em um bloqueio total da ilha. É o que apontaram relatórios produzidos pelos EUA e por Taiwan em junho de 2021. O documento taiwanês pontua que Beijing não teria capacidade de lançar uma invasão em grande escala, justamente por se tratar de uma ilha. Segundo o documento do Pentágono, isso “provavelmente sobrecarregaria as forças armadas chinesas”.

Caso ocorresse, a escalada militar criaria um “risco político e militar significativo” para Beijing. Ainda assim, ambos os relatórios reconhecem que a China é capaz de bloquear Taiwan com cortes dos tráfegos aéreo e naval e das redes de informação. O bloqueio sufocaria a ilha, criando uma reação internacional semelhante àquela que seria causada por uma eventual ação militar.

Em artigo publicado em novembro, Michael Beckley e Hal Brands alertaram que o tempo está se esgotando para frear o ímpeto belicista chinês. “Os sinais de alerta históricos da China já estão piscando em vermelho. Na verdade, ter uma visão de longo prazo de por que e sob quais circunstâncias a China luta é a chave para entender o quão curto o tempo se tornou para os Estados Unidos e os outros países no caminho de Beijing”.

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