O presidente de Taiwan, Lai Ching-te, deixou claro nos últimos dias que não considera, sob qualquer hipótese, uma reintegração pacífica com a China e que seguirá lutando para que a ilha tenha sua autonomia reconhecida e respeitada, sob o risco de sucumbir ao autoritarismo de Beijing. Ele falou durante um evento regional de segurança realizado em Taipé.
“Estamos todos plenamente cientes de que o crescente autoritarismo da China não vai parar em Taiwan, nem Taiwan é o único alvo das pressões econômicas da China”, disse Lai no Fórum Anual Ketagalan de Segurança do Indo-Pacífico, segundo o jornal Taipei Times. “A China pretende mudar a ordem internacional baseada em regras. É por isso que os países democráticos devem se unir e tomar medidas concretas.”
Para fazer valer suas pretensões, ele afirmou que fortalecer as defesas militares da ilha é uma questão prioritária. No início do mês, o governo taiwanês anunciou uma medida nesse sentido ao aprovar o maior orçamento militar de sua história. No próximo ano, o investimento nas Forças Armadas será de 647 bilhões de novos dólares taiwaneses (R$ 111,58 bilhões).
Embora o aumento represente cerca de 20% do orçamento total do governo, subindo 6,7% de 2024 para 2025, os valores são pálidos na comparação com os gastos da China, que cresceram 7,2% em 2024.
De acordo com o Instituto Internacional de Investigação para a Paz de Estocolmo (Sipri, na sigla em inglês), Beijing teve o segundo maior orçamento militar de 2023, US$ 296 bilhões (R$ 1,624 trilhão), atrás somente dos EUA, enquanto a ilha aparece em 21º lugar no ranking, com US$ 16,6 bilhões (R$ 91,07 bilhões) investidos em defesa no ano passado.
Investir em armas, na visão de Lai, é a melhor forma de assegurar a paz na região. “Nosso objetivo é que tenhamos esperança de um desenvolvimento pacífico através do Estreito de Taiwan. Taiwan é um país que ama ardentemente a paz. O povo de Taiwan é gentil”, disse ele, de acordo com a agência Reuters.
Se não admite ver o território anexado pela China, Lai também diz que não cogita o movimento oposto, com Beijing sob o controle de Taipé. Uma referência ao fato de que até 1949 a ilha era reconhecida internacionalmente como sede legítima do governo chinês, após a fuga para Taiwan dos membros do partido Kuomintang derrotados pelo Partido Comunista Chinês (PCC) na guerra civil da China.
“Não estamos mais tentando retomar o continente”, declarou o presidente. “Mas também não estamos dispostos a ser governados pelo Partido Comunista. Queremos continuar uma vida de democracia, liberdade, direitos humanos e Estado de direito.”
Por que isso importa?
Taiwan é uma questão territorial sensível para a China, e a queda de braço entre Beijing e o Ocidente por conta da pretensa autonomia da ilha gera um ambiente tenso, com a ameaça crescente de uma invasão pelas forças armadas chinesas a fim de anexar formalmente o território taiwanês.
Nações estrangeiras que tratem a ilha como nação autônoma estão, no entendimento de Beijing, em desacordo com o princípio “Uma Só China“, que também vê Hong Kong como parte da nação chinesa.
Embora não tenha relações diplomáticas formais com Taiwan, assim como a maioria dos demais países, os EUA são o mais importante financiador internacional e principal parceiro militar de Taipé. Tais circunstâncias levaram as relações entre Beijing e Washington a seu pior momento desde 1979, quando os dois países reataram os laços diplomáticos.
A China, em resposta à aproximação entre o rival e a ilha, endureceu a retórica e tem adotado uma postura belicista na tentativa de controlar a situação. Jatos militares chineses passaram a realizar exercícios militares nas regiões limítrofes com Taiwan e habitualmente invadem o espaço aéreo taiwanês, deixando claro que Beijing não aceitará a independência formal do território “sem uma guerra“.
A crise ganhou contornos mais dramáticos após a visita da presidente da Câmara dos Representantes dos EUA, Nancy Pelosi, à ilha em 2022. Foi a primeira pessoa ocupante do cargo a viajar para Taiwan em 25 anos, atitude que mexeu com os brio de Beijing. Em resposta, o exército da China realizou um de seus maiores exercícios militares no entorno da ilha, com tiros reais e testes de mísseis em seis áreas diferentes.
O treinamento serviu como um bloqueio eficaz, impedindo tanto o transporte marítimo quanto a aviação no entorno da ilha. Assim, voos comerciais tiveram que ser cancelados, e embarcações foram impedidas de navegar por conta da presença militar chinesa.
Desde então, aumentou consideravelmente a expectativa global por uma invasão chinesa. Para alguns especialistas, caso do secretário de Defesa dos EUA Lloyd Austin, o ataque “não é iminente“. Entretanto, o secretário de Estado Antony Blinken afirmou em outubro de 2022 “que Beijing está determinada a buscar a reunificação em um cronograma muito mais rápido”.