Este artigo foi publicado originalmente no Jornal da USP.
*por Marcos Fava Neves, professor titular da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade de Ribeirão Preto (FEA-RP) da USP
Nosso resumo mensal traz os eventos principais de julho e o que observar em agosto. Começando pela economia mundial, o mundo segue acompanhando diariamente os impactos das políticas de isolamento, números de infecções e fatalidades e a consequente queda da confiança na economia mundial.
O PIB dos EUA sofreu a maior redução da história em um trimestre, segundo o Departamento de Comércio, com queda de 32,9% entre abril e junho de 2020. Mas em alguns países emergentes um clima de maior otimismo começa a prevalecer com o não aparecimento de segundas ondas de infecções e a retomada gradual das atividades econômicas.
Entre estudos internacionais deste mês, destaca-se um realizado pelo Instituto de Métricas e Avaliação em Saúde da Universidade de Washington (IHME) que revela redução na população global a partir de 2050, além de mudanças representativas na pirâmide etária em 2100. Com a redução de população ativa, alguns países como China e Índia devem apresentar menores taxas de crescimento econômico.
No Brasil, o pico populacional deve acontecer em 2043, com 245 milhões de habitantes, fechando 2100 com 164 milhões. Interessante observar isto, pois a onda de expansão quantitativa do agro brasileiro não será eterna.
Ainda nos temas do mês, uma área que deve crescer brutalmente é a dos fundos verdes, ligados a projetos que tragam ganhos ambientais, com grandes grupos financeiros ampliando o direcionamento de recursos para negociação de fundos verdes no País.
Atualmente, o Brasil possui R$ 30 bilhões em fundos desse tipo, valor muito menor que o mercado global, que é de U$ 1 trilhão. Investidores estrangeiros e organizações brasileiras iniciaram a estruturação das primeiras emissões de Certificados Recebíveis do Agronegócio (CRA) em dólar (possibilitada pela MP do Agro) para financiamento do setor produtivo, o que deve aportar investimentos de US$ 550 milhões em títulos envolvendo uma cerealista e uma usina de biocombustíveis.
As emissões de títulos de CRA em 2019 tiveram um aumento de 78,5%, e em 2020, já movimentaram mais de 8,3 bilhões. No primeiro semestre de 2020, as emissões foram 11,5% maiores que o mesmo período de 2019.
O gigante varejista chinês Alibaba pretende desenvolver na cidade chinesa de Zibo, em Shandong, toda uma infraestrutura agrícola digital para otimizar a distribuição de alimentos frescos por todo o país. O projeto envolve centros de processamento e distribuição. Temos que observar, tive a chance de visitá-los em 2019 e fiquei impressionado.
Mas antes de pular ao agro, aparentemente na economia estamos melhorando. Resta observar os movimentos principalmente nos EUA, com a eleição presidencial e as trombadas com a China. Mas continuo acreditando em mais confiança e na valorização do real e da Bolsa.
E as perspectivas de futuro continuam boas. O estudo Perspectivas Agrícolas 2020-29, realizado pela OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) e FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura), aponta a consolidação da América Latina como fornecedor mundial de produtos agrícolas nos próximos dez anos, com a produção aumentando em 14%, enquanto que as exportações devem crescer 1,7% por ano. Em 2029, a região deverá responder por 60% das exportações globais de soja, 40% do milho, 39% do açúcar e 35% de carnes (bovina e frango). O Brasil, China, EUA e União Europeia devem representar 60% da produção mundial de carnes até 2029.
Nos próximos 10 anos, deve acontecer um aumento no consumo médio de carnes por habitante de 0,24% por ano, em países desenvolvidos, e de 0,8%, nos países em desenvolvimento. Segundo a OCDE e FAO, a China deve representar 29% das importações mundiais, tendo Brasil, Canadá, EUA e União Europeia como principais países exportadores. O Brasil deverá exportar 105 milhões de toneladas de soja para a China em 2029, com a produção atingindo 140 milhões de toneladas, frente a 120 milhões dos EUA.
Em relação aos preços no mercado de soja e milho, pouca variação neste mês. O USDA aponta que os contratos futuros de milho para setembro foram negociados em US$ 3,25/bushel, enquanto que os futuros da nova safra de dezembro fecharam a US$ 3,33. O USDA manteve suas classificações de 69% do milho na condição de bom para excelente nessa semana.
Na soja, os preços futuros para agosto caíram para US$ 8,9/bushel essa semana, e para novembro estão em US$ 8,94. Os índices para soja voltaram a 69% de bom para excelentes, após quedas recentes. Aqui no Brasil os preços ao fechar esta coluna estavam em R$ 110 para a saca da soja e R$ 45 para o milho, entregue em cooperativa de São Paulo. Muita gente vendendo produções futuras, e eu faria isto. Estamos com poucos grãos no Brasil.
Fecho a análise do agro deste mês com os avanços impressionantes da digitalização, pois a pandemia intensificou a busca por soluções digitais de monitoramento de propriedades a distância e sistemas de informação.
Outros serviços como compra de insumos on-line e venda das commodities têm se destacado. Oferecendo descontos, a Orbia, por exemplo, chegou a vender R$ 10 milhões em produtos em sua plataforma digital. O John Deere Conecta, aplicativo de suporte lançado no mês de maio, registrou mais de 320 mil acessos em 30 dias.
Segundo a John Deere, 85% dos atendimentos no período da pandemia foram solucionados virtualmente a plataforma gerou a venda de 300 máquinas desde a sua criação. A Coopercitrus lançou novidades no aplicativo Campo Digital durante a sua feira Expo Digital, realizada no final de julho.
Pelo aplicativo, o produtor poderá solicitar serviços de tecnologia em agricultura de precisão como amostragem georreferenciada, pulverizações por drones, monitoramento via satélite e outros. Os produtores podem acessar a plataforma em qualquer dispositivo (tablet, celular ou computador).